Em entrevista ao escritor Ferréz na CCXP 2020, o quadrinista Marcello Quintanilha analisa sua trajetória traçando um panorama do mercado editorial brasileiro.
Inteiramente virtual em função da pandemia do novo coronavírus, a edição deste ano do maior evento da Cultura Pop do mundo, a Comic Con Experience – CCXP, contou com atrações nacionais e estrangeiras de destaque. Dentre elas, o prestigiado niteroiense premiado em Angoulême com a HQ Tungstênio, recentemente adaptada para o cinema –, Marcello Quintanilha.
No primeiro dia do evento, no palco principal do Artist's Valley – reduto dos quadrinistas e coração do tradicional evento –, o autor da HQ Luzes de Niterói (a obra de histórias em quadrinhos mais recente) falou de como houve uma mudança no modo como o seu trabalho é recebido pelo mercado (editoras, público e crítica). Respondendo a um abrangente questionamento do roteirista paulistano Ferréz sobre o começo da carreira, Quintanilha pondera que o seu trabalho passou a ser mais bem recebido com uma abertura do mercado editorial brasileiro e o estabelecimento de um cenário nacional de HQs.
Ele lembra que editoras e outros agentes do meio, questionavam/criticavam o fato de haver muitas pessoas pobres nas suas histórias. Com pesar, hoje, Marcello afirma que tinha uma certa desconfiança de que naquele contexto o termo pobre fosse um sinônimo para preto. O que ressaltaria ainda mais a pequenez da visão artística/comercial, além de ressaltar o racismo estrutural do país.
O quadrinista também contou um pouco sobre o seu modo nada metódico de produção e a naturalidade com que aborda temas espinhosos do Brasil. A Ferréz, Quintanilha diz que não busca intencionalmente se aproximar e estabelecer espaços de representatividade. A sua intenção é materializar a “brasilidade” tal como ela é. O brasil da Cultura com seus maneirismos, jeitos, riquezas de costumes e todas as naturezas de sincretismo, como diria o antropólogo Roberto DaMatta.
Na entrevista no agora “Vale dos Artistas” – nas edições anteriores o espaço era chamado de Artist's Alley (“Beco dos Artistas”) –, o também editor Ferréz levanta a discussão da maneira pela qual Marcelo Quintanilha, hoje radicado em Barcelona (Espanha), consegue captar a brasilidade como se vivesse o dia a dia nas principais cidades brasileiras. No seu entendimento, ele apenas trás em suas narrativas exemplos de vida de uma fatia significativa da população brasileira: uma classe média empobrecida.
No fim, um dos quadrinistas mais reverenciados hoje no Brasil e no mundo, conta um pouco sobre a sua nova empreitada artística, que é recém-lançamento do 1º romance: Desenrama (editora Veneta, 2020). Informa que é uma nova aventura e que não fora programada. Marcello narra que em um determinado momento, frases soltas em seu computador foram se juntando a outras, mais outras e se transformaram em um livro sobre o “espetáculo do desejo” – desejo + orama: ideia de espetáculo, vista em grego.
Referências:
DAMATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? São Paulo: Rocco, 1986. 128 p.
Editora Veneta. Deserama | Marcello Quintanilha. (8m34s). 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=XFn3LHKe11E&t=33s. Acesso em: 5 dez. 2020.
SOUSA, C. CCXP Worlds anuncia Artists’ Valley com mais de 700 artistas. Omelete. Notícia. 23 nov. 2020. Disponível em: https://www.omelete.com.br/ccxp/ccxp-worlds-artists-valley/. Acesso em: 30 nov. 2020.