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19/07/2020 às 21h15min - Atualizada em 19/07/2020 às 21h00min

Beleza que adoece

Núbia Umbelino - Editado por Alinne Morais
Shutterstock

O padrão de beleza imposto pela sociedade gera transtornos em homens em mulheres que buscam a perfeição

A pressão estética é uma pressão social difundida majoritariamente pela mídia, que leva as pessoas a se sentirem insatisfeitas com seus corpos, sempre procurando se encaixar em um padrão criado a partir de um parâmetro irreal. Mulheres e homens cogitam fazer cirurgias plásticas para atender as exigências impostas nas mídias sociais.

Maria Barbosa, estudante, 17 anos de idade, biotipo ectomorfo (corpo magro), olhos castanhos claros e cabelos pretos, admite que sofre muita pressão estética, principalmente por parte de si mesma. Não se sente feliz com sua aparência  e considera colocar silicone e fazer rinoplastia. Seu exterior nunca lhe rendeu problemas de relacionamento ou algum constrangimento. Assim como Maria, muitas pessoas pensam em mudar sua fisionomia porque não se acham bonitas como são.

“Sempre estou me cobrando em tentar ter um corpo bonito igual ao dessas modelos, ter um perfil elegante. Eu não gosto do meu rosto e quando eu fui à uma agência de modelos, tinha muitas mulheres de olhos claros, nariz fino, boca bonita, rosto fino e eu não tenho nada disso, então passei a me cobrar muito mais, a ligar em vários cirurgiões plásticos", diz ela.

A empresária Sileni Clarinda, 41 anos, passou por várias cirurgias plásticas e esclarece que a beleza “padrão” da mídia não é seu tipo de beldade preferido. ”A própria sociedade quer impor um padrão de perfeição em que não me encaixo, mas fiz várias cirurgias plásticas, algumas para me sentir dentro desse padrão tão cobrado. Resultado: entrei em depressão, pois começaram a me ver apenas como um belo corpo, o caráter, educação e inteligência ficaram de lado", diz ela e acrescenta que antes de passar por cirurgias plásticas como ela fez, deveria ser obrigatório uma avaliação psicológica.

PROFISSIONAIS DA SAÚDE


Alguns profissionais de saúde, como os médicos, dividem mente e corpo. Marisa Azevedo é psicóloga e tem uma visão humanista, de que existe um organismo inteiro, o que pensamos e interpretamos da vida está no cérebro e no corpo, pois um precisa do outro para funcionar. Cita o exemplo de quando estamos ansiosos, todo nosso estado fisiológico muda, temos suor excessivo, pupila dilatada, aceleração dos batimentos cardíacos. “Quando a pessoa estima a si mesma é consequência ela cuidar do próprio corpo. Falar de saúde mental também e falar das qualidades de relações; com quem nos relacionamos e como, tanto na família, trabalho e namoro", afirma.

Para ter equilíbrio, a psicóloga explica que é preciso cuidar das relações, estar próximo de pessoas que nos incentivem a nos cuidar, amar e a respeitar. Estando perto de pessoas que respeitem nosso limite, estamos nos respeitando e isso faz com que busquemos mais amor próprio", explica.

Azevedo explica que a busca por um padrão de beleza ideal ocorre independente do gênero. A maioria dos homens chega à terapia por problemas sexuais e ao aprofundar mais em alguns casos, chega também a questão da pressão estética. Entretanto, a maneira que afeta os homens não é a mesma que afeta as mulheres. O objetivo de algumas mulheres está em alcançar os padrões estéticos, o dos homens está mais em alcançar um bom desempenho sexual.

Arthur Luiz, 19 anos, estudante de jornalismo, diz se sentir pressionado pela imposição dos padrões de beleza, porque a mídia divulga um modelo estético que requer muita disciplina em questão de atividades físicas e dermatologistas. "Para nosso bem estar é preciso ser ciente que o nosso corpo não é igual dos artistas e cantores que vemos nas redes sociais, eles vivem de aparência porque precisam estar nas capas de revistas e nós, não", diz o estudante.

Rosane Berwanger, 47 anos, é proprietária de um salão, e diz que tem uma imagem que todas buscam. “Querem sempre um cabelo liso, um nariz fino, uma pele clara. A cobrança pela imagem perfeita cria uma doença social. Todas nós temos que ser magras, e ter um corpo perfeito perante esse padrão”.

CONSEQUÊNCIAS

As consequências da pressão estética englobam rebaixamento do humor, ansiedade, comportamento de fuga e esquiva. A maioria das situações passam a ser vistas como se oferecessem risco ao indivíduo.

Marisa Azevedo diz que apesar de o aspecto físico interferir no aspeto emocional e vice-versa, existem casos de clientes que são 100% saudáveis organicamente e terem problemas no âmbito emocional. “A pressão estética pode afetar profundamente não só a forma que uma pessoa se vê, mas a maneira que ela vive em sociedade. A questão é a que interfere em quão aceita uma pessoa se sentirá em um determinado grupo e como somos seres sociais”, explica. Ela afirma que não nascemos pra viver isolados e diz que quando nos sentimos rejeitados, acabamos evitando certos contextos sociais e com isso perdemos grandes oportunidades de acesso a recursos essenciais para o nosso bem-estar, como comida, afeto, sexo, e pertencimento.

A nutricionista Gabriela Santos fala que a busca do bem-estar e da saúde mental sem descuidar da saúde do corpo é visar à saúde como um gosto total, mental, emocional e social, e uma que vez a busca por um padrão de beleza ideal ocorre de maneira invasiva, não visando um agrado mental e social e pode afetar uma pessoa fisicamente e psicologicamente.

Júlia Novaes é designer de moda, diz perceber a pressão estética imposta pela mídia em toda a sociedade e afirma que ela começa na moda. “A mídia se encarrega da propagação desse padrão”, opina.

“A moda é uma área de criação e comunicação em que o foco principal é a estética, seja ela harmônica ou não, bonita, estranha... e de muitos anos para cá ela vem sendo a referência de corpos, imagens, beleza, e dessa forma cria padrões. O erro é que muitas pessoas (incluindo designers e a mídia) levam esses padrões como verdades absolutas, quando deveríamos levar como diversidade imagética. A moda em si consegue apresentar desfiles, roupas, e hoje em dia até corpos e modelos diversos, mas a comercialização da moda massificada e tendenciosa aplica uma ‘verdade absoluta’ na sociedade.”   

Novaes lembra que os padrões de beleza dos anos 1920 não são os mesmos dos anos 1990 e não são os mesmos que temos hoje em dia, grande parte disso vem dos desfiles de moda, que apresentam novidades, tendências e veem se aquilo tem propagação ou não, por exemplo, a calça baixa, que era a peça mais usada nos anos 2000, que alterou corpos de muitas pessoas biologicamente, e depois foram esquecidas.

“Conceitualmente, em desfiles, a seleção de modelos pode variar de acordo com sua coleção, mas o corpo magro ainda é uma exigência de 99% dos elencos de modelos”, diz a designer, que afirma que hoje em dia conseguimos ver desfiles em que a diversidade já é muito presente, porém ainda existe muito preconceito envolvendo padrão de beleza. “Esse preconceito vai além da passarela, para a sociedade no geral, a padronização chega em numerações pequenas nas lojas de departamento, em gordofobia, e isso propaga a ‘verdade absoluta’ que na verdade não deveria existir pois cada pessoa é uma pessoa diferente”, afirma Novaes.

 
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