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11/08/2021 às 14h47min - Atualizada em 11/08/2021 às 12h53min

Preconceito linguístico no Brasil

Conheça mais sobre esse preconceito que está ligado a questões socioculturais do país

Thamires Trindade - revisado por Jonathan Rosa
O preconceito linguístico no Brasil é um tipo de discriminação que ocorre diariamente. (Foto/Reprodução: Revista Veja)

O preconceito linguístico consiste em discriminar as variedades ditas não cultas da língua, apresentando suas características gramaticais como erros.

 

Álvaro Kasuaki Fujihara, 37 anos, atua como professor há 14 anos e atualmente é docente de Língua Portuguesa e Linguística no Departamento de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Ele afirma que esse preconceito “consiste em discriminar as variedades ditas não cultas da língua, apresentando suas características gramaticais como erros”.

 

O professor pontua que há uma falsa ideia no senso comum de que a língua é homogênea, que existe apenas uma gramática do português e todo o restante são apenas desvios. Mas essas ideias estão equivocadas, porque a língua varia tanto no tempo quanto no espaço. Álvaro afirma que o português que se fala hoje, não é mais o mesmo que se falava há duzentos anos, assim como o português que se fala na periferia de São Paulo não é o mesmo que se fala no interior da Bahia. 
 

A mudança é inerente a qualquer língua - do contrário, nunca teria existido uma língua portuguesa (nem mesmo o Latim – estaríamos presos ainda a um ancestral perdido em tempos imemoriáveis). Todas as variedades linguísticas de qualquer língua natural possuem uma gramática altamente complexa (que inclusive demandam um refinado trabalho de descrição e análise em disciplinas científicas como a linguística). Não há nenhum argumento que sustente a ideia de que há uma variedade superior em complexidade a outra. O que acontece é que, dentre um conjunto de uma infinidade de variedades linguísticas existentes, elege-se uma como correta e descarta-se todas as outras.

E quem são os alvos dessa discriminação? 

 

Esse preconceito está diretamente ligado a questões socioeconômicas, regionais e culturais. E ele existe porque há um padrão a ser seguido pela língua portuguesa e tudo o que “foge” da norma culta é considerado como um erro. 

 

O professor esclarece que isso está fundamentado nos preconceitos sociais. Ele diz que é possível identificar as origens socioeconômicas e geográficas de um falante através do seu modo de falar e assim saber se a pessoa vem do interior, da periferia, se tem alta ou baixa escolaridade etc. As pessoas que costumam ser alvos dessa discriminação, normalmente estão afastadas dos grandes centros urbanos ou vivem em periferias, onde as pronúncias, expressões e construções sintáticas são diferentes, segundo o professor. 
 

O preconceito linguístico é um preconceito social, travestido de zelo pela língua. Supostamente, quem assedia as pessoas por conta da variedade linguística falada (as pessoas que têm mania de corrigir as outras), o fazem para evitar a “degradação da língua”. "Onde é que vamos parar se as pessoas continuarem a assassinar o português assim?” Existe a ideia de que preservar a língua é uma espécie de luta civilizatória contra a barbárie, sem a qual cairemos numa espécie de abismo cultural. Esse discurso ecoa ao longo dos séculos.

Álvaro acredita que esse preconceito ocorre no Brasil, pois já é um país profundamente desigual e é difícil combater isso, quando se tem tantos outros enraizados na sociedade. É preciso que haja uma educação voltada para a diversidade linguística e um reconhecimento de que a língua não é homogênea, mas sim um grande conjunto de variedades vivas em constante mudança. Ele reforça que não há razão para considerar que a língua culta seja superior às demais. A linguística moderna tem se dedicado a estudar e realizar pesquisas, de modo criterioso para compreender todas as suas formas, riquezas e complexidades.


Durante o programa Papo de Segunda, do canal GNT, o apresentador Fábio Porchat,  o filósofo Francisco Bosco, o cantor Emicida, o ator João Vicente e o escritor Geovani Martins debateram sobre como o preconceito linguístico acontece. Confira:

O preconceito linguístico, Papo de Segunda. (Reprodução: Canal GNT - Youtube) 


O linguista Ataliba Teixeira de Castilho também comenta sobre as discussões e mudanças da língua falada. Veja:  

Quando se trata de português falado, não existe certo e errado. (Reprodução: Canal Pesquisa Fapesp - Youtube)


Portanto, entender que a língua vai muito além de uma norma padrão já é um bom começo para abraçar as diferenças e diversidades que a língua proporciona.


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