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27/11/2020 às 08h32min - Atualizada em 27/11/2020 às 07h17min

Como a teoria da espiral do silêncio pode explicar a cultura do cancelamento

Você já cancelou alguém ou já foi cancelado? Entenda este movimento baseado na teoria da socióloga Elisabeth Noelle-Neumann

Fernanda Lima Freitas - labdicasjornalismo.com
Ilustração: Emma Darvick
A teoria da espiral do silêncio foi elaborada pela socióloga e cientista política alemã Elisabeth Noelle-Neumann na década de 70 com base nas pesquisas sobre efeitos dos meios de comunicação de massa. Através dessa teoria, entende-se que o indivíduo que está inserido na sociedade moderna não suporta e/ou tem pavor de sofrer um afastamento social a partir das divergências de uma opinião dominante. Assim, o indivíduo esconde suas opiniões e embarca no que a massa acredita. É visto que, a espiral do silêncio se faz presente na “cultura do cancelamento”, que surgiu com a ascensão das redes sociais na vida das pessoas.

A cultura do cancelamento apareceu como uma forma de expor atitudes consideradas imorais, ultrapassadas e preconceituosas, além de punir tais atitudes com o “cancelamento”. A partir do momento que a ação de um indivíduo, (que pode ser considerada ofensiva) vai para o mundo das redes, acontece um tribunal on-line para definir quem é mocinho e quem é vilão. As sentenças são definidas no espaço de tempo de um clique e as consequências vão muito além da vida superficial das redes sociais.

Embora a teoria tenha sido formada na década de 70, através de análises de pesquisas de intensão de voto na Alemanha, é possível relacioná-la com o que presenciamos atualmente no cenário de redes como o Twitter e Instagram. Com muitos influenciadores famosos detentores de milhares de seguidores, suas opiniões exercem papel dominante. E para os indivíduos que divergem dessas opiniões e assumem expô-las, sobra o chamado “cancelamento”, ou o isolamento e a rejeição como é explicado pela teoria da espiral do silêncio.

O “cancelador” pode ter dois tipos de objetivos ao “cancelar” algo, o primeiro, seria o de ajudar na eliminação dos preconceitos estruturais que persistem na sociedade, e o outro pode ser o de ganhar engajamento, mais seguidores por postar o que a massa quer ou está consumindo no momento. Aponta-se então, a conveniência em se falar de determinados assuntos para fim exclusivo da popularidade.

Contudo, como exposto anteriormente, quando alguém é “cancelado”, as consequências não se limitam na perda de seguidores e da queda de reputação, pelo contrário, o dito como “cancelado” pode vir a perder o emprego, patrocínio (se tiver), e em casos mais preocupantes, pode ser ameaçado de morte por outros internautas. Encontra-se neste ponto, a problemática do “ser invisível” na internet, da capacidade de pessoas se esconderem atrás de meros ícones e cometerem crimes sem nunca serem responsabilizados.

“ Na teoria da espiral do silêncio, o medo de se ter uma opinião divergente da maioria pode levar as pessoas ao silenciar sobre assuntos que estão na opinião pública. A cultura do cancelamento, seja lá o que for isso, me parece mais um boicote autoritário sobre aqueles que não falam o que eu gosto de ouvir. Podemos dizer que, num certo sentido, o que era uma decisão consciente virou um ato ditatorial covarde para estimular quem expressa sua opinião a ficar calado. Numa análise bem ampla, podemos dizer que a cultura do cancelamento seria uma nova face da espiral do silêncio”, comenta André Rittes, jornalista e professor universitário da disciplina Teorias do Jornalismo na Universidade Santa Cecília.

O cancelamento virtual pode ser considerado como um novo aspecto da espiral, sendo ele direcionado em sua maioria a pessoas famosas, mas pode ocorrer com desconhecidos também. A espiral do silêncio dos conhecidos “millenials”, tem o poder de vasculhar o passado das pessoas e suas opiniões de anos anteriores, que podem ter mudado, e muitos desses cancelamentos acontecem a partir desse resgate.

O acesso as redes sociais beira o inevitável, de crianças até idosos, formam-se essas massas, normalmente raivosas, que determinam e amplificam opiniões que soam como as deles, e que consequentemente, calam as de quem soa diferente. Assim, é possível definir que a espiral do silêncio, somada a agulha hipodérmica ou teoria da bala mágica, ocupam posição dominante os discursos na internet, e estão intrínsecas na forma violenta em que muitos usuários se comportam neste mundo virtual.
 
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