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29/03/2023 às 10h00min - Atualizada em 29/03/2023 às 09h21min

Brasil está no topo do ranking de cirurgias íntimas no mundo

Até onde é saudável seguir os padrões de beleza?

Maria Eduarda de Santana Santos - Editado por Maria Eduarda

No início de Março, a influenciadora Daniele Lopes viralizou nas redes sociais por postar um vídeo dançando onde usava um biquíni ao contrário a parte do fio dental estava vestido para frente , o que gerou muitos comentários direcionados ao corpo da influencer, mais especificamente ao tamanho da região íntima dela. O vídeo gerou uma grande repercussão e com ele vieram muitos comentários machistas e ofensivos com o corpo de Daniele, que ficou famosa em 2020 por repetir inúmeras vezes uma única dança em seu perfil com a música “Não pode se apaixonar” do cantor Xand Avião. 

 

A influenciadora recebeu muitas críticas maldosas em torno do seu corpo e surgiram muitas especulações sobre uma suposta cirurgia de lipoaspiração na região íntima. O assunto foi tratado de forma polêmica, como se Daniele estivesse escondendo alguma cirurgia plástica já que seria impossível ter um órgão genital tão pequeno, de acordo com os internautas. O que traz uma reflexão: quantas mulheres fazem cirurgias plásticas na região íntima e escondem? 

 

Atualmente com o uso da internet e o vício das redes sociais, vivemos numa era performática onde atuamos e agimos com o único objetivo de compartilhar nossas vidas e experiências nas redes sociais. Tendências estéticas sempre existiram, mas hoje em dia é muito mais comum a realização de cirurgias estéticas para entrar dentro de padrões visto nas redes sociais, na maioria das vezes por pessoas famosas de alta influência, como o preenchimento labial da Kylie Jenner. 

 


(Foto: Getty Images)

 

De acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica, em 2020, o Brasil se tornou 2º lugar no ranking de países que mais realizam cirurgias plásticas no mundo, com 1,3 milhões de procedimentos estéticos realizados, perdendo apenas para os Estados Unidos.

 

O uso de cirurgias estéticas para entrar num padrão está muito relacionado ao fato de as redes sociais serem uma representação falsa da realidade, e quando pensamos em cirurgias estéticas pubianas, relacionamos esta problemática à indústria pornográfica  que sempre esteve nessa posição de estabelecer o que é bonito e ideal em um corpo: lábios vaginais claros e sem manchas, de tamanho pequeno e enrijecidos, sem nenhum tipo de flacidez. A imposição de um formato e padrão ideal influencia em como as mulheres veem seus próprios corpos,além do público masculino, que por ser o sexo que mais consome conteúdo pornográfico, acabam estabelecendo o que é aceitável ou ideal em um corpo feminino. 

 

No caso da influenciadora Daniele Lopes, basta um clique nos vídeos para que os comentários escritos por homens surjam, expressando o quanto gostam ou desgostam do tamanho da genitália da influencer. Além dessas interações, algumas mulheres riam nos comentários do tamanho do órgão genital. 

 

A internet como um todo pode ser um grande gatilho na vida das pessoas, a forma como você pode mudar sua aparência em decorrência da opinião de pessoas que você não conhece, pode mudar toda uma vida. Em entrevista, Daniele Lopes se pronunciou sobre os comentários negativos: 

 

Eu simplesmente não dou importância ao que os outros pensam e as críticas negativas e estou sempre focando nas pessoas que gostam de mim, que me incentivam, que estão sempre ali torcendo por mim, mandando mensagem de carinho. Quem não gosta de mim, quem critica, hates, sempre vão aparecer, mas centralizo minha energia no que vem de positivo. 

 

E mostrando ser bem humorada, Daniele soube lidar bem com a polêmica, fazendo vídeos com roupas totalmente cobertas e até mesmo com uma camisa escrita “anuncie aqui”, em outro vídeo estava escrito “roupa não define caráter”, confrontando todos os comentários maldosos contra seu corpo e suas roupas: 

 

Foi uma ação conjunta com minha agência - Aloha Influencer - para conscientizar as pessoas que elas podem vestir o que quiserem e ninguém tem direito de se meter. [..] só estou fazendo o que eu gosto de fazer e me expressando da forma que eu gosto, através da dança.

 

O ataque à própria Dani é notório, mas como se sentem outras mulheres que têm o corpo similar ao dela?

 

Para a Dra. Marilene Vale, membro da Comissão Nacional de uroginecologia e cirurgia vaginal, da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), o procedimento estético na genitália feminina não é indicado:

 

A Febrasgo já se posicionou sobre ser contra a procura por um procedimento estético, que é quando se caracteriza que a genitália dessa mulher esteja com alguma coisa anormal, não há, genitália sempre é individual, cada mulher tem a sua e não tem um padrão de normalidade restrita.

 

Em contrapartida ao pensamento da doutora, como forma de salvação da região íntima, os procedimentos estéticos são frequentemente divulgados em perfis de médios cirurgiões plásticos, que prometem a genitália perfeita. As técnicas vão contra o Código de Conduta Ética, já que há a possibilidade de indução advindas pelos profissionais para que as pacientes realizem cirurgias plásticas por estética, sem que haja a necessidade de o procedimento ser realizado. 

 

De acordo com a Dra. Marilene, é importante que os médicos ginecologistas e cirurgiões plásticos ouçam suas pacientes e tirem o máximo de dúvidas possíveis, pois mais de 90% dos casos poderiam ser evitados se o profissional se dispor a esclarecer e indicar de forma responsável o que é ideal para aquela pessoa:

 

Portanto cabe ao médico identificar critérios que justifiquem a intervenção, ou seja, corrigir apenas a “estética” da região íntima, pode não ser o suficiente para tratar os problemas relacionados a dor psicológica que por hora está direcionada para região genital, e que pode representar a falta de aceitação do próprio corpo. A genitália feminina, deve ser lembrada nesse aspecto como um órgão que está sendo foco de algo mais fácil de ser cirurgicamente modificado.

 

Não só a cirurgia plástica pode ser um problema na aceitação dos seus corpos, mas outros tipos de procedimentos também. Em conversa com a Doutora e fisioterapeuta pélvica, Juliana Bonanni, foi explicado que a procura por procedimentos estéticos na área íntima por pessoas com vagina aumenta no Brasil: A demanda é crescente, e a maior queixa é referente ao escurecimento da região íntima, incluindo vulva e virilha.”

 

No ramo da estética, a indústria de depilação e clareamento, que não se enquadram como cirurgias plásticas, cresce em relação à demanda feminina. No Brasil, em 2022, o setor cresceu cerca de 8,8% em faturamento. Os procedimentos desse ramo costumam ser divulgados como "embelezamento" e "rejuvenescimento" da área íntima, o que problematiza as vulvas que estão fora do “padrão”, composto por modificações estéticas. 

 

Segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica, em 2020 o Brasil foi recordista mundial na realização da labioplastia (procedimento que reduz os pequenos lábios vaginais), naquele ano, a cirurgia foi feita em 20.334 mulheres. De acordo com a ginecologista Lucia Alves da Silva Lara, presidente da Comissão Nacional Especializada em Sexologia da Febrasgo, a procura pela labioplastia é muitas vezes estética. 

 

A procura pela vulva perfeita ou pelo órgão genital harmonioso é uma preocupação social assim como os procedimentos estéticos convencionais. Tendências mudam toda hora e pode ser que uma cirurgia plástica na região íntima realizada agora, daqui a algum tempo não seja o suficiente para aquela pessoa, que consequentemente começará a não gostar da sua região íntima mais uma vez por não se enquadrar nos padrões estéticos. 


 

NICOLAU, Analice. Negócios e Beleza: Busca por depilação a laser aumenta e número de franquias especializadas pelo Brasil em 2022. Jornal de Brasília, 2022. Disponível em: <https://jornaldebrasilia.com.br/blogs-e-colunas/analice-nicolau/negocios-e-beleza-busca-por-depilacao-a-laser-aumenta-e-numero-de-franquias-especializadas-pelo-brasil-em-2022/amp/>. Acesso em dia: 25/03/2023.

 

GARCIA, Mariana. Na busca pela 'vulva perfeita', Brasil é líder em cirurgias na 'ppk': saiba o que é a labioplastia e quando é indicada. G1, 2022. Disponível em: <https://g1.globo.com/saude/sexualidade/noticia/2022/08/27/na-busca-pela-vulva-perfeita-brasil-e-lider-em-cirurgias-na-ppk-saiba-o-que-e-a-labioplastia-e-quando-e-indicada.ghtml>. Acesso em dia: 26/03/2023.

 

EMBELEZAMENTO no trato genital inferior feminino: Qual o limite ético?. Febrasgo, 2018. Disponível em: <https://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/380-embelezamento-no-trato-genital-inferior-feminino-qual-o-limite-etico>. Acesso em dia: 26/03/2023

 

Brasil ocupa o segundo lugar no ranking de países que mais realiza cirurgias plástica. Valor Econômico, 2022. Disponível em: <https://valor.globo.com/patrocinado/dino/noticia/2022/08/05/brasil-ocupa-o-segundo-lugar-no-ranking-de-paises-que-mais-realiza-cirurgias-plastica.ghtml>. Acesso em dia: 26/03/2023


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