Lab Dicas Jornalismo Publicidade 728x90
25/02/2022 às 21h51min - Atualizada em 25/02/2022 às 21h35min

A poetisa premiada Zulmira Praxedes

Aos 95 anos, escritora lançou seu primeiro livro e venceu o Prêmio Nelson Seixas

Jerusa Vieira - Editado por Larissa Bispo
Foto: Divulgação / Diário da Região

O reconhecimento veio, de certa forma, tardio. Já com 95 anos, a poetisa Zulmira Nery Praxedes publicou seu primeiro livro, “Zulmira de Z a A”, lançado pela Editora Ponto Z, sobre histórias da sua infância no sertão da Bahia e a fuga para São Paulo devido à seca, em um estilo ritmado, feito literatura de cordel.

Foi esse mesmo livro que foi homenageado por escritores de todo o Brasil após vencer a edição de 2019 do Prêmio Nelson Seixas, um evento anual de São José do Rio Preto, que, além de contemplar a produção e publicação do livro, ainda realizou doação de exemplares às escolas municipais e oficinas de contação de histórias em quatro asilos e um abrigo a crianças carentes do município.

Desde criança Zulmira já colocava no papel versos que surgiam em sua mente e formavam uma rima. Ela até memorizava alguns desses e os recitava, prática que permaneceu mesmo com a idade avançada. Por mais que tivesse uma infância de miséria e marcada pela seca do sertão, a escritora encontrava inspiração nos acontecimentos do dia a dia e até mesmo observando o comportamento dos animais. 

“Eu sempre gostei de rabiscar coisas, apesar de ter uma letra péssima e horrorosa. Daí, eu gostava de rabiscar para melhorar minha letra. Todo verso que eu encontrava no pensamento, que rimava e tinha poesia eu escrevia e guardava em um cestinho", recorda Zulmira em uma entrevista para o Diário da Região, de São José do Rio Preto.




Admiradora da poesia e com vários registros de suas histórias escritos à mão e em papéis soltos, ela nunca teve a pretensão de publicar um livro. Porém sua neta, a fotógrafa Íris Zanetti, idealizou esse projeto após ter passado para o computador as poesias e histórias, muitas delas contadas pela avó durante a infância, para que não se perdessem com o tempo. 

O livro “Zulmira de Z a A” foi editado pela Editora Ponto Z, do jornalista Edmilson Zanetti, prefaciado pela filha de Zulmira, a psicóloga Inês Praxedes, e ilustrado com gravuras pela artista Marta Canteiro. Ele conta com mais de 100 poesias no estilo de literatura de cordel e possuem a oralidade ritmada do nordeste. 

Oito meses após ser premiada, a vida de Zulmira chega ao fim aos 95 anos. Semanas antes do seu falecimento, ela chegou a ter alguns de seus textos em um segundo livro, "No Cárcere com o Corona - Memórias etílicas, idílicas ou nem tanto", com relatos e reflexões sobre sua jornada na Casa de Repouso Santa Fé durante a pandemia de Covid-19 e o isolamento social, também publicado pela Editora Ponto Z. Em um texto desse livro, Zulmira apresenta algumas incertezas e questionamentos sobre reflexos da pandemia:

 

"Casa de Repouso Santa Fé, 7 de junho de 2020.

 

Estou há três meses aqui aguardando os desígnios de Deus.

 

Este não é meu mundo. Estou no planeta Terra, que em nada se assemelha ao mundo que eu deixei para trás — não parece o Planeta Terra. Nosso mundo anda cheio de expectativas e projetos. Aqui estamos isolados em uma clínica. Sem saber por que e para quê. Muita gente morrendo com um vírus desconhecido. Tudo muito fechado. Não podemos receber visitas nem visitar. O que aconteceu? Onde estão meus amigos, nosso povo, nossa gente? Esse não é o meu mundo. Cadê o Planeta Terra, com seus movimentos de rotação e translação?"


 

Por mais que sua vida tenha chegado ao fim, seu legado permanece circulando nas histórias de vida relatadas nas obras publicadas. E com dona Zulmira também está a lição de que não importa a idade, se é quase um centenário, há lugar na literatura para a pessoa idosa expressar seus sentimentos e reflexões. Nunca é tarde demais para se fazer ser ouvido e receber o reconhecimento que merece.


Relembre outras poetisas premiadas
 

O Brasil é um celeiro de poetas com grandes nomes que fizeram história com suas criações. Mulheres como Cecília Meireles, Adélia Prado e Cora Coralina ganharam reconhecimento e influenciam até hoje através de seus poemas e textos.


Cecília Meireles



Algumas premiações que Cecília teve foram o Prêmio Olavo Bilac (1938) e o Prêmio Machado de Assis (1965), ambos da Academia Brasileira de Letras. Não somente poetisa, Cecília também foi professora, jornalista e pintora, além de ser a principal representante feminina da segunda fase do modernismo no Brasil. Assim como dona Zulmira, ela começou a escrever alguns versos desde a infância, porém aos 18 anos Cecília lança seu primeiro livro de poemas “Espectros”. Sua poesia é marcada por um tom melancólico, a fuga da realidade, e temas como religião, amor, solidão, saudade e morte.


Cora Coralina

 

 








Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, mais conhecida como Cora Coralina, foi premiada com o Troféu Jaburu, concedido pelo Conselho de Cultura do Estado de Goiás, em 1981, e em 1984 ela foi a primeira escritora brasileira a receber o Troféu Juca Pato, da União Brasileira de Escritores (UBE). As obras de Cora Coralina falam majoritariamente sobre personagens marginalizados e a vivência na parte mais pobre de Goiás. Os textos possuem uma narrativa simples e linguagem informal, trazendo histórias da população mais humilde e com pouca escolaridade, alguns em forma de prosa e outros em forma de poesia. Assim como dona Zulmira, Cora Coralina teve seu primeiro livro publicado já com idade avançada, aos 76 anos, intitulado de “Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais”, livro que foi eleito como uma das 20 obras mais importantes do século XX.

Adélia Prado

Após a morte da mãe, em 1950, Adélia Prado começa a escrever seus primeiros versos. Somente em 1975, aos 40 anos, ela publica seu primeiro livro solo de poesias chamado “Bagagem”, pela Editora Imago. Em seguida, Adélia lançou mais algumas obras em prosa como "Solte os Cachorros" (1979) e "Cacos Para Um Vitral" (1980). Seus poemas possuem forte voz feminina, retratando a vida de personagens do interior mineiro, com uma linguagem coloquial, mais despojada e direta. Também está presente a fé católica da escritora, falando sobre Deus e família. Adélia recebeu da Câmara Brasileira do Livro o Prêmio Jabuti de Literatura, com o livro "Coração Disparado", escrito em 1978. Além de poetisa, ela também é diretora de peças teatrais, atuou como professora, formou-se em filosofia, já esteve na Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Divinópolis como Chefe da Divisão Cultural.




 


Link
Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »