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24/02/2022 às 16h44min - Atualizada em 27/02/2022 às 22h26min

Tarsila do Amaral: Ícone atemporal, artista nacional e muito mais que o ‘Abaporu’

Importante artista plástica do movimento modernista, Tarsila do Amaral foi uma mulher que desafiava os padrões sociais conservadores e se tornou uma grande influente na arte e na sociedade brasileira

Vitória Barbara - editado por Larissa Nunes
Retrato preto e branco de Tarsila do Amaral / Obra "Autorretrato" (1923), Tarsila do Amaral. (Foto: Reprodução / Pinterest)

Tarsila do Amaral nasceu no Município de Capivari (SP), no dia 1 de setembro de 1886. Filha de uma família rica, ela passou a infância nas fazendas de seu pai. Morou em São Paulo onde estudou no Colégio Sion, e logo após, foi enviada a Barcelona na Espanha para terminar os seus estudos. Aos 16 anos, pintou o seu primeiro quadro “Sagrado Coração de Jesus” em 1904, e ao retornar ao Brasil, casou-se com André Teixeira Pinto com quem teve a sua primeira e única filha, Dulce.

Dado ao contexto histórico, a posição social da mulher era de submissão quase total ao homem, na qual o papel feminino era exclusivamente voltado aos afazeres domésticos. Seu marido não concordava com a dedicação artística de Tarsila, no entanto, ela discordava com a desistência de sua carreira enquanto artista e, por esse motivo, foi de contramão aos costumes tradicionais da época pedindo a anulação de seu casamento alegando divergências culturais.

 

Tarsila do Amaral, ao lado de Anita Malfatti, Menotte del Picchia, Mário de Andrade e Oswald de Andrade, compôs o chamado “Grupo dos 5” após a semana de arte moderna de 1922. Foi a partir deste momento que sua trajetória artística começou a mudar.

Por está inserida em um período na qual a arte sofria forte influência da Europa e a maioria das obras eram importadas, Tarsila se preocupou em trazer a cultura brasileira para mais perto e levá-la além das fronteiras nacionais. A sua influência foi tanta, que ela expôs 17 obras na Galeria Percier, em Paris. Tarsila do Amaral pintou mais de 270 obras divididas em três fases. São elas:

  • Fase Pau Brasil: Marcada pelo uso de cores mais fortes e temas nacionais.
  • Fase Antropofágica: Inspirada pelos movimentos surrealistas e cubistas, trazendo um conceito de antropofagia também ligado ao nacionalismo.
  • Fase Social: Focada em temáticas sociais e cotidianas do país.

Com um vasto acervo de obras muito ricas e variadas, a artista Tarsila do Amaral foi uma das grandes representantes femininas, e fundamental, no movimento modernista da sociedade brasileira.

A Cuca (1924)



A obra representante da Fase Pau Brasil resgata a cultura nacional, trazendo elementos reais e imaginários da fauna brasileira, além de elogiar e homenagear um personagem de uma lenda muito importante que fez parte da infância da pintora e de muitas outras pessoas. Outro detalhe a mencionar, é que a obra reconhece a cultura regional folclórica e as cores ali presentes traz tonalidades vivas com temáticas rurais.
 

Tarsila do Amaral

“Encontrei em Minas as cores que adorava em criança. Ensinaram-me depois que eram feias e caipiras. Mas depois vinguei-me da opressão, passando-as para as minhas telas: o azul puríssimo, rosa violáceo, amarelo vivo, verde cantante, …” Ela dizia querer ser a pintora do Brasil, com cores e temas que remetiam aos contextos urbanos e rurais, flora, fauna e o folclore brasileiro.

O Abaporu (1928)


A Fase dita antropofágica se iniciou depois que Tarsila entregou a obra como presente para seu marido da época, Oswald de Andrade. Ao ser revelada ao público, a obra se tornou um dos quadros mais importante de Tarsila do Amaral, reconhecido nacionalmente e internacionalmente. O Abaporu, “homem que come” na língua tupi guarani, teve como objetivo inicial modificar as influências da cultura europeia produzindo uma arte genuinamente brasileira. O quadro traz a representação da cultura do Brasil com cores que identificam a bandeira nacional.

O corpo desproporcional do único personagem na tela, nos leva a refletir sobre a desvalorização do intelecto e a valorização da força física. Na época em que a obra foi pintada, a maioria das mãos de obras eram de trabalhadores que usavam o corpo para fazer trabalhos braçais. No fundo da tela, conseguimos enxergar uma vegetação vista com bastante frequência no Nordeste, outra referência aos trabalhadores que saiam de suas regiões atrás de melhores condições de vida.


Os Operários (1933)


Durante a Fase Social, Tarsila mostra sua sensibilidade com a causa operária no Brasil e no mundo. A obra possui vários personagens brancos, negros, crianças, idosos, homens e mulheres com feições diferentes e, atrás deles, grandes chaminés e prédios, reflexo de uma sociedade industrializada. Tarsila mostra a partir desta obra, as várias faces da classe trabalhadora e o quão massificado está a industrialização que, por consequência, oprime os trabalhadores. O quadro é caracterizado por cores mais sombrias e acinzentadas, representando a desesperança daqueles que, apesar do trabalho inesgotável, ainda necessitava do acesso a bens básicos como saúde e educação.


Segunda Classe (1933)


 

Ainda sobre a Fase Social, Tarsila aborda através da obra "Segunda Classe" a sua preocupação com a classe baixa e seu processo migratório. Muitas pessoas com poucas ou sem condições atravessavam o país perseguindo oportunidades de trabalhos e ascedência social. No entanto, muitas dessas chances que eram oferecidas a essas populações não eram o suficiente para conseguir sobreviver nas grandes capitais, onde se concentrava a maior parte da classe trabalhadora. No quadro há a existência de personagens descalços e com expressões tristes e vagas, além de rostos afinados que representam a fome daqueles que não tinham do que se alimentar.


Tarsila e sua influência

Tarsila do Amaral foi e continua sendo uma artista de grande influência em nossa sociedade. As suas obras não só refletem o contexto da arte na época em que o modernismo se destacava, mas como também condiz com o nosso contexto artístico atual. Ao analisarmos algumas obras produzidas hoje, iremos notar o processo de antropofagia. Muitos artistas, músicos por exemplo, pegam elementos de outras culturas e ressignificam ou reproduzem, assim, criando novos estilos de arte. Já a fase Pau Brasil, serve como critica a falta de procura por elementos nacionais da nossa cultura. O mundo está tão globalizado, que muitas vezes esquecemos da nossa identidade nacional e não valorizamos a cultura brasileira.


Na fase social, Tarsila expressa sua preocupação com a população de classe baixa e passa a questionar os problemas sociais que surgiu com a industrialização. O capitalismo sempre gerou riquezas, mas nem todos tinham acesso aos lucros, pois, para aqueles que trabalharam, a pobreza e o desespero por bens comuns permaneciam. Isso ainda é uma realidade muito presente em nossa sociedade. Apesar de que há uma maior diversidade migratória em nosso país atualmente, pessoas de classes mais baixas ainda protagonizam grandes fluxos migratórios no Brasil. Sua obra reflete com exatidão a vida de muitas pessoas que estão em busca de melhores condições, principalmente na região Sudeste que alcançou mais rápido a industrialização.
 
Tarsila do Amaral também foi uma mulher revolucionária. Apesar das circunstâncias sobre a quebra do padrão social da mulher na qual estava inserida, Tarsila não se deixou influenciar pelos valores morais e seguiu o seu caminho para a realização pessoal e profissional. Suas obras refletem exatamente a essência de sua personalidade forte e sua visão de mundo que condiz com a atualidade. Tarsila do Amaral não pode ser descrita com apenas por uma única obra. Ela deve ser reconhecida como Ícone atemporal, artista de grandes obras e uma importante representante do empoderamento feminino.


 


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