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16/03/2021 às 19h17min - Atualizada em 16/03/2021 às 18h40min

Por que psicopatas dão audiência?

Mortes e desaparecimentos misteriosos são temas recorrentes do gênero que vem ganhando espaço: o True Crime.

Anna Francischini - Revisado por Isabela dos Santos
Cena do filme Precisamos Falar Sobre o Kevin. (Foto: Reprodução)

O que para muitas pessoas podem ser temas que fazem o "estômago revirar", para outras é algo quase prazeroso de se consumir. Mas afinal, por que serial killers, psicopatas e conteúdo true crime dão audiência?

Antes de responder a essa pergunta, é importante termos alguns conceitos claros em mente.

True Crime



O True Crime é um gênero cultural que aborda investigações sobre crimes reais. O termo significa “Crime real” em tradução livre do inglês e os conteúdos (que podem ser filmes, séries, podcasts, livros, entre outros) precedem normalmentede avisos indicando cenas fortes e de extrema violência. Diferente de conteúdos baseados em fatos, o true crime tem como foco expor um histórico real e os detalhes de como os crimes relatados aconteceram, detalhando as investigações, apresentando teorias sobre os fatos, falhas policiais e em alguns casos exclusivamente essas produções narram as vidas de psicopatas e serial killers.

Psicopatia ou Sociopatia?

De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), não há uma real diferença entre o psicopata e o sociopata, pois ambos se tratam do mesmo termo para definir um transtorno de personalidade. O termo mais assertivo para definir esse transtorno seria personalidade dissocial ou antissocial. 

Segundo uma lista elaborada por Kevin Dutton, psicólogo britânico- especialista no transtorno de personalidade dissocial ou antissocial-  as profissões preferidas de pessoas com algum grau de psicopatia são: CEO (no caso, cargo), advogado, profissionais de TV e rádio, jornalista, cirurgião, vendedor, policial, alguma carreira na área religiosa, chefe de cozinha e funcionários públicos. Resumindo: eles estão entre nós.

Serial Killer

O termo serial killer, ou assassino em série, é relativamente novo: foi usado pela primeira vez em 1970 pelo FBI. Seu autor foi Robert Ressler, agente recrutado no mesmo ano para trabalhar na unidade de ciências comportamentais, traçando perfis de criminosos violentos como assassinos e estupradores. Segundo Robert, Serial Killers são indivíduos que praticam uma série de homicídios durante determinado período de tempo. Nem todo psicopata é um serial killer.

Crime recorde de audiência

Contudo, não podemos assumir que o interesse por conteúdos criminais se deu apenas a partir da popularidade de alguns casos na netflix, por exemplo. No dia 25 de fevereiro de 2015 foi exibido na Rede Record uma entrevista exclusiva com Suzane Von Richthofen, dentro da penitenciária do Tremembé, onde a mesma se encontra reclusa desde 2002 pelo assassinato dos pais no mesmo ano. Durante a entrevista, que foi divida em dois blocos, a emissora bateu recorde de audiência (segundo o IBOPE), superando a Rede Globo, que até então era a primeira colocada, exibindo a partida da segunda rodada da Taça Libertadores entre São Paulo e Danúbio.  

O mesmo aconteceu com o programa Fantástico da Rede Globo ao apresentar suas duas maiores audiências do programa no ano de 2008. Na ocasião, foram exibidas entrevistas sobre o caso Nardoni. Uma com o pai e a madrasta (autores do crime) e outra com a mãe da vítima.

Nos últimos meses, casos antigos como o da Elisa Lam, Hotel Cecil (2013), o assassinato da família Dupont de Ligonnes (2011), o desaparecimento da jovem inglesa Madeline McCan (2007), a vida de serial killers midiaticos como Ted Bunddy (aproximadamente 1979), Eddy Kemper, BTK, Andrew Cunnan, entre outros, resgatam histórias e ganham destaque de audiência com as novas produções de stremings. Os conteúdos chegam a ficar no top 10 de séries e documentários mais assistados na Netlfix Brasil, por exemplo. Esses casos já eram conhecidos entre os fãs de true crime através de outras plataformas como vídeos no Youtube, podcasts e livros do gênero.

O que pensa o expectador?

Olhando especificamente pelo ângulo do consumidor de conteúdo, a entrevistada Ornella Boulhosa - estudante de engenharia química - conta que o gosto pelo True Crime veio desde cedo. “Começei assistindo programas criminais no canal Discovery Chanel e quando percebi, só queria consumir aquilo”. O que mais a atrai nestes casos é o comportamento humano, além de se questionar sobre o que faria se estivesse no lugar da vítima, e apesar de trazer um certo sentimento de tristeza e sofrimento, ela continua vendo “talvez por curiosidade, ou para "saber da maldade humana”.

O que pensa a especialista?

De acordo com a psicóloga especialista em psicologia Forense, Elisa Walleska, em entrevista ao jornal Correio 24horas, consumir conteúdos sobre crime é algo natural. "Quando a gente se interessa por histórias de violência fictícia, ou mesmo real, mas sem tomar parte, só assistindo, é uma forma do nosso psiquismo se realizar e de certa forma transmutar aquela violência que todos temos dentro de nós. Da mesma forma que quando a gente vê programa de viagem se sente relaxado de ver as paisagens, ou o filme de romance nos traz aquele bem estar. O filme de violência permite que a gente exerça essa violência interna com segurança".

Porém, Elisa ainda aponta que o limite é tênue. "A gente começa a banalizar a violência, começa a se divertir com situações que são terríveis. Isso pode nos insensibilizar ao sofrimento do outro. Eu vejo que hoje em dia muita gente assiste a esses programas tipo Brasil Urgente almoçando tranquilamente. As pessoas já não se chocam mais com certos crimes. Vai olhar a quantidade de filmes e séries em Netflix, sem sombra de dúvidas, metade é comédia e metade é violência. Isso faz com que a violência pareça algo mais aceitável".

Como fica o emocional?

Em entrevista, o youtuber Felipe Medeiros Guedes do canal de True Crime Xamauzin, nos conta um pouco sobre a questão emocional da produção de conteúdos criminais. Ele afirma que desde muito novo já assistia filmes de terror e que sempre gostou, porém como morava no Rio de Janeiro, na época estava acostumado a ver mortes de formas terríveis. 

Ele relata que uma vez voltando do catecismo quase tropeçou em uma pessoa falecida, então esse tema, “morte” gerou uma certa apatia nele. O youtuber ainda reforça que, apesar de tudo, não era falta de angústia nem compaixão. Quando começou a pesquisar sobre os casos criminais, ao invés de criar um bloqueio emocional, quando ele lê sobre o crime e os relatos dos familiares, passou a criar uma empatia maior. Porém, Felipe destaca que “quando começa a trabalhar nesse ramo, o que a gente tem que fazer é não se envolver emocionalmente. Tentar manter a imparcialidade e não deixa transparecer a indignação, porém nem sempre é possível mostrar que está irritado”.


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