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06/02/2022 às 20h25min - Atualizada em 06/02/2022 às 19h08min

Apesar da marginalização, indústria da moda aproveita influências culturais da periferia

Fernando Lopes - Editado por Laiz Vaz
Fonte: Reprodução/Fernando Lopes

Grande parte das tendências culturais, inclusive na moda, vem da periferia brasileira. Desde os anos 90, pela contramão, as favelas vem ditando muito daquilo que se tornou almejado no Brasil. Apesar das problemáticas sociais e econômicas que dificultam a vida na periferia, desde o poder de aquisição à marginalização, a estética e a vivência das favelas vem em ascensão no cenário e com ajuda da mídia tornou-se referência dentro e fora da periferia.


Marcas como Nike, Oakley, The North Face, Lacoste e entre outros, antes voltadas para um nicho exclusivo da sociedade, começaram a se difundir nas periferias e moldaram o estilo das quebradas, unindo um conceito único com a vivência cotidiana. A Lacoste autodefine-se por um espírito esportivo, que guia as escolhas da marca tanto em suas coleções quanto em seus compromissos com a sociedade. Essa menção da própria Lacoste é um ponto de partida para a problemática. Primeiramente, o "espírito esportivo" supracitado é um fator relacionável com a forte presença da grife elitista nas periferias brasileiras, com forte influência do funk e do rap nacional.
 

Outro ponto questionável é no aspecto de compromissos com a sociedade, onde a grande massa consumidora da Lacoste (periferia) é ofuscada pela massa que a marca quer relacionar-se (elite). É presenciado um limbo de desassociação periférica da marca que recentemente investiu no Brasil, expandindo sua atuação. Nas quebradas brasileiras a Lacoste é a grife mais usada e almejada. Mesmo com a inacessibilidade dos produtos da marca, oriunda dos preços altos voltados para a elite, existe uma cena cultural gigante na periferia impulsionada pela ostentação e pelo desejo. Muito além do uso, as roupas representam um movimento de moda regional magnífico, que cresce exponencialmente.
 

Muito disso deve-se ao funk e seu gigante espaço nas quebradas brasileiras. A popularidade da marca e o funk estão intimamente coligadas e, em 2010, com o auge do "funk ostentação", marcou-se o início do fenômeno. Respectivamente, o estilo dos artistas referenciais contemporâneos para o movimento, como o MD Chefe, Kyan e MC's Dricka e Hariel são influências importantes para a ascensão contínua.

 

No início do mês de agosto de 2021, a Lacoste expandiu sua atuação em solo nacional em alguns aspectos. Um dos campos inovadores foi o lançamento da conta nacional da Lacoste no Instagram. Logo nas primeiras publicações já haviam alguns comentários pedindo a presença de rappers e funkeiros como Kyan, Hariel, MD Chefe e Dricka nas próximas campanhas. Todavia, a grife ignorou os pedidos e lançou uma campanha com o slogan supracitado com a presença de artistas e empresários como Jão e João Guilherme, revoltando o público pela ausência de pluralidade e representatividade periférica.

 

"O intuito deles de deixar favelado e pobre bem longe da imagem da marca sempre foi claro, nós compramos pq nós queremos! Existe essa relação de amor por nossa parte e de ódio da parte deles". Disse MC Hariel em suas redes sociais.
 

No entanto, a empresa saltou de mil seguidores para 164 mil seguidores rapidamente, evidenciando o poder da cultura enraizada nas periferias nacionais. Sendo assim, a empresa se mobilizou para se redimir convidando Kyan, Dricka e MD para campanhas, onde o primeiro recusou participação por histórico social excludente da empresa.

 

A repercussão negativa do caso foi tremenda. Cantores, jornalistas e amantes da cultura concederam inúmeras críticas à Lacoste. É inegável a tentativa da marca em se desassociar da periferia, mesmo após histórico constante de propaganda gratuita oriunda dos meios de comunicação das quebradas. Certo que a presença da Lacoste em solo nacional é antiga, porém, fechar os olhos para a camada social que floresceu a semente enraizada e persuadiu o desejo de consumo pela marca em todas as camadas da sociedade, é um aspecto que deve ser repensado com urgência.

 

 

 


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