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04/02/2022 às 03h15min - Atualizada em 04/02/2022 às 01h33min

A linha tênue entre expressar-se pela arte e negligenciar a saúde mental do artista

Paul Valéry, filósofo e poeta francês, fala "O objetivo profundo do artista é dar mais do que aquilo que tem". Essa frase é um exemplo da romantização de artistas, já que, para muitos, "mais do que aquilo que tem" pode significar o detrimento da saúde mental

Beatriz Araujo de Oliveira - Editado por Larissa Bispo
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-54948162 https://www.pensador.com/frase/MTA3OTA/
Créditos/Reproduçãao: Deposiphotos

Lançada em 2018, Sharp Objects, ou “Objetos Cortantes”, é uma minissérie original da HBO que conquistou diversos prêmios, como o Globo de Ouro e Critics’ Choice Award. Amy Adams vive a protagonista dessa história, Camille Preaker, uma jornalista etilista e depressiva que se vê forçada a voltar para a cidade natal, um lugar pequeno no interior, a fim de escrever sobre um recente assassinato que acontecera por lá. Assim, Camille precisa enfrentar memórias dolorosas da infância e da adolescência e problemas familiares que ainda persistem mesmo depois de tantos anos.

Camille escreve algumas notícias ao longo dos episódios e, geralmente, não recebe um retorno muito bom sobre o trabalho feito. Contudo, é apenas no final da série, depois de todos os acontecimentos traumáticos, que a personagem principal consegue produzir um texto que agrada o editor do jornal.
 

A ideia de que escritores e artistas precisam sofrer para produzir algo de valor não é atual, mas continua muito viva na sociedade. Um exemplo bastante famoso é o do pintor Van Gogh, que tinha depressão e alguns profissionais da saúde ainda o diagnosticam com esquizofrenia. Consequentemente, muitos romantizam essas condições psiquiátricas e o caracterizam como um ótimo pintor.
 

A comediante estadunidense Hannah Gadsby chega a debater sobre esse assunto no stand-up chamado Nanette, disponível na Netflix. Ela conta que, durante um de seus shows, revelou precisar de antidepressivos e que depois foi abordada por um espectador que afirmava que artistas, como a própria Hannah, não deveriam usar remédios para doenças mentais, já que era necessário sentir todo o tipo de emoção, até mesmo as destrutivas, com intensidade máxima para obter uma obra de arte. O homem chegou até a usar Van Gogh como exemplo para embasar o argumento.

Entretanto, há um outro lado que é deixado de lado quando o assunto é a saúde mental de profissionais que precisam trabalhar com os sentimentos e pensamentos diariamente. Camille Preaker costumava ferir a si mesma ao escrever palavras no próprio corpo com lâminas, Van Gogh utilizava muito a cor amarela devido a um medicamento para tratar crises maníaco-depressivas que afetava sua percepção de cores e, anos depois, cometeu suicídio, e Hannah Gadsby considerou por muito tempo desistir da comédia por causa da depressão. De fato, um dos maiores problemas da romantização do sofrimento de artistas, escritores e jornalistas está na banalização das consequências geradas por doenças psiquiátricas.

 

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