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23/07/2020 às 03h17min - Atualizada em 23/07/2020 às 02h58min

PL das fake news: mais de 50 entidades ligadas à comunicação pedem o adiamento da votação

Depois de várias versões o projeto de lei nº 2630 de 2020 foi aprovado com 44 votos favoráveis dos senadores contra 32 votos

Vitoria Pereira - Revisado por Barbara Honorato
smartboy10/GettyImages

No dia 30 de junho de 2020 foi aprovado pelo Senado o texto base do "PL das fake news", projeto de lei 2630/20 que propõe mudanças no combate às informações falsas no ambiente virtual. O projeto é de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e foi relatado por Ângelo Coronel (PSD-BA), agora segue para a Câmara dos deputados e se for aprovada irá para a sanção presidencial. 

Desde sua aprovação no Senado, o projeto teve uma repercussão negativa na comunidade acadêmica na área do direito e diversas entidades independentes jornalísticas apontam divergências e falta de base estruturada para a criação da lei, além de que as mudanças propostas no texto podem interferir na privacidade e direito dos usuários.

O PL quer mais transparência dos conteúdos nas redes sociais e de serviços de mensagem privadas na Internet, com o intuito de combater a desinformação e excluir contas inautênticas que disseminam informação falsa.

 

Repercussão no congresso nacional

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, é um dos políticos favoráveis à implementação do projeto, e comemorou no Twitter quando o texto base foi aprovado:

“A nova Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet é imprescindível para a proteção da vida de todos os brasileiros. Precisamos entender esse universo e reconhecer que liberdade de expressão não pode ser confundida com agressão, violência ou ameaça”, disse Alcolumbre.

O senador e relator do PL, Angelo Coronel (PSD-BA), também expressou sua opinião no twitter: “O que mais importa nesse momento é proteger os brasileiros dos prejuízos causados por tantas ações nocivas no meio digital. Ñ existe censura ou invasão de privacidade.”

Entretanto, houve opiniões divergentes no congresso, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) escreveu em sua rede social um comentário contrário ao PL.

“Votei contra o projeto, considerando que ele pode representar um risco à liberdade de expressão.”, escreveu Lasier.

Já, o senador Marcio Bittar (MDB-AC) alegou estar contra a aprovação, pois acredita que o texto-base possui uma ligação ideológica de esquerda:

“O projeto das fake news é reedição do desejo dos petistas em exercer censura e cerceamento das opiniões livres. Chamam, eufemisticamente, de controle social da mídia. Todos os países socialistas aplicaram censura, controle das opiniões e outros ataques à liberdade”.
 

Adiamento da votação

Mais de 50 entidades nacionais e internacionais, como Abraji, Agência Lupa, Instagram, Human Rights Watch, assinaram um manifesto coletivo pedindo o adiamento da votação, “a fim de que seja amplamente debatido, e que um novo relatório, mais consensual e equilibrado, seja proposto”, diz a carta.

A nota ainda alerta para os riscos de ameaça à liberdade de expressão e privacidade se o PL 2630/2020 for aprovado, além de ressaltar a importância de ter uma discussão mais ampla e estruturada sobre o assunto central: o combate às fake news.

“Sem tempo hábil para debate e amadurecimento, o texto pode resultar numa lei que instaure um novo marco regulatório de Internet baseado na identificação massiva e na vigilância e inviabilize o uso das redes sociais e de aplicativos de comunicação.”, diz a nota.
 

Opinião do presidente da República 

No último sábado (20), o presidente afirmou em uma live que a proposta de lei poderia limitar a liberdade expressão:

“Vocês sabem que a liberdade de expressão é essencial se você quer falar em democracia. O Congresso está discutindo aqui, já passou no Senado, está na Câmara, seria a lei das fake news. Acho que é mais uma maneira de botar limites na liberdade de expressão”.

Quando o projeto foi aprovado pelo Senado, o presidente já alertou que se a câmara dos deputados também validar, cabe a ele vetar.

“Acho que na Câmara vai ser difícil ser aprovado. Agora, se for, cabe a nós ainda a possibilidade do veto”, disse Bolsonaro na saída de sua residência oficial do Palácio da Alvorada.

 

Pontos problemáticos e positivos

O Diretor da Associação Data Privacy Brasil de pesquisa, Rafael Zanatta, aponta um ponto positivo e importante do projeto:

“É preciso realmente induzir uma ação mais proativa dessas empresas e evitar, inclusive, decisões obscuras ou sem explicação do que está sendo feito. Afinal, são empresas monopolista de certos serviços online, eles têm uma capacidade de poder muito grande de intervenção na sociedade”, afirma Zanatta.

O projeto quer limitar o número de mensagens encaminhadas, só poderia enviar para no máximo 5 usuários ou grupos, sendo que os grupos podem conter até 256 membros.

“O sistema de rastreabilidade prevista especialmente no artigo décimo da legislação, ele cria um aparato de controle de disparos de mensagens em grupos que é algo inédito e que tem um risco muito grande de criar um legado de vigilância que necessário. E que, na verdade, limita de forma desproporcional os nossos direitos fundamentais”, pontua Rafael. 

Para Paulo Rená, Mestre em Direito, Estado e Constituição, esse artigo dez é um dos mais problemáticos, pois impõe uma quebra de sigilo do teor das comunicações.

“Pra você verificar se a mensagem é a mesma, o conteúdo da mensagem precisa ser comparado com o conteúdo de todas as outras mensagens que circulam pela rede, como contador de usuários, tanto de envio quanto de leitura. Isso é problemático porque vai exigir que haja uma quebra do sigilo do teor dessas comunicações, não tem como fazer esse comparativo sem essa quebra porque se for uma coisa mais automatizada por meio de algo que respeite a criptografia, qualquer mínimo alteração na mensagem vai fazer com que não se enquadre como a mesma mensagem”, explica Rená.

 

E como fica a liberdade de expressão?

O texto aprovado pelo Senado estabelece a possibilidade de retirar um conteúdo que tenha informações falsas sem justificar a exclusão.

“Isso pode ser muito problemático e pode gerar a questão da auto censura, as pessoas propriamente deixando de publicar alguma coisa com receio de que ela vai ser removida e, claro, estabelecer uma possibilidade da plataforma instituir uma ideia de censura privada, a fim de evitar que ela seja responsabilizada pelos conteúdos dos seus usuários”, explica Paulo.

Vale ressaltar que liberdade de expressão não pode ser confundida com licença para difamar, caluniar e propagar discurso de ódio. Inclusive, o termo está previsto como um direito do cidadão na lei No 5.250 de 1967:

“É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos têrmos da lei, pelos abusos que cometer.”

 

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