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25/10/2021 às 15h09min - Atualizada em 25/10/2021 às 14h44min

Vida e morada de Clarice Lispector na rua Imperatriz do Recife

Entenda um pouco mais sobre a autora ucraniana, de alma nordestina, com Nádia Batella Gotlib.

Vanessa Morais - Revisado por Isabelle Marinho
Nádia Batella Gotlib fala sobre Lispector. (Foto: Reprodução/ Instagram- @nadia_gotlib)
Clarice Lispector foi uma escritora e jornalista brasileira. Sendo de origem judaica e nascendo em 1920 na Ucrânia, chegou ao Recife com cinco anos de idade, fugindo com sua família da Guerra Russa e da perseguição contra os judeus. Hoje é reconhecida como uma das mais importantes escritoras do século XX. Confira abaixo uma entrevista sobre a vida de Clarice com Nádia Batella Gotlib, que é mestre, doutora, professora e especialista em assuntos voltados a autora, lançando vários livros sobre.

Ao chegar ao Brasil, Clarice e sua família tiveram seus nomes mudados. Por que isso ocorreu e como ficaram seus nomes?

Nádia Batella Gotlib: A adaptação dos nomes para o português era bastante comum para todos os imigrantes que chegaram ao Brasil, pois a maioria tinha nomes extremente incomuns. Com exceção de Tânia, a irmã mais velha de Clarice, todos da sua família tiveram seus nomes traduzidos para o português. O pai de Clarice se chamava Pinkos, virou Pedro, a mãe era Mania, passou a ser chamada de Marieta, Léia era a outra irmã de Clarice, passou a ser chamda de Elisa e Haia virou Clarice.

Por que o pai de Clarice resolveu se mudar de Maceió?

Nádia Batella Gotlib: O pai dela não estava muito satisfeito com os negócios em Maceió, então decidiu se mudar para Recife a procura de algo melhor para ele e sua família.

Como foi a questão financeira da família de Clarice?

Nádia Batella Gotlib: A família era muito pobre, passaram fome. A Tânia me contou que não tinha o que comer muitas vezes, eles tomavam suco de laranja aguado e pão amanhecido frequentemente. O pai delas ganhava muito pouco como mascate, vendendo roupas por aí. Clarice passou muita dificuldade em sua infância, desde cedo ela se tornou uma criança muito voltada para as misérias do mundo.

Nádia, quem foi a menina Clarice?

Nádia Batella Gotlib: A menina Clarice foi muito sofredora, como já mencionei antes, ela era uma criança muito voltada para as misérias do mundo. Clarice foi uma menina muito intensa, assim como a Clarice adolescente e a Clarice adulta. A menina Clarice também tinha uma grande tendência a criatividade e, assim, desde novinha escrevia. A menina também sofreu muito com a morte de sua mãe Mania, a mãe de Clarice sofreu violência dos Bolcheviques na Ucrânia, ela teve uma lesão que lhe deixou uma paralisia progressiva. Além de ter sofrido com tudo isso da mãe, ela era bem apegada ao pai, tinha muito orgulho dele, porém sofria muito por ele não ter tido estudo e sofria muito junto com ele.


Em Recife, Clarice escreveu seus contos para um determinado jornal, porém eles nunca foram publicados, por quê?

Nádia Batella Gotlib: Desde muito nova ela era muito criativa, ainda criança em volta dos seus nove anos, ela escreveu para esse jornal. Porém, seus textos não foram publicados, os textos de Clarice eram compostos de sensações e não de fatos, como o jornal.

Quais foram os endereços de Clarice na rua Imperatriz no Recife?

Nádia Batella Gotlib: Na rua Imperatriz, há menção a dois endereços dela. Fui até Recife há alguns anos, percorri a rua da Imperatriz por completa e identifiquei uma das casas onde ela morou. A primeira casa de Clarice é colada a Livraria Imperatriz e de esquina com o rio, no livro em que eu escrevi tem até foto da casa. Agora o outro endereço ficou um pouco incerto, não tem um número específico.

 
Em sua vivência no Recife, o que ficou marcado para Clarice?

Nádia Batella Gotlib: Essa pergunta é tão interessante e até difícil de responder, porque todos os momentos da vida dela foram intensos. Em seus textos autobiográficos, percebe-se que os banhos de mar em Olinda, o Carnaval do Recife, a doença da sua mãe, os 100 anos de perdão em que ela roubava frutas do vizinho, foram alguns exemplos de momentos que ficaram marcados em sua trajetória no Recife. Para Clarice, tiveram outros momentos decisivos também, encontramos em suas cartas, em Berna, uma certa angústia em viver na neve sem ter o que fazer, mas também o caráter, o medo de errar, aquela tentativa de abafar suas emoções. Essas crônicas foram importantes e até angustiantes com essa permanência dela em Berna na época de 1946 e 1949.
 
Um ano antes de sua morte, Clarice recebeu um convite e voltou ao Recife para uma conferência?

Nádia Batella Gotlib: Na verdade foi Clarice que quis voltar ao Recife e por isso aceitou participar da conferência. É curioso o fato de que ela quis voltar ao Recife um ano antes da sua morte, ela teve esse desejo forte de rever sua escola, de voltar ao lugar que foi tão importante para ela, parece até uma premonição, essa coisa eu já vi acontecer com muitas pessoas e com Clarice aconteceu justamente isso. Clarice voltou, fez uma conferência no Bandepe, foi até a praça Maciel Pinheiro, foi até o hotel São domingos onde acho que ela ficou hospedada e depois fez sua revisão do seu mapa de infância, Clarice voltou a todos os lugares em que ela morou na capital. Isso tudo foi muito importante para ela, foi em Recife que ela aprendeu a ler e a escrever, a cidade estava dentro de Clarice, ela sempre falou muito bem da cidade, do seu carinho, da música, da arte e de tudo. Recife sempre esteve no coração dela que sempre se considerou uma nordestina. Essa foi a sua última viagem no ano de 1976, no período seguinte ela faleceu aos cinquenta e seis anos de idade.

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