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12/07/2021 às 07h11min - Atualizada em 12/07/2021 às 07h48min

O Mundo dos Pequeninos - Uma Desvalorizada obra-prima

A verdadeira escala de nossa existência

Raphael Klopper - Editado por Fernanda Simplicio
Já imaginou se as “Viagens de Gulliver” se misturasse com “Querida, Encolhi as Crianças” em formato de animação?!
Bem, não tem muito a ver com O Mundo dos Pequeninos, só se estivermos falando de uma história de um universo gigantesco e épico enfiado dentro de um cenário íntimo e pequeno, semelhante a essas histórias e à disparidade de tamanhos de ambos os mundos fundidos em um criando toda a fantasia que se apresenta dentro da história. Ou, como no caso da maioria dos filmes de Ghibli, o desafio e o objetivo é como imergir essa fantasia e história em nossos temas e dramas do mundo real a serem explorados.
 
Nesse sentido, O Mundo dos Pequeninos pode quase ser visto como se fosse Meu Amigo Totoro misturado com A Vida de Inseto até certo ponto, porque, assim como em todos os casos dentro do ramo de adaptações de obras da Ghibli adaptando títulos da literatura ocidental, como é aqui o caso com Os Pequeninos Borrowers, de Mary Norton, sendo traduzido para a língua japonesa e sua própria mitologia, ao mesmo tempo em que se busca se adaptar à visão humanística de todos os filmes de Ghibli. É sempre um prato cheio de potencial e, falando apenas em uma escala imaginativa, este é um dos momentos mais altos do estúdio, embora não seja realmente um dos melhores em comparação com muitos outros.
   
Não é um filme com grandes tropeços ou quaisquer falhas fracas e aparentes, o problema parece estar no que não tem, que é parecer faltar mais duas horas de história aqui, porque o filme inteiro parece ser uma construção lenta, calma, auto-meditativo de um primeiro ato de uma história que ainda está para começar.
Se estendendo por muito tempo explorando e aparentemente introduzindo o pequeno mundo dos "borrowers" (traduzido livremente como os “emprestadores”), enquanto segue a protagonista de Arrietty e sua vida diária familiar tentando sobreviver enquanto procuram e pegam emprestadas bugigangas, restos e objetos esquecidos da casa humana onde eles vivem já que são seres pequeninos do tamanho de uma formiga vivendo em seu próprio pequeno universo dentro do nosso.
 
E mais tarde tentar explorar uma espécie de relacionamento amoroso e de amizade que ela estabelece com o menino humano Shô, enquanto explora sua própria pequena crise existencial por ter um problema cardíaco que o coloca perto do risco de morte na futura cirurgia que ele passará.
Ao mesmo tempo que temos uma subtrama da empregada doméstica egoísta que parece ter um pouco de rancor e aversão contra os borrowers ao tentar capturá-los, exterminar sua casa e provar sua existência apenas pela fama que ela conquistará por essa descoberta, e nossos heróis precisam se unir para lutar contra as probabilidades do mal que oprimem a existência dos pequenos seres.
 
Tudo isso é praticamente um terreno bastante perfeito e que cuja narrativa é explorada de forma visual muito criativa na ótima direção Hiromasa Yonebayashi que possui momentos para brilhar ALTO aqui. Mas no exato momento em que a história parecia estar pronta para entrar em um nível totalmente diferente de desenvolvimento e progressão, as coisas caminham rapidamente em direção ao “clímax” e nossos personagens fazem suas despedidas emocionadas e tudo está bem e feliz agora. O que é uma pena porque, embora se entenda que a proposta aqui é exatamente de ser uma história íntima em pequena escala, e que é perfeitamente bem-sucedida nisso, mas enquanto que o filme também parece provocar potenciais que ele nunca alcança ou sequer tem a chance de o fazer.
 
Embora o drama principal entre Arrietty e Shô se constrói de forma ótima e envolvente, e diferencial ao se rondar em torno de um tom triste e quase amargo, de coisas impossíveis de se sustentarem pelas circunstâncias em que vivem, cada um em sua própria natureza e seres, com as escalas de problemas bem delineadas em sua disparidade. Onde os sonhos, os sentimentos nas relações, os lugares onde criamos nossas raízes, os momentos onde encontramos propósito e felicidade, tudo acontece e passa muito rápido com pouco tempo para se resgatar, apenas os sentimentos que tiramos dessas breves experiências que marcam nós para sempre. Essa é a força dramática altamente complexa que se rege por trás do núcleo de O Mundo dos Pequeninos, e  que ressoa fortemente dentro do elenco de personagens realmente amáveis que cercam o filme.

 
 
É uma história que muito fala sobre o presente, e o agora, e todas as nossas dores que sentimos e carregamos conosco em nossas frustrações ou naquilo que acreditamos ser nossas limitações, seja na doença de Shô ou no próprio tamanho de Arrietty e os perigos que sua espécie enfrenta dentro do mundo humano. É a exata metáfora explicita de como o mundo nos repreende e opressa em vários momentos de nossas vidas, mas através desses pequenos momentos de encontro, partilha e um sopro de felicidade e esperança somos capazes de ainda nos sustentar em nossas existências e vivermos mais um dia mesmo sem saber o dia de amanhã que nos espera, mas pelo menos se agarra na esperança que outrora tivemos em um momento de nossas vidas.
 
É tudo instantaneamente inspirador, identificável e que resulta em um filme especial comovente fora apenas do aspecto do mundo em miniatura, que também é um grande destaque dentro dos maiores aspectos do filme. A direção de Yonebayashi tira o melhor proveito disso, desde as cenas de exploração dentro da casa pelos Borrowers no inicio que reúne uma sensação palatável de suspense e aventura, juntas em um só. Que te prende o olhar para a enormidade de como uma casa humana normal é em comparação para com esses pequenos seres, com o perigo e a sensação de adrenalina de suas vidas sendo instantaneamente apreendidos e traduzidos para o público, tudo através de pura forma visual.
 
Mesmo que a disparidade de tamanho entre "os dois mundos" acabe soando estranha às vezes, onde nunca fica realmente claro o quão pequena Arrietty e sua família realmente são em comparação com outros insetos e os humanos, porque sempre parece estar mudando a cada cena uma atrás da outra.
Não que seja um incomodo apenas um detalhe perfeccionista que realmente atrai seus olhos e instiga sua atenção para as possibilidades infinitas que este mundo oferece com seus pequenas traços de idéias embalando uma construção de mundo recheada de nuances. Não é um filme muito sobre grandes escalas, pois foca muito mais no íntimo de cada personagem, até mesmo dentro do ponto de vista de Arrietty onde tudo o que seguimos é tão próximo dela e da sua relação familiar, que são momentos especialmente bem escritos e tornados ainda mais reais, por serem construídos em um elemento totalmente desenvolvido dos momentos humanos dentro do universo fantasioso do filme – o traço Ghibli usual.

 
 
Mas no meio de tudo, a única coisa que passa pela sua mente, fora a crise existencial dos personagens, é como este mundo realmente faz você se perguntar o tamanho de uma formiga, ou de uma joaninha, ou de todos os seres vivos que vivem ao nosso redor que mal podemos ver, e além disso tematicamente falando, questionar o próprio valor de sua própria existência. Este é um filme de Ghibli então não poderia faltar um toque de análise filosófica sobre a natureza, muito bem implementada aqui e até tratada em terreno original dentro dos elementos usuais que sempre exploram nos filmes de Miyazaki. Focalizando a natureza menor que nos cerca, e nossa responsabilidade para com eles, e discutindo o fato de que somos todos do mesmo mundo e nada diferentes uns dos outros.
 
Bem, esse é o verdadeiro sentido de escala que O Mundo dos Pequeninos traz em sua criação, um senso de imaginação, mas também de humanidade. Sobre a constante busca de entender o nosso próprio entorno e aprender a viver dentro de nossos limites através das coisas que carregam nossa felicidade em meio à tristeza, e nos inspiram a seguir em frente e aprender a valorizar as coisas que importam. Mesmo que não seja tão excelente quanto poderia ter sido, este definitivamente ainda é um filme especial e memorável de qualquer maneira dentro do panteão Ghibli!



REFERÊNCIAS:

 

 ElectricDragon505. "The Secret World of Arrietty - AniMat's Reviews". Youtube, 6 de out. 2015. Disponível em: <https://youtu.be/NAhmyYKPq4E. Acesso em: 05 de Jul. de 2021.

Fake Doug Walker. "The Secret World of Arrietty - Disneycember". Youtube, 19 de Jul. 2017. Disponível em: <https://youtu.be/BzvAEW-bUHo>. Acesso em: 05 de Jul. de 2021. 


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