O anúncio do fim das apresentações foi responsável por uma inesperada alta na venda de ingressos: foram 2,2 milhões de dólares arrecadados, o que levou à decisão de adiar em oito semanas a despedida do clássico. A nova data passou a ser o dia 16 de abril de 2023 e, dessa vez, será definitiva. O produtor Cameron Mackintosh, responsável pelo “O Fantasma” desde sua estreia, disse que não vai adiar o encerramento mais uma vez. Além disso, a Shubert Organization, companhia responsável pela maioria dos teatros da Broadway, afirmou que planeja renovar o Majestic Theater, onde o musical se apresenta.
“O Fantasma da Ópera” nasceu do trabalho conjunto de três figuras emblemáticas da história dos musicais: o compositor Andrew Lloyd Webber, o diretor Hal Prince e o produtor Cameron Mackintosh. Baseada no romance clássico do escritor francês Gaston Leroux, estreou em Nova York em 1988. No ano de estreia, o espetáculo conquistou sete Tony Awards, incluindo melhor musical. Ao longo dos 35 anos em que está em cartaz na Broadway, conquistou mais de 70 prêmios e foi visto por cerca de 19,8 milhões de pessoas. “O Fantasma” marcou a carreira de lendas da Broadway, como Michael Crawford, Sarah Brightman, Judy Kaye. No entanto, nem toda a tradição pôde manter as cortinas abertas para sempre.
Teatro pós-pandemia
O musical de Webber se tornou mais uma das vítimas da indústria do teatro pós-pandemia. Depois de praticamente dois anos de isolamento social, a recuperação do setor não tem sido fácil. O retorno lento da audiência, somado à inflação que atinge os Estado Unidos, contribui para que produções de larga escala tenham dificuldade de se manter. De acordo com uma reportagem publicada pela Folha de S. Paulo em 2022, menos da metade do público de antes da pandemia assistiu a um espetáculo da Broadway naquela temporada. Um estudo realizado pela TRG Arts com 143 organizações de artes cênicas americanas concluiu que o número de ingressos vendidos caiu 40% na temporada 2021-2022.
O teatro Metropolitan Opera House teve uma queda de aproximadamente 18% no público pagante. A Baltimore Symphony Orchestra cortou dez concertos da programação depois que o público passou para 40% da capacidade. O Carnegie Hall passou a promover menos concertos: 115, em comparação com os 170 pré-pandemia. Segundo o estudo, a queda pode ser atribuída a vários fatores, como a preocupação com o coronavírus e a mudança de hábito em relação a assistir a eventos ao vivo. No caso de “O Fantasma da Ópera”, há quem diga que outro motivo contribuiu para a queda de audiência.
Em artigo publicado na Revista Veja, o jornalista Marcelo Canquerino defendeu que a trama não envelheceu bem. Para ele, o musical não se relaciona tão bem com as novas gerações porque retrata relacionamentos tóxicos entre os protagonistas sem nenhum tipo de problematização, o que talvez fosse visto como uma grande história de amor no século XIX. De fato, o enredo se desenvolve a partir do conhecido triângulo amoroso, no qual a protagonista tem que escolher entre os dois “mocinhos”.
O espetáculo conta a história da jovem Christine Daaé, aspirante a cantora na Ópera de Paris no século XIX. Ela é treinada pelo misterioso Fantasma, um homem mascarado que vive escondido na casa de ópera. Contudo, os acontecimentos se tornam sombrios quando ele a escolhe como musa ao mesmo tempo, em que Christine se apaixona pelo amigo de infância Raoul.
A trama pode ser antiga e uma maior reflexão sobre as relações dos personagens não faria mal, mas o musical está inserido no mundo atual. Em janeiro, Emilie Kouatchou foi escalada para o papel principal de Christine. Kouatchou se tornou a primeira atriz negra norte-americana a fazer a protagonista na peça, o que quebrou barreiras raciais e fez história na Broadway. Além disso, “O Fantasma” conta com uma legião de fãs, que usaram as redes sociais para comentar a notícia do encerramento das apresentações. Os internautas destacaram a importância da obra para o público e para os artistas. Segundo a produção, o musical já empregou cerca de 6500 pessoas, incluindo 400 atores.
Ainda que a cortina feche pela última vez no teatro novayorkino no dia 16 de abril, esse não será o fim de “O Fantasma da Ópera”. As apresentações continuarão em Londres, que fechou no auge da pandemia em 2020, mas que voltou abrir um ano depois com reconfigurações para baixar o custo, e na Austrália, onde estreou em 2022. Haverá também uma produção na China e uma versão em espanhol com o ator Antonio Banderas. Sobre o futuro nos Estados Unidos, Mackintosh disse ao The New York Times: “Eu tenho certeza que em algum momento vai [voltar para a Broadway]. É um ótimo espetáculo, e os grandes clássicos voltam”. Talvez a volta a que se refere Mackintosh seja uma versão mais barata dentro de alguns anos, como o produtor fez com “Os Miseráveis” de Londres, no atual Sondheim Theatre. Até lá, “O Fantasma da Ópera” da Broadway será lembrado, lembrado com o carinho de quando disser adeus.
Trailer oficial de "O Fantasma da Ópera" na Broadway. (Reprodução: The Phantom of the Opera - Youtube).