Lab Dicas Jornalismo Publicidade 728x90
21/06/2021 às 23h44min - Atualizada em 21/06/2021 às 23h27min

"O país do forró" sem festejos juninos em mais um ano de pandemia

Em segundo ano de crise sanitária, o São João do estado de Sergipe encontra adaptações

Lucas Lima - editado por Larissa Nunes
Fonte: F5 NEWS

"Sergipe é o país do forró, tem moça bonita que só. Quando chega o mês de junho na rua de São João, o forró vai começar, laia laia.’’ Assim cantou em rimas o músico Rogério. Nascido na cidade de Estância, o forrozeiro não imaginava que quando escrevesse essas letras, sua canção se tornaria o selo extraoficial do mês junino no estado de Sergipe. 

 

Lugar da trindade do forró, com a sanfona, zabumba e triângulo, o ciclo junino no calendário sergipano é, indiscutivelmente, o período do ano mais esperado por todos. Mês em que celebram as festas de Santo Antônio, São João e São Pedro, esta é uma época marcada pelas crenças, superstições e brincadeiras; tais como quadrilhas, pau de sebo, quebra-pote, guerra de espadas e entre tantas outras.

 

Na gastronomia, as comemorações proporcionam um banquete típico para o momento, com a presença dos famosos pratos como milho, o quentão e o fubá. Ah, o mês de junho é ‘‘bão demás’’!

 

Com o cenário epidemiológico em um segundo ano de crise sanitária, as tradicionais comemorações são obrigadas a passarem novamente por adaptações, adicionando ao mês de ‘‘junió’’ um novo jeito de celebrar. O tempo de dançar um forró coladinho se tornou um evento impossibilitado.

 

Sem festas e folia em mais um ano, o estado vê sua economia enfrentar prejuízos. O cenário afeta toda uma cadeia que é quebrada. Do setor de turismo ao artesão, do vendedor de água ao segurança da festa.


O mercado Municipal e de Artesanato da capital sergipana é referência para o mês. Além de palco para a tradicional festa do Forró Caju, o espaço é porta de entrada para o turismo junino no estado. Elayne Cristina tem uma loja de artesanato na região e diz que para o setor em que atua ‘‘o mês de junho é como o final de ano do comércio’’, pois o movimento de turistas é muito grande e isso se reflete nas vendas.

O primeiro ano de pandemia apresentou empecilhos no faturamento da sua loja devido as restrições impostas, porém ela vê neste ano uma melhora um pouco significativa por ‘‘o pessoal está mais animado, decorando casas e estabelecimentos para entrarem no clima junino’’. Apesar dessa leve melhora, a artesã afirma que as vendas não se comparam com as dos anos anteriores a 2020.


Mercado Thales Ferraz – Reprodução: Infonet

Mercado Thales Ferraz – Reprodução: Infonet


Além do comércio, os impactos com cancelamento dos festejos juninos atingem artistas locais, que ficam sem fazer shows. Do tradicional ao eletrônico, os forrozeiros passarão mais um mês de junho sem eventos presenciais. João Araújo é um dos artistas afetados pelo segundo ano de pandemia. 
 

 

‘‘É uma tristeza não só pela questão financeira, mas como também artística. Nós, que somos músicos, gostamos de está em cima do palco levando alegria ao povo. Então, não ter os festejos juninos este ano, que é uma raiz tão forte nossa, é uma grande tristeza''.

 

O músico conta que no período anterior a pandemia, chegava a realizar em torno de 30 shows em junho, mas que este ano sua atuação novamente estará restrita a lives e eventos remotos. ‘‘Costuma-se dizer que neste período é quando o músico faz seu pé-de-meia para o ano todo, e mais uma vez, sem os eventos presenciais, isso traz um impacto financeiro muito forte’’, afirma.
 

 

Felizmente, João conseguiu ser contemplado em alguns editais da lei Aldir Blanc e boa parte da sua atuação neste ano será proveniente desses recursos. Além dos auxílios da lei, iniciativas públicas no estado, como Forró Caju em Casa e Encontro Nordestino de Cultura têm sido implementadas para amparar os artistas neste momento de paralisação. ‘‘Nada se compara aos shows presenciais, mas ajuda bastante todos esses recursos’’, diz João.

 

A Aldir Blanc em Sergipe

 

A lei homenageia Aldir Blanc Mendes: letrista, compositor e cronista brasileiro. Médico formado pela Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, Aldir foi vítima da covid-19 em maio de 2020. 

 

A Lei Aldir Blanc que prevê auxílio financeiro ao setor cultural foi regulamentada pelo Governo Federal. A iniciativa busca apoiar profissionais da área que sofreram com impacto das medidas de distanciamento social adotadas por causa do coronavírus. Foram liberados R$ 3 bilhões para os estados. Em Sergipe a FUNCAP está sendo responsável por administrar a implementação da lei. Até o momento foram contemplados mais de 1.400 artistas atuantes no estado.

 

Comemorar em meio as adversidades

 

Musicalmente, teremos canções como "Asa Branca" e "Olha Pro Céu" silenciadas nas ruas das cidades. E os quadrilheiros? Esses não vão vestir aquela bela camisa xadrez ou mesmo aquela saia rodada cheia de adornos. A poeira não vai subir com os passos e nem o chão tremer com o quebrar do caranguejo. 

 

Para Mayara Souza, membro da quadrilha Assum Preto, é uma sensação ‘‘dolorosa’’ saber que os eventos juninos seriam cancelados por mais um ano. Ela conta que o grupo tenta manter o espírito junino, gravando vídeos e realizando lives. Porém, a ausência do calor humano faz muita falta. 
 

 

‘‘A quadrilha segue à risca todos os protocolos de segurança, por isso estamos atuando totalmente de forma remota. Faremos nossa live, onde será tocado as melhores canções em celebração dos 30 anos da quadrilha e terá a participação dos integrantes de forma virtual’’, afirma Mayara. 

 


Além das tradicionais danças de quadrilhas, as manifestações culturais especialmente da cidade de Estância, fazem falta ao forrozeiro arretado que nunca perde uma festa junina. Nathalia Santos é uma delas. A moradora da cidade de Estância conta que como todo sergipano raiz, esperava que tudo estivesse normalizado para este ano. ‘‘Era para está acontecendo a Salva. Essa é a festa de abertura do São João na minha cidade e ela atrai um público de todo o estado. Então é uma festa crucial para todo estanciano e não ter ela em mais um ano faz muita falta’’, aponta.

 

Berço da cultura junina no estado, o município de Estância é famoso pela tradição dos barcos de fogo, dos cortejos folclóricos, das apresentações de quadrilhas juninas e dos grandes shows artísticos promovidos durante as noites.

Estância em época de festejos juninos - Reprodução: Portal Lagartense.com.br

Estância em época de festejos juninos - Reprodução: Portal Lagartense.com.br


 


‘‘O mais encantador era a simplicidade que ao mesmo tempo era tão gostoso os eventos que aconteciam. Todo mundo ia, se divertia com seus amigos. Era tão simples, mas todo mundo gostava e queria está ali’’.

 

Para este ano, Nathalia diz que a programação vai ser igual a do ano anterior. Comprar um licor, uma cerveja e assistir as lives. ‘‘Vou vestir minha camisa xadrez, minha priquitinha, comer comida típica e comemorar do jeito que dá’’.

 

Apesar do momento atípico, a fogueira do São João segue com chama acesa no coração de quem passará mais um ano sem a festa que alimenta financeiramente e fisicamente a vida de milhares de sergipanos.
 


Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »