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23/07/2019 às 13h10min - Atualizada em 23/07/2019 às 13h10min

Ao afirmar que “fome é mentira”, Bolsonaro nega pesquisas e índices sobre o tema no Brasil

Dados da ONU desmentem a fala do líder brasileiro, que admitiu pouco tempo depois que "uma pequena parcela passa fome" no país

Laura Arcanjo - Editado por Naryelle Keyse
Reprodução: Marcos Corrêa/PR
Durante café da manhã no Palácio do Planalto com representantes de 12 veículos de comunicação internacionais no último dia 19, Bolsonaro negou a existência de pessoas passando fome no Brasil.

"Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não. Você não vê gente, mesmo pobre, pelas ruas com físico esquelético como a gente vê em alguns outros países pelo mundo", afirmou o presidente.

A alegação foi em resposta a uma representante do jornal espanhol El País, que questionou sobre as medidas que o governo tem adotado para reduzir a pobreza no país, ao mencionar a preocupação com a desigualdade no Brasil exposta pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Confira o vídeo com as declarações do Presidente


De acordo com um levantamento feito por agências da ONU, os dados mais recentes relacionados ao tema apontam que em 2017, 5,2 milhões de pessoas no Brasil passaram ou um ou mais dias sem alimentação. Além disso, informações do próprio governo revelam que aproximadamente 15 pessoas morrem de desnutrição por dia.

Enquanto deputado, Bolsonaro afirmou que a solução para a fome, a miséria e a violência era esterilizar os mais pobres para evitar que eles tivessem filhos. O presidente tentou mudar o que disse com propriedade, admitindo que “alguns passam fome”, mas justificando: “não é culpa minha, vem de trás”.

Bolsonaro também criticou as políticas dos governos anteriores e a criação de bolsas, argumentando que o Brasil "é o país das bolsas". E completou dizendo que "o que faz tirar o homem da miséria ou a mulher é o conhecimento".

Não é a primeira vez que o atual governo se refere à fome no Brasil. Em abril, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, afirmou que "nós não passamos muita fome porque temos manga nas nossas cidades, nós temos um clima tropical".


Fome no país
Especialistas apontam a crise econômica e o desemprego como fatores que estão relacionados aos índices de fome e miséria. No Brasil, 2,5% da população se encontra em grave situação alimentar. Segundo o relatório sobre o Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo, apresentado em 2019 pela FAO (órgão da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura). Os dados, referentes aos anos de 2016, 2017 e 2018, compreendem que 5,2 milhões de brasileiros passaram pelo menos um dia inteiro sem comer ao longo do ano.


Confira o relatório sobre o Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo 

Outro relatório da FAO, de outubro de 2018, especifica que o número de pessoas vítimas da fome no Brasil caiu de 10,6% da população – cerca de 19 milhões de pessoas – no começo dos anos 2000 para 2,5% no período de 2008 a 2010. O organismo destaca o papel dos programas de transferência de renda nesses avanços, como o Bolsa Família, que distribui 28 bilhões de reais aos mais miseráveis e é mencionado como um elemento que ajudou a combater a insegurança alimentar no país.

“Acabar com a fome não é oferecer qualquer tipo de comida. Tem que oferecer alimentos produzidos de maneira limpa, justa, promovendo o desenvolvimento econômico e social. A fome é a ponta de um iceberg de violações de direitos”, explica ex-presidente do Consea, Elisabetta Recine.

Aumento da pobreza no Brasil
O aumento da pobreza extrema da América Latina se dá, em boa parte, pelo mau desenvolvimento do Brasil, o país mais populoso da região que entre 2015 e 2017 teve um aumento de 4% para 5,5% de pessoas em condições de pobreza extrema.

Segundo o IBGE, entre 2016 e 2017 a pobreza no Brasil passou de 25,7% para 26,5%. O número de extremamente pobres – aqueles que vivem com menos de 140 reais mensais – passou de 6,6% em 2016, para 7,4% em 2017.

Estimativas do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) de 2015, mostram que 7.335 pessoas dormem nas ruas da capital paulista – e outras 8.570 passam a noite em abrigos.

Os dados do Ipea, fundamentados em informações das prefeituras, levam em conta apenas aqueles que buscam assistência ou que estão em praças e vias mais movimentadas. Por conta disso, órgãos como o Conselho Nacional de Direitos Humanos, acreditam que o país teria mais de 400 mil moradores de rua vivendo em terrenos baldios, lixões e outros lugares em que a assistência não chega.

A única política nacional direcionada a essa população, estabelecida pelo governo federal em 2009, foi aderida por apenas oito capitais: Brasília, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte, São Paulo, Salvador, Fortaleza e Rio de Janeiro.

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