Desde que a pandemia ocasionada pelo novo coronavírus chegou ao mundo, nossa maneira de viver sofreu alterações. O modo como fazemos compras no supermercado, nossa relação com os amigos, a maneira que trabalhamos ou estudamos... tudo mudou. O mesmo aconteceu com quem faz parte do projeto social CircoLo Social, localizado na cidade de Búzios, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro.
O projeto que existe há 18 anos, coordenado por Antonio Carlos Pap. Ele, que já foi presidente do grêmio da Escola Nacional de Circo e ter iniciado uma companhia de artistas, trabalhava com alguns projetos sociais como o 'Afro reggae' e 'Nós do morro' no Rio de Janeiro, foi contactado pela prefeitura municipal de Búzios que buscava alguém que pudesse implantar na cidade do interior um projeto com oficinas livres e técnicas de circo. Pap como é conhecido entre os alunos, foi o indicado para cumprir esta missão. Desde então, ele e sua equipe trabalham com a função de ensinar as técnicas de circo e também cooperando para o desenvolvimento social de cada aluno que participa.
Desde que as atividades presenciais tiveram que ser paralisadas após o decreto municipal de isolamento social ser implementado devido a pandemia do novo coronavírus, os professores precisaram se reinventar para manter o contato com os alunos e continuar incentivando cada um deles. Os colaboradores do CircoLo têm dado ênfase nesse momento a história do circo, eles produzem uma série de vídeos que são postados no canal do Youtube do projeto, onde é apresentado de forma ordenada e rotineira para o aluno para que ele tenha base sobre a história circense e atividade física que vão ajudá-los a ter uma melhor performance física e consequentemente de bem-estar.
"Os professores como sempre mostraram que dá pra tirar proveito da situação. Eles adaptaram as aulas à vídeos, coisas que fazemos nas aulas presenciais, muito bem explicadas e exemplificadas em vídeo. Eles tornaram isso mais fácil de lidar, o que ajudou. A gente consegue se sentir mais próximo com tanta coisa que o circo oferece", pontua a aluna.
Uma coisa que a coordenação do projeto considera importante estar fazendo nessa quarentena é criar uma rotina. Para cada dia da semana existe uma atividade que o aluno pode participar, por exemplo aulas no YouTube em formato de estreia onde após assistirem juntos o vídeo, os alunos podem comentar sobre o conteúdo daquele dia. Encontros para fazer alongamento coletivo e uma roda de conversa via aplicativo de videoconferência onde eles podem ver uns aos outros e interagir, contar como tem sido os dias, quais ansiedades têm afligindo cada um deles.
Uma live também é feita no Instagram toda semana com um convidado diferente da comunidade local. Participam, ex-alunos e pessoas de relevância nacional e internacional, desde psicólogos, fisioterapeutas, empreendedores, e artistas que são convidados a contar suas experiências desde sua origem até chegar ao lugar onde está inserido atualmente, dessa maneira se abre um novo horizonte de possibilidades para o aluno.
"Temos histórias de pessoas em que o bisavô era pescador, o avô era pescador, o pai era pescador e ele achava que tinha que ser pescador mesmo não tendo mais mercado para isso hoje em dia, e aí você dá para ele uma possibilidade, uma esperança de buscar algo a mais para sua vida, então isso é o grande barato para a gente", conta Antonio Carlos.
A situação financeira do projeto ficou difícil depois que a prefeitura cortou o repasse de verba que era destinado para manter as atividades presenciais do CircoLo funcionando. Os governantes não reconhecem a virtualização dessas atividades que são oferecidas pelo projeto desde o início de calamidade pública. Mas a equipe de voluntários e os coordenadores do CircoLo acreditam que com o tempo a prefeitura vai entender que esse tipo de atividade é importante que seja valorizado.
"E a gente é incansável, estamos a vários meses sem receber, em negociação com a prefeitura, mas a equipe é muito engajada no que está fazendo, porque ninguém arreda o pé. É frustrante, é cansativo, mas a gente segue a estigma do palhaço, não importa o que aconteça o show tem que continuar. Porque a gente entende onde esse material está chegando, que é no aluno que está em casa, sem conteúdo de qualidade para passar o dia a dia", reforça Pap que está a frente do projeto.
Para buscar maior colaboração financeira, o CircoLo Social promove uma arrecadação online através da plataforma Catarse. Antes da pandemia todo valor arrecado era destinado no envio da equipe para a participação de uma semana de aperfeiçoamento e alinhamento de pensamentos com outros projetos sociais que trabalham com o circo. Mas diante da atual situação, todo verba será revertida em cestas básicas e insumos e distribuídos nas comunidades da cidade de Búzios.
O CircoLo atende pessoas dos 7 "até os 99 anos de idade", brinca Pap. Hoje eles recebem aproximadamente 350 pessoas divididas em cinco turmas. Apesar do circo ter uma coisa lúdica, envolve muita disciplina e tem como propósito dar ao indivíduo ferramentas necessárias para que ele possa se desenvolver e melhor usar nos seus meios sociais. Eles acreditam que o projeto tem que ser e existir sem a menor discriminação social, então dentro do projeto existe pessoas de baixa renda e classe média/alta, pessoas com diferentes religiões, entendimento, etc.
"Isso é muito legal, porque um poder que o circo agrega muito é que você está lá dentro e não importa quem você é na sociedade. Tem que ser um trabalho de união e pro atividade", explicou Pap.
Lucas Ayres, um dos professores do CircoLo Social, conta como é a experiência em fazer do projeto. Ele diz que infelizmente na cidade de Búzios muitos só procuram pelo circo porque falta outras iniciativas culturais que sejam oferecidas a população local, como por exemplo teatro e dança. Então a equipe usa o máximo das artes para atrair o máximo de pessoas.
"Dessa forma a gente usa o circo como ferramenta de modificação social, e com todas as modalidades circenses tentamos construir um ser humano melhor. Afinal de contas, tudo o que fazemos é para alguém, o nosso 'respeitável público'", frisou o professor.
E por que o circo é a ferramenta para transformação social? Por causa da ação do impossível, justificam os participantes em tom de brincadeira. Para quem assiste de fora é impossível que alguém ande sobre pernas de pau, ou que faça um trapézio, tudo o que acontece no espetáculo circense é impossível aos olhos do público. Então o projeto trabalha dentro dessa ideia fazendo com que o indivíduo chegue até o impossível e ao alcança-lo é feito um paralelo com a realidade do aluno. Na vida muita coisa que se almeja, como uma faculdade, um concurso, uma mudança de vida parece impossível, mas com esforço, dedicação, disciplina e engajamento tudo isso se torna possível de realizar.