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27/06/2019 às 21h23min - Atualizada em 27/06/2019 às 21h23min

O que está por trás do sucesso de Jordan Peele e Ari Aster

O terror psicológico está ganhando maior espaço entre o público após o lançamento de Corra!, Hereditário e Nós. Midsommar está a caminho, prometendo ser mais um grande sucesso. Mas, o que Peele e Aster fizeram de tão bom para conquistar o mundo cinematográfico?

Carolina Rodrigues - Editado por Bárbara Miranda
MONTAGEM: Carolina Rodrigues
Quando o sucesso Corra! foi lançado em 2017, vimos o público se dividir entre aqueles que adoraram o filme e os que acharam o longa arrastado e tedioso. Enquanto ainda discutíamos os signos do primeiro thriller de Jordan Peele, Hereditário foi lançado em 2018 e chocou a maior parte dos espectadores, encantados (ou amedrontados) com a performance do diretor Ari Aster em seu primeiro longa. Vimos, a partir daí, um modelo de terror diferente do habitual tomando conta dos cinemas mundo afora.

Ninguém poderia imaginar que um cara que construiu a carreira dentro do humor e outro, em seu primeiro longa-metragem, fariam tanto sucesso. Jordan Peele e Ari Aster conquistaram a opinião pública e ótimos índices de aprovação no Rotten Tomatoes.

Corra! e Nós, produções de Jordan Peele, tem 98% e 94% de aprovação no Rotten respectivamente. Ari Aster conquistou 89% em Hereditário e sobre a estreia mais aguardada do ano, Midsommar, já granjeou 100% de aprovação.

Essas produções nos mostram um movimento entre o abandono de jump scares em excesso e a adoção de tramas com teor psicológico.
 

Trailer do filme Midsommar, com estreia marcada para o dia 3 de julho deste ano


Um novo gênero?

Segundo o editor do site Esquina da Cultura e colaborador do Estadão, Matheus Mans, o cinema está passando por um processo de industrialização. Ou seja, ao invés de filmes “novos”, temos salas com lançamento de sequências, franquias, remakes ou reboots de algum filme.

Como exemplo temos o caso da sequência incansável de Annabelle, já no seu terceiro filme, ou a refilmagem de Natal Negro (1974) com estreia definida para dezembro deste ano.

Para Mans, esse tipo de filme afasta o público, que não se vê representado nas telas. É aí que surgem Peele e Aster, com filmes autorais e independentes, com “discursos únicos e industrializados”, como o editor comenta.

O editor-chefe do site Calvero Crítica de Cinema, Renato Cabral, reforça a opinião de Mans, ao apontar que ambos os diretores estão desenvolvendo filmes menos clichês. Mesmo caminhando “em terreno já conhecido do público, o suspense e o terror, em alguns pontos, seus filmes caminham um pouco além da curva e causam um burburinho exatamente por esse ponto”, ele afirma.

Corra!, Nós e Hereditário possuem uma narrativa com desdobramentos e desenvolvimento psicológico e social bem mais fortes, segundo Cabral. É neste ponto em que ocorre a retomada da identificação do público com a obra. Aster e Peele abordam questões em voga e invocam reflexões sociais sobre diversos temas, como racismo, culpa e conflitos geracionais.

“As pessoas se identificam mais, compram a ideia, mergulham na narrativa. Se sentem pertencentes, novamente, ao cinema, ao filme. Veem, às vezes, sua vida na tela – como é o caso do racismo em Corra!, da falência social em Nós ou de questões psicológicas em Hereditário”, Mans complementa.

Somado a estes fatores, temos a brilhante performance dos atores que faz o público validar a narrativa e repensar determinadas situações sociais em que vivemos hoje.
 
Corra! foi uma grande produção que aborda o racismo e conquista de direitos civis ao mesmo tempo em que utiliza elementos derivados do terror para manter o público atento a cada passo de Chris (Daniel Kaluuya). Não foi à toa que a obra ganhou o prêmio de melhor filme no Independent Spirit Awards e Oscar de Melhor Roteiro Original, em 2018.
 
O que está por trás do sucesso de Jordan Peele e Ari Aster

O que está por trás do sucesso de Jordan Peele e Ari Aster

                                                                                        FONTE: Nerve Media

Segundo o criador do site Guia de Terror, André Cavallini, Peele e Aster caminham juntos na criação de um subgênero dentro do terror.

Cavallini fala sobre a criação de um gênero chamado “terror social”; uma soma entre aspectos psicológicos e sobrenaturais. “Eles estão acrescentando um ‘tempero’ especial, saindo do lugar comum dentro do terror. Esses aspectos junto a uma forma mais bizarra de alteração social mexem com o público – e o momento atual está bem propício para esse tipo de reflexão, mesmo que por meio do fantástico”, avalia.

Contudo, Matheus Mans e Renato Cabral discordam. Para eles, o terror psicológico sempre existiu. Cabral cita as obras do diretor Roman Polanski, “O Bebê de Rosemary” e “O Inquilino”. Com o lançamento de A Bruxa (2015) burburinhos falavam sobre um chamado “pós-terror”, uma nova escola dentro do horror, como explica Mans.

“Não gosto do termo, por ser semanticamente incorreto, mas ele indica um movimento real que está acontecendo no cinema. Vai pelo lado da introspecção, do silêncio, de personagens mais humanos, atmosferas mais cinzentas”, Mans completa. Pode-se pensar, então, que tanto Ari Aster quanto Jordan Peele trazem abordagens diferentes das que encontramos dentro do terror, fato que mexe e incomoda (de forma positiva) o público.

Para Para Renato Cabral, ainda é difícil ter uma definição certa para o que ambos os diretores produzem, mas de todo modo “é um olhar mais interessante e menos previsível dentro do gênero”.
 

Mas.. e o terror clássico?

Seguindo a ideia de industrialização cinematográfica proposta pelo editor do site Esquina da Cultura, Matheus Mans, observa-se outro processo, subsequente, de saturação. Matheus reforça que “o público ainda pode gostar desse tipo de produção, mas não com a mesma intensidade de cinco anos atrás”.

O terror clássico sempre terá espaço e público; filmes como Atividade Paranormal ou Invocação do Mal ainda fazem sucesso e são esperados com ânimo. Para Cavallini, esse modelo nunca deixou de existir, desta forma, hoje ele “está sendo atualizado ou repaginado”.

O exemplo dessa repaginação é o primeiro longa de Ari Aster.

Hereditário possui uma narrativa muito complexa que envolve o sobrenatural e a dor do luto para além do óbvio e dos jump scares gratuitos, com uma trama bem amarrada e tensa do início ao fim. Não obstante, o filme foi muito bem falado durante o Festival de Sundance, em suas primeiras aparições.

O que está por trás do sucesso de Jordan Peele e Ari Aster

O que está por trás do sucesso de Jordan Peele e Ari Aster


FONTE: Book Squad Goals

Há espaço para todos os tipos de produção de suspense e terror. Mesmo sendo lançadas em paralelo com outros filmes como It: A Coisa (2017) e Um Lugar Silencioso (2018), ambos sucessos de bilheteria, o thriller psicológico vem ganhando destaque ao se encaixar perfeitamente num momento social repleto de incerteza e medo.

Matheus Mans diz que o mercado cinematográfico é cíclico. “Talvez a paixão e o cansaço com o óbvio causem um novo movimento para, daqui alguns anos, a linguagem de Jordan Peele e Ari Aster se tornem saturadas. E aí quem sabe o que teremos?”.
 

Para conhecer melhor os entrevistados:
André Cavallini - Guia de Terror
Matheus Mans - Esquina da Cultura
Renato Cabral - Calvero Crítica de Cinema

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