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01/11/2019 às 11h57min - Atualizada em 01/11/2019 às 11h57min

A cultura do esforço e o suicídio no k-pop

Em outubro, a cantora de k-pop e atriz Sulli foi encontrada morta em sua casa. Os vestígios indicam que ela tirou a própria vida num país onde as taxas de suicídio estão entre as maiores do mundo e que ainda enxerga o fato como um tabu

Carolina Rodrigues - Editado por Bárbara Miranda
CRÉDITOS: Marie Claire
A notícia atingiu com um baque fãs de k-pop espalhados ao redor do mundo. No dia 14 de outubro, Sulli, ex-integrante do k-group feminino F(X), teve seu corpo encontrado em sua casa em Seoul, Coreia do Sul por seu agente. O suicídio da estrela coreana reascendeu a discussão sobre a indústria de k-pop, pressão social e cyberbullying.

A Coreia do Sul é um dos países com maiores taxas de suicídio no mundo. Dentro da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), formada por 36 países, a Coreia tem a maior taxa por morte de suicídio; são 28,5 mortes por 100 mil habitantes.

K-idols também fazem parte dessa estimativa. Em 2017, aos 23 anos, Lee Ui Soo, modelo coreano tirou a própria vida. Shawols e fãs de k-pop entraram em luto após a morte de Kim Jong-hyun, vocalista do SHINee. Em 2018, Kim Dong Yoon, rapper do grupo Spectrum, também foi encontrado morto, mas a causa da morte não foi revelada – a autópsia indica que sua morte não foi natural. Goo Hara, ex-integrante do grupo Kara, foi internada após tentativa de suicídio em maio deste ano.

Segundo uma pesquisa feita em 2010 pela atriz Park Jin-hee, 40% dos artistas coreanos sofriam de depressão e 20% já haviam comprado algo para cometer suicídio.

A indústria de música coreana de fato é fatigante. Desde meados dos anos 2000, com a transformação do mercado, milhões de wons começaram a ser destinados a formação de idols. Passar por audições, virar trainee e enfrentar avaliações mensais para quem sabe um dia, debutar estão relacionadas a extrema cultura do esforço coreana.

A nação sul-coreana é pressionada diariamente para alcançar seu potencial máximo todos os dias. Quem não se esforça o suficiente é tachado como inútil. Derivados dessa contínua opressão, a depressão e ansiedade atingem grande parcela da população. A estimativa feita pelo Ministério da Saúde sul-coreano mostra que 90% das pessoas que tentaram suicídio sofriam de depressão ou ansiedade, derivados do estresse. Até pouco tempo esses transtornos não eram tratados como pautas sociais, sendo encaradas como problemas irrelevantes.

Quando finalmente consegue debutar e se tornar um idol, ainda é preciso enfrentar a concorrência extrema entre grupos e empresas, a pressão estética, bullying, hate gratuito... Um passo em falso e a toxidade prevalece.

Como foi o caso de Sulli. A cantora, conhecida por ser independente e empoderada, foi líder do movimento no-bra (sem sutiã) na Coreia do Sul, o que fez com que acumulasse diversas críticas em suas redes sociais. Numa de suas lives no Instagram, acidentalmente, seu peito ficou à mostra e a partir de então o cyberbullying se intensificou.

Segundo o jornal Busan Report, Sulli pedia constantemente que sua empresa, SM Entertainment tomasse providências sobre os comentários maliciosos em suas redes sociais. A resposta foi passiva. Nada foi feito.

Ela não aguentou.

Hoje, o governo sul-coreano discute a importância do combate ao cyberbullying. Um projeto de lei, a Lei Sulli, será apresentado à Assembleia Nacional em dezembro, tendo como objetivo acabar com a cultura desumana que o cyberbullying promove.

O novo relatório publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) mostra que ao redor do mundo uma morte por suicídio acontece a cada 40 segundos. Ao todo são 800 mil pessoas por ano.

Mais do que nunca, precisamos falar sobre isso. Precisamos colocar em pauta a depressão e a ansiedade.

Num mundo em que a concorrência se torna cada vez mais acirrada, em que a solidão prevalece em meio ao caos cotidiano, mostrar ao outro o quão importante ele é já se torna um grande passo. É preciso empatia acima de tudo. Ninguém está sozinho nessa jornada.
 

“Foi um milagre eu ter durado tanto. O que mais posso dizer? Apenas me diga que trabalhei duro. Mesmo que não possa sorrir ao me deixar ir, por favor, não me culpe.
Eu trabalhei duro.
Eu realmente trabalhei duro.
Adeus.
Kim Jong-hyun” – carta deixada por Jong-hyun.

 

REFERÊNCIAS

LIY, Macarena Vidal. Kim Jong-hyun: “Estou quebrado por dentro. A tristeza finalmente me engoliu inteiro”. Disponível em:<https://brasil.elpais.com/brasil/2017/12/19/cultura/1513676012_322016.html>. Acesso em 31 de out de 2019.


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