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08/10/2023 às 18h47min - Atualizada em 08/10/2023 às 16h37min

Funny Girl Brasil: a inesquecível versão nacional do clássico da Broadway

Com versões de tirar o fôlego e atuações extraordinárias, a versão brasileira de Funny Girl brilha os olhos dos fãs de musicais.

Gabrielly Leopold - Revisado por Danielle Carvalho
Giulia Nadruz fotografada por Caio Gallucci para a divulgação do espetáculo. (Foto: Reprodução/Guia Folha).

O musical Funny Girl chegou ao Brasil pela BARHO Produções e a 7.8 Produções Artísticas, com versões de Bianca Tadini e Luciano Andrey, direção artística de Gustavo Barchilon e direção musical de Carlos Bauzys. A temporada de São Paulo se encerrou em 08 de Outubro, mas o espetáculo segue para o Rio de Janeiro a partir de 28 de Outubro em curta temporada.

Essa é uma versão inédita da peça, com 1h45 de duração, sem intervalos. Por não ser uma réplica da Broadway, as referências se alternam entre elementos do filme e da peça original. As atrizes Giulia Nadruz e Vânia Canto revezam o papel de Fanny Brice, o que é um grande acerto dessa produção, deixando as duas em destaque desde a divulgação do show até as sessões. 

As escolhas criativas da equipe para essa montagem foram excepcionais, uma delas é a de deixar parte da orquestra no palco, fazendo com que o público se sinta mais próximo dos músicos, essenciais para que o show aconteça. 

Vamos conhecer a história da garota genial e entender por que a versão brasileira desse clássico merece inúmeros aplausos?

 

Afinal, quem é Fanny Brice?

Fanny Brice, nome artístico de Fania Borach, foi uma atriz e comediante judia de muito sucesso na Broadway. Ela nasceu em 1891 e morreu aos 59 anos, em 1951. A atriz se consagrou no teatro, no rádio e no cinema. Dentre seus filmes mais famosos estão Astúcia Feminina (1930) e Ziegfeld, O Criador de Estrelas (1936).


Antes de alcançar a fama, Fanny foi desencorajada por muitos, com o pretexto de não ser bonita o suficiente para seguir essa carreira. O destino começa a sorrir para a atriz quando ela ingressa na companhia de shows Ziegfeld Follies, onde se apresentou por décadas nos chamados “shows de variedades” e conquistou a sua carreira.

Sua história ficou conhecida pelo espetáculo Funny Girl, cuja estreia na Broadway foi em 1964 e, posteriormente, ganhou um filme de mesmo nome, em 1968. Tanto no teatro como nas telonas, a atriz Barbra Streisand dava vida à Fanny Brice. Barbra foi tão aclamada pela crítica e consagrada por esse papel, que algumas pessoas costumam confundir a história de Fania Borach com a de Barbra Streisand.

Em setembro de 2022, a atriz Lea Michele juntou-se ao elenco da montagem original da Broadway com recorde de bilheteria, interpretando a protagonista. Esse é um daqueles momentos em que a arte imita a vida, visto que em 2009 a atriz fazia parte do elenco da série de televisão Glee e dava vida à icônica Rachel Berry, uma jovem cujo papel dos sonhos no teatro era justamente o de Fanny Brice, já que a personagem era uma grande fã de Barbra Streisand.


Giulia Nadruz, a nossa garota genial

Giulia Nadruz em cena é sempre um presente para quem a assiste, mas interpretando Fanny Brice ela mostra que é possível surpreender ainda mais o público. Com o seu talento extraordinário, ela atua, canta, dança, faz sapateado, anda de patins e leva do riso às lágrimas em 1h45 de espetáculo.
 

A atriz capta a essência única de Fanny Brice: uma garota de família humilde e muitos sonhos em seu coração, que apesar das duras críticas com relação à sua aparência e jeito de ser, não deixa de lutar pelo que acredita. Giulia traz esses pequenos detalhes de Fanny em uma atuação exageradamente divertida desde o primeiro momento. O tom de voz levemente anasalado, o jeito desajeitado de andar e a risada cativante são marcas registradas. 

Em uma das tentativas de ter seu talento reconhecido, Fanny conta com a ajuda do querido Eddie Ryan, interpretado por André Luiz Odin, que nos contempla com um carisma adorável. Eddie consegue arranjar uma pequena participação para a amiga. O espetáculo teatral de Tom Keeney, interpretado pelo genial e super divertido Marcelo Góes, o que nos leva para a incrível cena dos patins: uma linda referência à cena do filme em que Fanny tenta provar seu valor na companhia de teatro, apesar de ser bem menos habilidosa que as outras garotas. 

É impossível não gargalhar até a barriga doer e, logo em seguida, sentir muito orgulho da nossa garota genial com a incrível performance de “I’d Rather Be Blue Over You (Than Happy With Somebody Else)”, cantada na versão original em inglês, em que Brice mostra realmente para o que veio, sendo ovacionada pelo teatro. Fanny realmente não é como as outras garotas, é extraordinária e genial de um jeito que somente ela pode ser. Mesmo a contragosto e por poucos dólares, Tom Keeney dá uma chance para a nossa estrela provar que nasceu para o show biz.

O suporte de Fanny vem de um vilarejo simples e de uma mãe extremamente amorosa

Uma das diferenças mais incríveis do roteiro da Broadway para a produção nacional é a relação da protagonista com a mãe. Stella Miranda interpreta a senhora Rose, mãe de Fanny, que na produção original não acredita tanto assim no potencial da filha e tem uma personalidade pouco amigável.

No Brasil, a relação de Fanny com a sua “mamuska” é repleta de um amor e suporte incondicionais. Para a divertidíssima senhora Rose, é inadmissível que qualquer pessoa desacredite dos sonhos de sua filha, ela é sua fã número 1 desde a época em que todas as portas eram fechadas para Fanny. Stella e Giulia têm uma conexão única no palco, entregando momentos divertidos e de aquecer o coração do público.

A família Brice vem da humilde Rua Henry, cujo cenário conta com luzinhas aconchegantes e roupas penduradas no varal, criando uma atmosfera feliz para o simples lar de Fanny Brice. Nas cenas do vilarejo, conhecemos as icônicas e intrometidas vizinhas: a senhora Meeker, interpretada por Alessandra Vertamatti e a senhora Strakosh, vivida por Nábia Villela. Mesmo com seu leve teor de inveja e descrença à Fanny, a atuação das duas traz o tom de comédia perfeito para completar a energia da rua Henry.

Por falar nesse lugar tão aconchegante, um dos números mais incríveis da peça é “Moro Aqui”, versão brasileira de “Henry Street”. É impossível não sorrir com a alegria contagiante de todo o elenco presente no palco, com números de dança e sapateado fantásticos e divertidos, nos fazendo entender como aquele lugar é tão querido por Fanny. 

Em paralelo ao sonho de ser uma grande estrela, por que não dar uma chance para o romance? 

A performance de Fanny pode não ter sido a melhor aos olhos do senhor Keeney, mas certamente o galã Nick Arnstein não pode dizer o mesmo. Interpretado por Eriberto Leão, Arnstein fica fascinado pela atriz e decide cumprimentá-la após o show, deixando as demais garotas Ziegfeld — como são chamadas as dançarinas e atrizes da companhia de Keeney — repletas de inveja.

Nick Arnstein, por sua vez, é um charmoso apostador americano que se preocupa em fazer dinheiro o mais rápido possível, o máximo que puder. O maior interesse de Arnstein passa a ser Fanny, que mal consegue acreditar que um homem como aquele a acharia interessante. Esse é o primeiro espetáculo musical de Eriberto Leão, que entrega excelentes canções e traz a sedução e o poder de persuasão marcantes do personagem. 

Será que a fama e o amor vão continuar caminhando lado a lado nessa história? 

Como o sol, ela vai brilhar! 

Enquanto o senhor Keeney reluta quanto à permanência de Fanny em seu teatro, há quem esteja disposto a disputar para ter seu grande talento em suas produções. O destino começa a sorrir para Brice com a proposta de Florenz Ziegfeld, interpretado pelo brilhante Arízio Magalhães, que a convida para fazer parte da companhia de teatro mais extraordinária da região: Ziegfeld Follies. Vale ressaltar que Arízio é uma ótima escolha para trazer a personalidade de Ziegfeld para os palcos.

Depois de muitos “nãos” e portas fechadas, o caminho de Fanny para o estrelato começa a ser mais promissor e a sua jornada de grande estrela da Broadway está apenas começando. Para que isso aconteça, a jovem faz questão de provar para Ziegfeld o seu dom nato para a comédia, ainda que de um jeito arriscado, surpreendendo a todos e arrancando boas risadas do teatro quando interpreta uma noiva grávida, que não era exatamente o planejado pelo produtor, mas é a chance de Brice deixar claro que não está disposta a ter as suas habilidades moldadas para crescer no show biz. Ao contrário de Florenz, todos na platéia se divertem com a mudança inusitada e isso traz alguns pontos de credibilidade para a garota.

Ao decorrer do espetáculo, ele passa a acreditar cada vez mais no talento de Fanny, que se torna a sua grande estrela. O sucesso dela só aumenta e Ziegfeld não poderia estar mais contente em ter investido em nossa garota genial, os dois se dão muito bem, tornando-se amigos ao longo do show. Enquanto a carreira de atriz decola, ela se envolve cada vez mais com Nick Arnstein, apesar dos constantes conflitos de agenda entre os dois, que geram uma certa frustração em Fanny.

Até onde você vai por amor?

Nick Arnstein continua com suas apostas, sempre com a promessa de conseguir muito dinheiro, mas não existem certezas em jogos de azar. Em contrapartida, o sucesso de Fanny parece ser até mais do que suficiente para arcar com uma vida confortável para os dois, embora Arnstein se oponha a isso.

Chegamos ao ápice do espetáculo com a performance que nos faz agradecer por viver na mesma época que a espetacular Giulia Nadruz, é o momento em que ela canta “Não venha trazer chuva para estragar o meu sol”, a versão brasileira de “Don’t rain on my parade” uma das músicas mais marcantes do espetáculo. Desde o anúncio da montagem nacional do espetáculo, houve uma grande curiosidade do público quanto a adaptação dessa música, considerando que as canções de espetáculos musicais não são simples traduções livres do inglês, mas não há dúvidas de que o trabalho de Bianca Tadini e Luciano Andrey foi muito bem executado aqui.

Esse é um dos solos mais marcantes e difíceis da história do teatro musical e Giulia Nadruz o faz com tanta maestria, mostrando o lado determinado e extremamente humano da comediante Fanny Brice, é praticamente impossível não ficar boquiaberto do começo ao fim. A canção marca o momento em que a garota genial desiste de sair em turnê com o teatro para seguir Nick Arnstein, o grande amor de sua vida. A letra foi muito bem adaptada para captar toda a força da personagem e comover o público.

No espetáculo original, esse seria o fim do primeiro ato, mas aqui a história é contada sem intervalos, o que de fato deixa o ritmo do musical mais dinâmico, contudo, uma pausa aqui seria muito bem vinda tanto para a atriz ter um breve descanso como para o público poder processar as informações e ser ainda mais impactado por esse solo tão marcante. Mesmo assim, esse é um daqueles momentos que ficam marcados na memória do espectador e, surpreendentemente, a história continua sendo bem conduzida sem intervalos.

 

O show precisa continuar 

Na história e pelo público, a decisão de Brice em deixar a sua carreira no auge para passar mais tempo com Nick Arnstein até hoje é questionada, mas não há sentido em medir com a razão nenhuma escolha feita por um coração apaixonado. Ela já tinha quase tudo o que queria, ficar longe do amor da sua vida estava fora de cogitação. Brice não se afasta completamente dos palcos, mas está sempre tentando equilibrar os pratos para que seu casamento dê tão certo quanto a carreira.

Depois do número “Não venha trazer chuva para estragar o meu sol”, Giulia e Eriberto nos entregam algumas das cenas mais emocionantes da peça enquanto acompanhamos o desenvolvimento do casal. Arnstein é um personagem teimoso e de pouco amadurecimento, é difícil torcer por seu romance com a sempre grandiosa Fanny. Para ela, Nick Arnstein parece saído de seus sonhos mais perfeitos, mas a realidade pode não ser tão doce assim. A garota genial faria de tudo para tê-lo ao seu lado, ao passo que ele nunca quis viver à sombra de seu estrelato.

Com um elenco sublime do ensemble aos protagonistas, a versão brasileira de Fanny Girl mantém a essência do espetáculo original mas adapta alguns aspectos para a nossa sociedade atual. Com a construção única da protagonista, que não tenta ser uma réplica do trabalho de Barbra Streisand e nem de Lea Michele, apesar de referenciá-las, Nadruz traz uma interpretação original e muito humana da estrela da Broadway, através de uma narrativa que escancara o quanto nenhum relacionamento, por maior que seja o amor envolvido ali, é unilateral. A história da resiliente e corajosa Fanny Brice nos mostra que o show sempre precisa continuar. 

Performance de 'Moro Aqui' pelo elenco brasileiro do espetáculo Funny Girl. (Reprodução: Cena Musical - Youtube).



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