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10/09/2022 às 16h50min - Atualizada em 10/09/2022 às 15h56min

Vinte anos de "Cidade de Deus": a importância e o legado do filme

O filme, apesar de ter sido lançado a duas décadas, continua trazendo temas atuais da sociedade brasileira, além de carregar consigo uma grande importância para a cultura e o cinema do país

Ana Lara Venturini - editado por Larissa Nunes
Capa do filme Cidade de Deus, 2002. (Foto: Reprodução / Amazon)

Vinte anos depois, "Cidade de Deus" segue espantosamente atual e, a cada vez que assistimos, podemos tirar novos aprendizados do filme – tanto sobre o cinema e a forma de contar uma história, quanto na dura realidade de muitos lugares do Brasil. O filme, desde seu lançamento, divide muito opiniões, mas inegavelmente carrega um grande legado para o país por conta de sua importância.

A história de Cidade de Deus já nasceu para ser um clássico. O filme de Fernando Meirelles estreou no dia 30 de agosto de 2002 e logo comprovou que era muito mais do que um “favela movie” e revolucionou o cinema brasileiro.

Marco do cinema nacional e da cultura do país, até hoje o filme é referência de técnicas de roteiro e produção audiovisual, além de ter aberto caminhos para um novo gênero. Ele também trouxe para a discussão temas necessários como a desigualdade social e o feminicídio, que seguem presentes até hoje, além de ter trazido aspectos como o tom cru, naturalístico e o ponto de vista interno à comunidade.

 

Trailer oficial do filme "Cidade de Deus", de 2002. (Vídeo: Reprodução / YouTube - 02 Filmes)


 

Para realizar o filme, Meirelles e seus produtores tiveram que passar por um longo e exaustivo processo de captação de recursos, que incluiu incentivos governamentais, infusão de patrocinadores e dinheiro do próprio bolso. A jornada, que teve apoio da Lei de Incentivo à Cultura, durou meia década, entre 1997 e 2002.

O filme já é uma novidade quando traz pela primeira vez pessoas da favela para atuar, contando com poucos atores profissionais. Jovens anônimos foram preparados para interpretar os personagens retratados.

Logo o filme começou a ser visto com alguma coisa diferente no ar, porque havia a comunicação fácil com a plateia. Ali estava a realidade retratada em vídeo. Aqueles atores que ninguém sabia quem eram agiam com tanta naturalidade, pois eram os próprios personagens que interpretavam.
 
Legado

Este é um filme que possui um legado complexo. As quatro indicações ao Oscar, de Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Edição e Melhor Fotografia ganham bastante atenção por serem uma prova concreta, quantificável desse sucesso, mas a influência pop de Cidade de Deus é sentida muito além dos ciclos acadêmicos.

Comprovando sua enorme importância ele é, até hoje, o segundo filme em língua não-inglesa mais visto do planeta, segundo a plataforma Preply. Ele também já foi citado como inspiração pelos criadores Luke Cage, da Marvel.


 

Cidade de Deus não criou o reality tour, mas o filme certamente fez com que o interesse nesse tipo de turismo aumentasse. O termo “reality tour” se refere à prática de levar visitantes estrangeiros às favelas para “experimentar a realidade” desses lugares, em programas turísticos caríssimos que às vezes até incluem um papo com os chefes do tráfico de drogas da região. Embora existam desde os anos 1990, incentivados pela cobertura midiática sensacionalista da violência nas comunidades, o advento dos favela movies, influentes no Brasil e fora dele popularizou a modalidade.


Havia muita ginga, música e charme no filme. Mas também muita violência, o que acabava por parecer algo "obsceno". Esta era uma discussão entre críticos, porque obscena, de fato, era a vida real, não o cinema que a representava na tela.

A concepção de Cidade de Deus como um “choque de realidade”, seja pela crítica que o recebeu ou pelos artistas que o conceberam, é falha por si só.

“É um choque só para alguns grupos da nossa sociedade. Para outros, é só o cotidiano, e infelizmente continua sendo. [...] As coisas dentro de territórios que vivem essas disputas não mudaram não, talvez estejam até mais acirradas”, diz Mércia Britto CEO do Cinema Nosso.


Cidade de Deus, tanto o livro como o filme, entravam na conta de retratos fidedignos do desajuste social brasileiro, mas já não na literatura realista ou na crítica do Cinema Novo. Era outro jeito, outro ritmo. O humor e esse charme bruto jogado na tela, enquanto falavam de situações graves e trágicas, provocavam repulsa em alguns, dúvidas em outros e fascínio talvez na maioria.



A crítica se dividiu. Parte detonou a obra sem piedade, acusando-a de uma visão fascista sobre as classes populares. Outra parte considerou-a uma verdadeira obra-prima. Alguns, mais colonizados, tentaram dizer que era a carta de maioridade do cinema brasileiro, que por fim havia aprendido a fazê-lo no estilo dominante, “made in Hollywood”. Alguns poucos conseguiram enxergar a força radical que turbinava o filme, sem deixar de notar seus problemas e eventuais impasses éticos.


 


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