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12/07/2020 às 21h29min - Atualizada em 12/07/2020 às 19h51min

Opinião: Atos de preconceito nos estádios começam a ser combatidos

Inclusão de grupos minoritários nos campos de futebol é discutida pelos clubes e pelas torcidas

Mariana Matias - Editado por Paulo Octávio
Festa da torcida não precisa de preconceito. Foto:Ricardo Nogueira/ Folhapress
Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituo Ipsos, o Brasil foi considerada a sétima nação mais intolerante do mundo em um ranking com 27 países. Essa realidade é refletida no cotidiano e no esporte. Nos estádios de futebol é fácil presenciar gestos e expressões de cunho preconceituosos, pois é um ambiente que naturaliza e afirma tais práticas como forma de construção da masculinidade. Apesar disso, as minorias sociais conquistam cada vez mais espaço nesses ambientes e lutam pela mudança dessa realidade, com o apoio de campanhas dos clubes e das torcidas organizadas, que buscam dar visibilidade a essa causa.

O preconceito nos estádios é algo cultural praticado por muitos anos, porém só recentemente passou a ser discutido. Ele é notado de forma recorrente nas letras de cânticos das torcidas e nos xingamentos feitos contra os jogadores dos times adversários, que em sua maioria usam a homossexualidade e à feminilidade como ofensa para desqualificar o outro.

Gritos preconceituosos, assédios e intimidações fazem parte da realidade de uma minoria social que frequenta as arenas de futebol, como gays, mulheres e negros, pois o estádio é visto por muitos como “local de homem” e tais práticas preconceituosas são usadas para afirmar a masculinidade.  “Torcedores dizem que estão brincando e que os gritos homofóbicos duram o tempo do jogo. Mas isso não é tão óbvio assim, porque você aprende no estádio que é legítimo ofender homossexuais, mesmo que os apoiadores dos times digam o contrário”, disse Gustavo Andrada, pesquisador da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

Essas ofensas são muitas vezes naturalizadas e aceitas pela maioria, sendo estimuladas por algumas torcidas organizadas, criando, assim, uma sensação de impunidade nesses locais. Ou seja, é aceitável fazer ofensas, pois fazem parte do entretenimento do jogo. O diretor da torcida botafoguense Fúria JovemFábio de Paulo, afirma “Não usamos para falar de violência. Usamos mais para tirar sarro e zoar. Temos amigos [nas torcidas] do outro lado, a letra é mais zoação.”
 
A democracia não é praticada de fato dentro desses ambientes, pois o esporte perde seu caráter inclusivo para se tornar algo excludente e ofensivo. Por muito tempo essas atitudes foram pouco discutidas por quem frequentava esses ambientes, mas atualmente torcidas organizadas de minorias fizeram mobilizações iniciadas em redes sociais e nas arquibancadas, que trouxe visibilidade à causa. Essa luta deixou de ser exclusivamente de grupos ativistas e passou a se estender aos campos, incluindo clubes, torcidas e organização de eventos.
 
Essas mudanças ganharam visibilidade e tiveram retornos legais, reconhecidos pela FIFA e pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Mesmo que esse preconceito ainda esteja longe de ser superado, ele já vem sendo combatido por grupos de torcedores conscientes sobre a democratização nos estádios e por clubes que visam transmitir uma imagem mais humanizada e ligada a lutas sociais.


 


 Ação da torcida do Bahia contra homofobia. Foto: Raphael Muller/ Folhapress

 O STJD determinou que gritos homofóbicos durante a partida, como “bicha” no tiro de meta do goleiro, serão passíveis de punição e o clube da determinada torcida que proferir será punida com até três pontos na tabela. Isso foi visto na prática ano passado quando o juiz Anderson Daronco parou a partida Vasco x Santos, pois a torcida vascaína estava proferindo cânticos homofóbicos. Isso mostra a seriedade que os profissionais da área estão dando a esse combate ao preconceito.

Após o STF penalizar com a retirada de pontos cânticos homofóbicos proferidos pela torcida, os clubes que disputavam o campeonato brasileiro aderiram a uma campanha contra a homofobia, publicando em suas páginas do Instagram uma imagem que dizia: “pior que prejudicar o seu time é cometer um crime. Grito homofóbico não é piada, muito menos cântico de torcida. Grito homofóbico é crime, dentro e fora de estádios. Diga não à homofobia!” fazendo justamente uma alusão a penalidade sofrida pelos times ao crime grave que é a homofobia.

Apesar das mobilizações para tornar mais democrático esse ambiente, ainda é necessário a conscientização de boa parte dos torcedores acerca dessas práticas. Iniciativas podem começar pelos clubes, que exercem um forte poder de influência na arquibancada, e com medidas legais que estimulem a diversidade nos estádios.

 

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