29/04/2023 às 21h24min - Atualizada em 29/04/2023 às 20h43min
Joy Wang e a sensação de pulsão de morte
Questões que permeiam o filme Tudo em todo lugar ao mesmo tempo
Laury Pereira - Editado por Marcela Câmara
Imagine ser uma adolescente que mora com os pais que emigraram para os Estados Unidos e você da união deles nasceu nesse país. Sua mãe a matriarca da família, por ser algo completamente diferente da origem e geração dos seus pais, não entende sua sexualidade e as questões que lhe permeiam. Todos os seus sentimentos conflitantes são colocados em um circulo, que suga sua pulsão pela vida, a medida que esse buraco negro cresce sua pulsão pela morte também.
O sentimento de desconexão sobre a vida é fortemente presente pela Joy Wang, conhecida também como Jobu Tupaki, interpretada pela atriz Stephanie Hsu, do filme “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”. Na trama apesar que não mostra como se iniciou esse sentimento de deslocação perante a vida, pois o foco central é a mãe dela Evelyn. Joy é um personagem que dá o impulso destaque sendo uma antagonista, alimentando um círculo, que parece mais uma rosquinha e mostra as controversas e desilusões da vida. Retratada como alguém sempre deslocada do mundo em que vive, na trama interpreta uma adolescente cheia de conflitos internos que não é ouvida pelos pais, principalmente por sua mãe, a figura cuidadora e ao mesmo tempo protetora, já que, o pai parece sempre alheio às questões familiares, deixando a mãe sobrecarregada com as demandas da família, também, a pressão social e interna do desempenho, com isso acaba esquecendo e não dando a devida atenção para sua filha única Joy. Todos os conflitos familiares de Jobu: a negligência, o desamparo, o sentimento de não pertencimento tanto interno como cultural. Um exemplo disso, quando ela conhece o avô e ela não fala o mandarim como ele, acaba sendo questionada por suas raízes. Todos os sentimentos conflitantes, são colocados inconscientemente, assim, alimentando um círculo de autodestruição consigo, que se alimenta e cresce ao longo do filme até isso ser resolvido com o diálogo entre a família.
Para Sigmund Freud, o pai da psicanálise, os traumas na infância e ao longo da vida, são reprimidos no inconsciente podendo causar distúrbios psicológicos e problemas de comportamento na vida do indivíduo. No caso da Joy, todo sentimento reprimido é colocado de forma inconscientemente em um círculo, a vivência condensa esses sentimentos e são manifestados no comportamento dela, como: o isolamento, brigas, repetição de atitudes desregulares, ausência de vivacidade e prazer na vida, de uma autodestruição interna e depois externa. Nesse caso, a teoria psicanalítica de Freud, que levaria ao indivíduo a pulsão da morte é presente, pois segundo essa teoria há uma força destrutiva no indivíduo que age contra a vida e o impulso de preservação, buscando a destruição de si.
Uma incessante busca do antes da vida, do inanimado sem vida, “o inanimado existia antes do vivente” - Freud. E esse impulso é presente porque o corpo e a mente não suportam mais a pressão da vida cotidiana, o indivíduo não aguenta mais e busca de todas as maneiras a voltar para o antes, o inorgânico, uma desintegração de si. Contudo, há várias camadas da saúde física e mental da pessoa levar a tal ato, não se dá para analisar em uma obra os hormônios neurotransmissores dos personagens, que influenciam também nisso, apenas suas falas, juízos de valores e as suas escolhas quando apresentadas, para ser o que são hoje, elaborando uma análise das motivações desse.
Para a Jobu, esse impulso que à leva a auto destruição, é um alívio de si mesmo e das suas questões conflitantes que lhe permeiam, para tudo isso acabar precisa voltar ao que já foi. No filme, ela luta com a Evelyn diversas vezes em uma busca que a mãe se junte a ela nessa desintegração e deixe que o círculo, onde estão seus pensamentos mais sombrios, vença e destrua tudo, inclusive ela, uma força que lhe impulsionar a ter tal ato.
No final da trama, a mãe dela Evelyn depois de resolver suas questões intrínseca, tenta por meio do diálogo convencer a filha que não se deixe levar pelos seus impulsos, mas é algo mais forte do que a Joy. Depois de um tempo, por meio do diálogo convence a filha e se mostra mais presente e amável do que nunca para combater o círculo que é apresentado como um monstro, o vínculo delas é então estabelecido e a vontade de viver a vida e preservar ela vence no final.
O filme é repleto de elementos: da cultura asiática, ficção científica, conflitos sentimentais, artes marciais, comédia, reflexões da filosofia existencial e niilista. Apesar do tema multiverso e viagem no tempo ter se espalhado pelas produções cinematográficas, principalmente em filmes de heróis da Marvel, como, “ Dr. Estranho e o Multiverso da Loucura”, “Guardiões da Galáxia”, o filme Tudo em todo lugar ao mesmo tempo, se destaca entre os demais pela montagem e desenrolar das cenas, misturando jornadas paralelas que depois de um tempo conversam entre si.
Além disso, o enredo da família é algo complexo e cada personagem tem sua própria filosofia de vida, o que alimenta a história e não fica naquele maniqueísmo entre o bem e o mal ou está certo e errado, que normalmente é bastante presente entre filmes de ficção científica e as viagens no multiverso. Com diferentes evoluções dos personagens a história mostra a intensidade desses, não deixando a deseja e nem muito menos passando algo superficial, mas para aqueles que assistem o filme de forma desatenta, não tem o devido mergulho no ideal do filme, podem achar estranho pelo motivo das suas idas e voltas, não é algo linear como os demais filmes, os sentimentos vão e vem. Sua história cumpre além do entretenimento das obras cinematográficas de mesmo gênero, traz consigo profundas reflexões filosóficas e apesar que é uma trama longa dividida em três partes, não te deixa com sono ou entediado.
Carvalho, Alexandre. “ Pulsão de morte - você contra a sociedade”. Superinteressante. Disponível em < https://super.abril.com.br/especiais/pulsao-de-morte-voce-contra-a-sociedade/ > Acesso em: 09 de Abril de 2023.
