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01/09/2020 às 22h19min - Atualizada em 01/09/2020 às 22h19min

Jornal A Sirene: uma esperança às vítimas do desastre em Mariana

Veículo criado após o rompimento da barragem do Fundão em Mariana – MG traz informação e empatia aos atingidos

Letícia Agata Nogueira - editado por Luhê Ramos
O dia 5 de novembro de 2015 foi marcante para os moradores de Mariana, região central de Minas Gerais, devido ao rompimento da barragem do Fundão, em que a mineradora Samarco é responsável, a qual está ligada à empresa Vale do Rio Doce e à BHP Billiton. O desastre causou a morte de dezenove pessoas, além da destruição completa de vilarejos e do distrito de Bento Rodrigues. Trouxe impactos socioambientais que chegaram até o Espírito Santo.


 
Como forma de amparar os antigos moradores, ouvi-los e levar informações sobre os desdobramentos, foi criado o Jornal A Sirene. De acordo com Wigde Arcangelo, jornalista responsável pelo veículo, o jornal foi elaborado “como necessidade de os atingidos terem um espaço para falar o que estava acontecendo, contar suas histórias a partir de suas perspectivas”.
 
O jornalista afirma também:

 
“O jornal também, de certa forma, garante que não seja uma memória coletiva no futuro construída apenas pela narrativa das empresas mineradoras e da Fundação Renova, mas também que essa memória futura possa ser construída a partir de relatos, de vivências, de memórias dos atingidos e das atingidas”.
Inicialmente o veículo foi resultado de um trabalho voluntário de profissionais de comunicação moradores de Ouro Preto e Mariana, além dos atingidos. Com o tempo houve a profissionalização do jornal, que contratou uma equipe estruturada, dando início à edição em fevereiro de 2016.
 
O Jornal A Sirene conta com a colaboração do Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal, mas não possui ajuda do governo
 
Segundo Wigde Arcangelo:

 
“Se a gente for pensar no contexto de Minas Gerais, é um contexto de uma economia muito dependente do minério, que a gente costuma chamar de minério dependência. E como o jornal, de certa forma, coloca o dedo na ferida, faz uma crítica a essa forma como a mineração é tratada aqui, não existe tanto esse diálogo, pensando nessa questão dessa minério dependência.”

AS PAUTAS
 
Segundo Wigde, as pautas são discutidas em uma reunião entre os editores chefes, a repórteres e conselho editorial. “As pautas são voltadas para as questões, os desdobramentos desse crime e também o que tange a vida dos atingidos no geral”, afirma o jornalista.
 
O jornal já produziu matérias diversas, como questões da infância, a qual já não é mais como antigamente, volta às aulas, festejos, entre outros. Dessa forma, o veículo possui uma relação com o local atingido, buscando resgatar a memória da vivência da comunidade.
 
AS DENÚNCIAS 
 
Além das histórias, A Sirene também faz denúncias sobre as questões dos atingidos, que já estão ocorrendo na esfera jurídica e sendo tratadas legalmente. Assim, o jornal passa a marcar narrativamente o que está acontecendo, com uma forma de contra narração das propagandas efetuadas pelas mineradoras através dos veículos de comunicação.
 
Widge traz o seguinte exemplo:
 
“Um exemplo foi o corte do auxilio emergencial que a Renova tentou fazer. A Renova tinha como justificativa que as pessoas que teriam o auxílio (AFE) cortado, não necessitariam mais. No entanto, a justiça recorreu logo e a Renova não conseguiu cortar esse auxílio”.

A Sirene fez questão de divulgar esse ponto, pois levam em consideração a importância de ampliar a voz dos atingidos para contar que a justificativa da Fundação Renova não é viável.
 
“A gente está fazendo uma contra narrativa dizendo que embora a Renova diga que isso está resolvido, nós trazemos essas pessoas aqui pra contar que não, que essa narrativa da Renova não é real, ela não se encaixa. Então nossa denúncia também opera nesse lugar”, alega Wigde. 
 
A PANDEMIA
 
A Sirene disponibiliza o conteúdo em seu site, mas também distribui gratuitamente o jornal físico aos moradores. No entanto, com a pandemia de Covid-19, os integrantes do veículo estão trabalhando remotamente e distribuindo o material via PDF para evitar contato físico.
 
Com isso, as entrevistas estão sendo efetuadas via WhatsApp ou telefone. Além disso, o jornal conta com a colaboração dos moradores, que os  enviam fotos sobre determinados assuntos. 
 
“Entrevistamos pessoas, por exemplo, do Espírito Santo, em que nós não temos fotos de arquivo dessas pessoas. Então nós pedimos que elas enviem”, diz Wigde.
 
OS IMPACTOS DO ROMPIMENTO
 
O acidente lançou cerca de 34 milhões de 
mde rejeito de mineração de ferro (mistura composta por óxido de ferro, água e lama não tóxica) no meio ambiente, atingindo rios, córregos e vegetações. O impacto é comparado a 25 mil piscinas olímpicas de resíduos.
 
A enxurrada de rejeitos acabou passando por cima da barragem de Santarém, além de ter provocado a pavimentação de uma enorme área, a qual pode levar anos para a secagem completa, impedindo qualquer tipo de construção no local. Toda vegetação próxima a região foi afetada, juntamente com a Mata Ciliar, que é uma forma de vegetação que acompanha cursos de água e ambientes de drenagem em geral.
 
Horas após o acontecimento, a lama chegou ao Rio Doce, provocando assim o aumento na turbidez da água, matando peixes, devido a falta de oxigênio, e outros animais, além de causar um assoreamento e uma série de outros danos.


 
Devido a grandeza do impacto do rompimento, muitas áreas não poderão retornar ao estado anterior e muitas outras levarão anos para serem reconstruídas. Segundo biólogos, o Rio Doce poderá levar em média 10 anos para se recuperar do grande dano. Muitos pesquisadores acreditam que o nível do impacto foi tão grande, que é impossível estimar um prazo para o reestabelecimento do equilíbrio da Bacia. 

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