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15/01/2021 às 11h35min - Atualizada em 15/01/2021 às 10h18min

A mão que afaga é a mesma que apedreja

A obra de Tami Nogueira “O desconforto que você se tornou para mim”, retrata com destreza os efeitos emocionais causados pelo relacionamento abusivo

Sheyla Ferraz - Editado por Gustavo Henrique Araújo
Foto/Reprodução: capa do livro em e-book
Era uma vez uma história de amor, que acabou em história de terror. Vítimas de relacionamento abusivo sofrem no doloroso caminho do cárcere afetivo que envolve dependência emocional e autodesprezo. Inicialmente a relação parece confiável, até que os sinais comecem a aparecer sutilmente, e o romance segue cheio de altos e baixos severos, ocasionando lesões psicológicas, emocionais e, até mesmo, físicas.

A escritora e historiadora carioca Tami Nogueira publicou o seu primeiro livro em 7 de outubro de 2020. A autora imprime a sua identidade na obra sem se revelar, contando por meio da narrativa ficcional o trauma vivido por ela durante cinco anos de relacionamento.

Ela conta também uma das razões que a levaram a escolher esse tipo de narrativa: “A autoficção me dá um amparo, um resguardo para manter a identidade das pessoas resguardadas. Me sinto mais confortável para usar os pseudônimos”.  A maneira como a história é descrita aproxima o leitor, fazendo com que ele também se identifique. Além disso, expor os danos sofridos é uma válvula de escape.

O sentimento protagoniza o fato da pessoa não conseguir enxergar ou ignorar as ações de abuso dentro da relação. Tami Nogueira confessa ter sido difícil aceitar que estava sendo emocionalmente abusada. “Eu não queria me identificar como uma vítima de relacionamento abusivo, mas eu precisava cair fora dele e foi o que eu fiz”, contou.

Tami aponta também a importância de analisar o relacionamento abusivo fazendo uma análise de questões sociais que envolvem ambas as partes. Com um olhar mais crítico, ela diz ter sido impulsionada a escrever a obra justamente por ver o relacionamento abusivo considerando não só o lado da vítima, mas também procurando entender as razões e as raízes geradoras desse tipo de relação: “Pensar nesse abuso muito mais do que uma relação de vítima e algoz”, diz a escritora.
 
Para ela, descobrir como as relações abusivas se constroem faz parte do processo de superação da vítima, sem um olhar superficial a respeito do trauma, e sim com uma visão macro, levando em conta aspectos sociais mais o confronto pessoal a partir de um acompanhamento terapêutico como um esteio para a compreensão dos motivos que levaram tanto a vítima quanto o abusador a assumirem tal postura na relação. “Para você se recompor de um relacionamento abusivo você precisa se colocar de alguma forma como parte do problema”, reitera Tami Nogueira.

                                                                 
Esse tipo de vivência muda para sempre o curso da história de uma pessoa. “Você vai sair marcado, você vai sair com uma cicatriz; a questão é como você vai tratar essa cicatriz”, declarou a escritora.

Para Marilene Almeida, superar a relação abusiva de quatro anos foi uma tarefa árdua. Ela relata momentos de pânico vivido em sua primeira experiência de relacionamento, quando tinha apenas 16 anos.  Inicialmente eles mantinham um bom convívio, até que, segundo Marilene, o namorado começou com as proibições, as ofensas e as atitudes constantes de manipulação, como exigir o afastamento dos seus amigos do sexo masculino e também o afastamento da sua própria família.

“Quando ele descobriu que entre "terminar e voltar" fiquei com outras pessoas, foi o fim para o início do inferno, ele me bateu; estourou a minha cara, e disse que a culpa era minha...”, afirma a jovem agredida.

As ameaças foram diversas contra a vida de Marilene e de sua família. Com o passar do tempo, os sentimentos de ódio e possessão se tornaram cada vez mais frequentes no trato do namorado com a jovem, e tudo o que ela buscava era sua paz de volta. 

Quando conseguiu terminar o relacionamento, Marilene conta que passou por tratamento psicológico ao fazer uso de remédios antidepressivos, salvo as lições extraídas do seu sofrimento. Ao final, ela faz uma declaração importante: “Quando você se amar o suficiente, estará preparado para amar outra pessoa."

A psicóloga Fabiane Nascimento falou um pouco sobre alguns dos sinais que ajudam a identificar esse tipo de relação tóxica: “Ciúmes excessivos, manipulação e chantagem emocional, tentativa de controle em várias áreas da vida do(a) companheiro(a), tentativa de isolamento do(a) companheiro(a), vitimização do agressor para gerar culpa no outro, entre outros.”

A especialista também afirma que a auto-estima, o uso excessivo de substâncias químicas, o medo descontrolado e o estresse pós-traumático são desencadeadores de quem passar por essa experiência, e que o autocuidado e a informação são ótimos aliados para quem busca não cair na teia do relacionamento abusivo. 

Inúmeros relatos ilustram bem o comportamento de um abusador, como a vítima se sente e o tempo que leva para "cair a ficha" e partir para outra direção contrária àquela em que foi idealizada ao lado de quem acreditou ser o amor de sua vida, ou com quem manteve vínculos profundos de confiança.

Todavia, recomeçar não é utopia.  A escritora e historiadora Tami Nogueira acrescentou: “Qualquer processo de desconstrução é doloroso... vai ser chato, vai ser incomodo, mas é algo necessário. É algo que as pessoas precisam encarar pra elas serem o que elas quiserem ser de melhor."
                                                            
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