Lab Dicas Jornalismo Publicidade 728x90
14/02/2023 às 16h22min - Atualizada em 14/02/2023 às 16h08min

Cordel das rosas: A rede de conexão de mulheres cordelistas do Nordeste

Grupo virtual criado na pandemia estimula escritoras a disseminar o cordel pelo Brasil

Valéria Soares - Editado por Nicole Bueno
Arquivo Pessoal

Sou mais uma das Marias

Como tantas neste chão

Mas para facilitar

Dou-lhe uma dica então,

Meu nome é Maria José

Do Leste do Maranhão.

 

Sou da Terra das palmeiras

Maranhão é o meu lugar

Nasci na bela Matões

Fiz de Timon o meu lar

Cordel é meu companheiro

Me ajuda a caminhar.

 

As estrófes escritas pela professora Maria José Soares, 59 anos, é como ela se apresenta quando vai falar do seu trabalho com o cordel. Desde a infância esteve envolvida com o gênero literário através de seus familiares.“Assistia as cantorias de viola, aprendi sobre cordel acompanhando os escritos de um tio (Jesus Soares - in memória), com minha mãe, Maria das Neres, que também fazia quadrinhas simples e "passava a limpo" (reescrevia) os escritos rudimentares do meu tio.Tão logo ela acabava, eu era a primeira leitora”, conta. 

 

Na infância também ouvia o pai, Elias Olaia, recitar trechos de cordéis para ela e os irmãos. Escrever cordel virou um hobbie, a cordelista criava rimas, mas não enxergava o valor do trabalho.”Fazia uma autocrítica negativa do meu potencial como mulher que escrevia cordel ao ponto de não me considerar cordelista, e muito menos com potencial para publicar”, afirma. No entanto, em 2020, quando a pandemia se instalou no mundo e as conexões virtuais aumentaram em sua rotina, entrou no grupo de WhastApp Cordel das Rosas, a convite da cordelista Alagoana, Luciene Albuquerque.



 

Se conectar com outras escritoras fez ela perceber que suas produções eram de qualidade e muitas colegas passam pelo mesmo. O grupo foi formado pela poetisa, Silvinha França, 43 anos,  no dia 30 de março de 2020. A Paraíbana decidiu criar o Cordel das Rosas para ser um movimento inclusivo e participativo.

“O movimento vem ganhando força cada vez mais. São várias mulheres de estados brasileiros, maioria do Nordeste. É um movimento não somente de cooperação na parte literária, mas é um movimento de cooperação feminina, humana”, relata a cordelista, que também tem influencia do cordel desde a infância durante o processo de alfabetização. 

 

Cada integrante do grupo tem um nome de uma rosa. A professora cearense, Fátima Teles, 53 anos, pediu para ser inserida no grupo, pois gostou da proposta. Além de contribuir com a discussões da literatura de cordel e o feminismo, dar visibilidade e reconhecimento as escritoras. “Hoje sou uma das inseridas (os) no Projeto Sesc Cordel  de Juazeiro do Norte e  Crato-CE. Publicados pelo Sesc tenho 5 livros e mais 4 independente. Outros Cordéis  em antologias e três premiados: Um pela Universidade de São Paulo- USP; outro pela Universidade Federal da  Paraíba-UFPB/ Cajazeiras; outro pela Imprensa Oficial do Estado do Pará, IOEPA, no primeiro Concurso  Literário  Dalcídio Jurandir”, explica sobre sua produção, que começou em 2018 através de uma oficina no SESC (Serviço Social do Comércio) de Juazeiro do Norte.


 

 

Além dela, outra rosa que se indetificou com o grupo foi a professora Aurineide Alencar, 57 anos. Nascida no sertão da Paraíba, mas residente em Mato Grosso, disse ter participado a vida toda de grupo feito por homens. “Eu me encontrei no Cordel das Rosas”, pondera. Autora de 5 livros, dois E-books e Cento e vinte e sete folhetos de cordéis, foi curada do câncer e da depressão escrevendo suas dores e tristezas através de versos de cordel. “Escrever e ler cordel é para mim é o ar, o remédio, é tudo que eu preciso para viver. É uma alegria que invade minha alma. Eu sou apaixonada pelas rimas e pela musicalidade que o cordel oferece”, descreve a escritora das obras Nas veredas do cordel, Vida em versos, Mato Grosso do Sul nas asas do cordel, Embrenhando-se em cordel, Pescador de cantos, Dourados vive o cordel e Semeadora de cordéis.

.


 

Silvinha França conta que durante a pandemia lives eram realizadas entrevistando as rosas do grupo. “Todas as quintas-feiras, ao pingo do meio dia,  faziamos a live Almoço com Poesia.”. As 41 rosas se reúnem virtualmente a cada mês. A maior parte do grupo é composto por professoras, que são semeadoras da palavra nas escolas, universidades e eventos culturais. A cordelista Fátima Teles reitera que a união de escritoras reforça o valor do patrimônio que é Cordel  na literatura Brasileira. “Gosto do Cordel que informa, que fala sobre a História,  provoca o pensar, questiona, traz o folclore, o conto popular”.

 

As mulheres do Cordel 

 

Originado em Portugal entre os séculos XII e XII, o cordel chegou no Nordeste e foi disseminado pelos repentistas (violeiros que cantam versos rimados). É um patrimônio imaterial brasileiro baseado no fólclore e imaginário popular. A primeira mulher cordelista foi Maria das Neves Batista Pimentel. A paraíbana começou a publicar em meados da década de 30 com o pseudônimo do marido Altino Alagoano.”Naquela época o preconceito grande na sociedade e a mulher não podia publicar nenhum texto. Imagina um texto em cordel, com uma linguagem mais acessível”, comenta a cordelista Silvinha França. 

 

Hoje, a força feminina é forte no cordel. Outros grupos e coletivos já foram formados pelo Brasil.”Isso é belo e grandioso para o mundo literário”, diz a autora dos cordeis a princesa Encantada na lagoa do Caju, Um autista em minha vida, SIVUCA: o poeta dos sons, Celso Furtado, e primeiro cordel coletivo feito pelo grupo Cordel das Rosas, intitulado: Quando tudo isso passar.

 

O Cordel das Rosas estimulou escritoras a publicar. A professora Maria José criou um perfil no Instagram (@cordeisdamaze) para publicar seu trabalho. Atualmente tem quatro livros publicados: As travessuras de um lobo diferente, A Menina e o Galo da madrugada e um cordel homenagem: Alírio Barreto Filho:  Sua vida, sua história. Missionários Combonianos" 70 anos de História e missão.


“Produzir cordeis e publicá-los nas redes sociais, foi algo libertador. Durante a Pandemia da COVID- 19, foi companhia e terapia e hoje digo sem sombra de dúvidas: O Cordel é meu companheiro!”. 



 

Onde encontrar os cordéis? 

Aurineide Alencar- Plataforma MS digital, Youtube “Cordelista Aurineide”, WhatsApp (67) 981161982

Fátima Teles- Bibliotecas  do Sesc Juazeiro do Norte  e Crato.

Maria José Soares- Instagram Cordéis da Mazé, Soslaio Editora e WhatsApp  (86) 98878-5470

Silvinha França-  Livraria Cultural no Partage Shopping no Rio Grande do Norte

Projeto Cordel das Rosas nas redes sociais: @cordeldasrosas 

 

Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »