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25/03/2021 às 11h58min - Atualizada em 25/03/2021 às 11h20min

Educação Ambiental olhando além das frases clichês

Maria Mendes - Editado por Maria Paula Ramos
Fonte: Marcin Jozwiak / Reprodução: Unsplash

Uma floresta está em chamas, todos os animais fogem em desespero, mas o pequeno beija-flor voava até o riacho e voltava com gotas de água em seu bico para combater o incêndio. Quando questionado pelos animais grandes da floresta sobre o que estava fazendo, ele respondia que o importante era fazer a sua parte. Esta fábula contada em tantas versões é constantemente repetida, e também lembrada, quando falamos de educação ambiental. Mas será essa a melhor perspectiva para abordar o tema na sala de aula?

Conhecer a educação ambiental na prática é fundamental para essa discussão. Nada melhor, então, que ouvir o que professores têm a dizer sobre o assunto. As vivências e conhecimentos compartilhados na matéria são dos professores Felipe de Souza e Fernanda Magalhães

Felipe é professor de Geografia da Rede Pública na Educação Básica, além de ter especialização em Ensino de Geografia, em Educação Ambiental e atualmente está cursando doutorado. Fernanda tem Mestrado Científico (MSc) em Engenharia Ambiental pela UERJ e é Professora de Ciências e Biologia da Rede Estadual do Rio de Janeiro há 16 anos.
 

A discussão de educação e meio ambiente é nova

Para Felipe, é muito importante pontuar o quanto a temática da educação ambiental e meio ambiente é recente. Na década de 1990, a partir de 1992 com a Rio-92, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad), o tema avançou muito para o ensino. “Nas décadas de 1970 e 1980 o meio ambiente ainda não era um tema de grande importância, pelo menos na Geografia. Então, é um tema de certa forma recente, tem 30 anos, um pouco menos do que isso”, disse o professor.

“A promoção da Educação Ambiental em todos os níveis de ensino iniciou-se com a Constituição Federal em 1988 e a Inclusão do tema Meio Ambiente nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ministério da Educação, em 1997, sendo consolidada em 1999, através da Lei 9.795, que cria a Política Nacional de Educação Ambiental, PNEA, no qual foi regulamentada em 2002”, explicou a professora de Biologia.

 

Uma temática interdisciplinar

Os estudos relacionados ao meio ambiente não pertencem apenas a uma área específica, é um tema que tem desdobramentos em diversos campos do conhecimento. Envolve os ecossistemas, a relação das pessoas com a natureza e o espaço, além das consequências. Então, dependendo do enfoque, pode ser objeto de estudo da Biologia, Geografia, Sociologia, da Economia, por exemplo. Com a educação ambiental não poderia ser diferente, ela é interdisciplinar. 

“É um tema transversal que debate e que passa por várias disciplinas e também por ser de uma ciência que tem como essência a discussão da sociedade com o meio ambiente”, disse Felipe.

“Na Escola, eu realizo as ações através de projetos interdisciplinares, que contam com professores de diversas áreas com especificidades diferentes, o que é muito bacana pois ocorre a tal diversidade, enriquecendo as abordagens e vivências”, conta Fernanda.
 

Romantização do Meio Ambiente 

O método tradicional de ensino relacionado a uma perspectiva puramente contemplativa da natureza é para Fernanda um dos principais desafios para a real vivência da educação ambiental dentro das escolas. A professora de Biologia compartilhou trechos de autores do tema que enfatizam que a temática ambiental não é abordada corretamente por boa parte das instituições de ensino, que escolhem tratar o tema sob uma perspectiva de senso comum, superficialismo e sem contextualização.

 

Mas quais seriam essas dificuldades? Fernanda destacou o seguinte trecho:

Justen (2006) explica que a visão mais comum sobre a EA (Educação Ambiental) se baseia no estudo da natureza e práticas que orientem a destinação correta do lixo, o que de fato também é importante, mas não suficiente. Loureiro (2006, p.47) anui com a crítica do autor supracitado dizendo que “[...]coloca-se com frequência no cerne da Educação Ambiental a contemplação do natural e não a interação na natureza” [...], ou seja, não se insere o indivíduo no meio em que vive, não se salienta a atuação de cada um, tanto positiva quanto negativa”.

A mesma percepção é compartilhada por Felipe em relação ao modelo de abordagem do tema. Para ele, estes são os principais desafios da educação ambiental, principalmente para quem trabalha dentro de uma perspectiva crítica.

“Esse discurso que há vazio, superficial sobre o meio ambiente que hora romantiza, com aquela perspectiva de devemos preservar, devemos salvar os animais, devemos salvar as florestas, mas sem desdobramento algum, é um discurso vazio”, disse o professor de Geografia.

 

Para além de problemas estruturais nas escolas

A carência de formação continuada foi mencionada pelos dois docentes como um dos principais problemas quando paramos para analisar e refletir a educação ambiental em escolas. Esta questão reflete na falta de conhecimento dos próprios educadores, levando à repetição do discurso clichê, vazio, superficial e também limitado quando são trabalhados temas relacionados ao meio ambiente.

Felipe reforçou que muitas vezes isso não é responsabilidade apenas do professor e sim do contexto exaustivo de trabalho que muitos professores vivem, além da falta de estímulos e auxílios financeiros para a formação continuada dos professores. O educador ressalta, também, que mesmo com as dificuldades, em seus mais de 12 anos lecionando, o trabalho de muitos professores merece destaque.

“Mesmo diante das dificuldades enfrentadas pelos docentes brasileiros inerentes à profissão e o desânimo dos alunos, estimular a educação ambiental de uma forma engajada na escola é pensar na formação das futuras gerações”, disse Fernanda.








 

Referências utilizadas por Fernanda em suas respostas:

 

BIGOTTO, A. C. Educação ambiental e o desenvolvimento de atividades de ensino na escola pública. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade de São Paulo. São Paulo, 2008. Disponível em: . Acesso em: 23 de março 2021.

 

JUSTEN, L. M. Trajetórias de um grupo interinstitucional em um programa de formação de educadores ambientais no estado do Paraná (1997-2002). Educar em Revista, Curitiba, n. 27, p. 129-145, jan/jun, 2006.

 

MACHADO &TERÁN, EDUCAÇÃO AMBIENTAL: DESAFIOS E POSSIBILIDADES NO ENSINO FUNDAMENTAL I NAS ESCOLAS PÚBLICAS.

Disponível em: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=3522. Acesso em: 24 de março de 2021.


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