Ao encarar a janela do seu quarto, percebe que o dia está nublado, com nuvens de um cinza escuro, quase preto indicando que uma tempestade está prestes a vir, é algo tão intenso que você consegue sentir o cheiro da chuva que virá e sua pele se arrepia com o frio.
Com esta conclusão em mente, solta um sorriso de canto ao pensar na ironia:
Já que sair está fora de cogitação, resolve ler algo. Uma leitura clássica: um jovem casal de Verona comete suicídio um pelo outro, já que suas famílias são rivais, tornando seu amor algo impossível. Ao finalizar, conclui: “isso sim é amor: não ser capaz de ver um futuro sem quem ama”. Grande equívoco.
Romantização do suicídio: heróico ou equivoco?
O tempo passa e você lê cada vez mais obras que romantizam o suicídio, tornando tal ato algo heroico, seja ele cometido em nome do amor romântico, familiar, ou até mesmo por pensar que o mundo é melhor sem sua presença.
Logo, aquilo se torna uma atitude normal e honrosa ao seu olhar e como a cada dia você vê menos sentido na sua existência frente a todos os impasses de sua vida, com sua alma nublada, chega a uma conclusão:
“Me identifico tanto com os protagonistas das minhas histórias favoritas, é como se falassem comigo! Então talvez o suicidio não seja tão ruim”
Grande erro! Mas infelizmente isto é algo mais comum do que se imagina. Afinal: por quanto tempo as obras literárias irão romantizar o suicidio? Por qual razão o fazem?
Estes são uns dos questionamentos que buscaremos solucionar aqui com a ajuda da psicóloga e neuropsicóloga Patrícia Souza, que já colaborou com a gente na matéria: “Conte-me seus sonhos”: a obra levanta questionamentos sobre como lidamos com nossos traumas.
Romantização nas obras literárias
Acerca da romantização do trágico desfecho do clássico Romeu e Julieta, Patrícia afirma que romantizar o pensamento de que não ser capaz de viver sem seu parceiro (a) é algo recorrente até nos dias atuais, mas é algo errôneo e perigoso:
Ela ainda acrescenta que a maturidade emocional de cada indivíduo é o fator principal para não ser influenciado por tais leituras e acredita que o suicídio era romantizado na época pois a sociedade não compreendia sua gravidade:
"A influência vai muito da maturidade e do pensamento da pessoa, depende de cada um. Penso que naquela época eles (escritores e sociedade) não tinham consciência que o suicidio era um pedido de socorro”, diz Patrícia.
Todavia, este pensamento de dependência emocional não está presente apenas nas obras clássicas: "Lua Nova”, segundo livro da saga "Crepúsculo" que se tornou um fenômeno do cinema entre os anos 2008 e 2014 é um exemplo atual.
Bella entra em depressão profunda após o término com Edward e começa a praticar atos radicais que beiram a morte, pois assim consegue vê-lo (ou ao menos uma persona criada por sua mente). Tal atitude é romantizada e a neuropsicóloga comenta:
“O suicídio está longe de ser um ato heróico, muito pelo contrário ele é um ato de desespero”
Inicialmente, é importante explicar o que é o pensamento suicida, sendo ele não o desejo de morrer, mas de acabar com a dor e não encontrar outra alternativa para tal, como explica a psicóloga:
Sobre o encantamento do suicídio nessas e outras obras, a nossa convidada afirma que sua leitura pode confundir o pensamento de quem tem tendências a depressão e o suicídio, enfatizando que está longe de ser um ato heroico ou prova de amor, mas sim que representa dor e sofrimento:
Busque ajuda, você não está só!
Para concluir, a neuropsicóloga especializada em depressão e ansiedade reforça a importância de conscientizar a sociedade a importância de buscar auxílio profissional e como familiares e amigos podem ajudar:
“Temos que conscientizar essa nova geração sobre a importância de pedir ajuda, e de ativar a inteligência emocional para poder gerenciar melhor as emoções. E principalmente procurar um psicólogo quando for necessário. É importante ou alguém da família prestar atenção no comportamento da pessoa e ajudar ou mesmo dividir o sofrimento com alguém e procurar ajuda profissional", conclui.