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04/12/2022 às 16h31min - Atualizada em 04/12/2022 às 15h26min

Catar sediando a Copa do Mundo: o choque cultural e as polêmicas

Enquanto a Copa é um evento que sempre foi marcado por festa, bebidas e comemorações, o Catar é marcado pela violência e intolerância

Ana Lara Venturini - editado por Larissa Nunes
Estádios do Catar. (Foto: Divulgação / Fifa)

Ao pensar em Copa do Mundo, algumas das coisas que vem à nossa cabeça são: festa, bebidas, comemoração, abraços, todo mundo junto. Por outro lado, quando falamos de Catar, lembramos de violência, intolerância e violação dos direitos humanos.


Esses estereótipos se confirmam quando observamos a cultura de ambos e, assim, podemos chegar a uma conclusão: Copa e Catar não combinam.

A Copa do Mundo costuma ser um evento em que os torcedores extravasam suas alegrias e frustrações com suas equipes, bebendo e festejando em locais públicos. Compatibilizar essa característica com as rígidas regras de comportamento do Catar não dará muito certo.

Mas é o que temos para este ano de 2022 em que a Copa do Mundo de Futebol da FIFA está sendo realizada no Catar, um país árabe com uma cultura muito diferente da que estamos acostumados.



 

Cultura do Catar

 

Apesar de ser pequeno em território, o Catar é atualmente o 4º país mais rico do mundo, de acordo com a renda per capita (PIB). Isso se deve, em grande parte, pela exploração de petróleo e gás natural na região e pela concentração da riqueza pelos sheike. Seu governo é uma monarquia absolutista e constitucional e tem a mesma dinastia no poder desde 1825. Por ser um país de religião muçulmana, tem como base a cultura islâmica, mais conservadora sob a perspectiva ocidental. 

 

O Catar é um país bem preconceituoso por conta de sua cultura ser uma monarquia absolutista e pelo islamismo ser bem conservador. Lá, as mulheres tem poucos direitos e precisam de autorização do marido ou pai para fazer basicamente qualquer coisa. Também existem restrições rigorosas sobre roupas, demonstrações de afeto em público, consumo de álcool e comportamento, algo muito controverso para um país que vai sediar a Copa do Mundo.



 

Ao sediar a Copa do Mundo e entender que muitos estrageiros irão visitar o país, apesar de dizer que a escolha da vestimenta é livre, é esperado dos visitantes que usem roupas que cubram ombros e joelhos em locais públicos, e é expressamente proibido retirar a camisa nos estádios, imagem comum em eventos do tipo.

 

Além disso, o álcool não é parte da cultura local, mas os turistas que quiserem poderão ter acesso a bebidas alcoólicas em alguns poucos lugares licenciados. O consumo em público e dentro dos estádios é proibido.

 

Relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo são ilegais no Catar, com punições que variam de multas à pena de morte. Em uma entrevista exibida na televisão alemã, o Embaixador da Copa do Mundo Khalid Salman afirmou que homossexuais serão “tolerados”, “mas eles têm que aceitar nossas regras”, completou ele. O embaixador também se referiu a homossexualidade como doença mental sendo um "dano na mente".

 

As autoridades da Copa do Mundo, no entanto, disseram que "todos são bem-vindos" para visitar o país para assistir aos jogos e disseram que ninguém será discriminado. Mas, quando observamos os últimos acontecimentos, não é bem o que percebemos. 

 

Por exemplo, dois torcedores alemães foram parados e solicitados por autoridades de segurança no Catar a remover os itens coloridos que usavam com as cores do arco-íris, um símbolo do orgulho LGBTQIA+.

 

Outro caso foi o de um jornalista brasileiro que estava com a bandeira do estado de Pernambuco, que possui um arco-íris, e foi tomada após ser confundida com apoio a luta LGBTQIA+. O jornalista relata que precisou apagar o vídeo de abordagem para ter o celular devolvido, mas outras pessoas filmaram a ação, que mostra homem com farda policial analisando bandeira. 

 


Qual o problema em mostrar a bandeira do arco-íris no Catar? (Vídeo: Reprodução / Instagram @amandanoventa)
 


 

Ambos os casos aconteceram após o ínicio da Copa em novembro, o que mostra que a discriminação claramente acontecendo durante o evento. Vale lembrar que todas as flexibilizações nas restrições são temporárias e vigentes apenas enquanto a Copa estiver acontecendo, após seu término, voltarão a ser seguidas rigidamente.

 

O Catar também já sofreu denúncias pelo trabalho escravo nas construções necessárias para a Copa, com pagamentos insuficientes para a sobrevivência e sem garantia trabalhistas segundo a lei. Além disso, alguns relatórios dizem que mais de 6 mil trabalhadores imigrantes morreram nas construções. Outra situação que mostra a violação dos direitos humanos no país.

 

A escolha da sede

 

Além das polêmicas de intolerância, também rolam polêmicas de corrupção. A realização do Mundial no Catar é marcada por fatores extracampo, envolvendo tanto o governo local quanto escândalos de corrupção na Fifa.

 

O Catar foi escolhido em 2010 para realizar o Mundial de 2022, ao vencer uma disputa contra Estados Unidos, Japão, Coreia do Sul e Austrália. Pporém, anos depois, foi revelado pelo jornal inglês The Sunday Times a compra de votos para a definição da sede. A investigação revelou que o Catar pagou US$ 880 milhões (R$ 3,4 bilhões) à FIFA para ser o país sede da Copa do Mundo de 2022. O presidente da Fifa na época, Joseph Blatter, chegou a ser banido do esporte por casos de corrupção.

 

 

A escolha do Catar foi, obviamente, motivada por dinheiro, e a FIFA se posiciona apenas quando a convém. Países árabes como Catar, com fundos nacionais se misturando com o dinheiro das famílias que estão no poder, investem no esporte como forma de exercer poder internacionalmente. Foi assim que surgiu o termo “sports washing”.

 

Sportswashing é a junção de duas palavras inglesas — sport (esporte) e washing (lavar) — e tem como significado a manobra utilizada por governo autoritários ou ditatoriais de usarem o esporte como uma ferramenta para “limpar a imagem” perante a população ou comunidade internacional.

 


 

Historicamente, a postura da FIFA sempre foi de omissão. Ela nunca se opôs a sediar seu principal torneio em países que viviam ditaduras, guerras ou que violassem direitos humanos, independente da região em que estas Copas foram sediadas, como aconteceu ao aceitar sediar a Copa no Governo de Mussolini em 1934, e na ditadura argentina de 1978.

 

“Tem duas trilhas para seguir: a legítima, que é essa de expandir o alcance da Copa do Mundo, e a que é dos esquemas de corrupção. Às vezes, elas caminham lado a lado”, afirma o professor de Relações Internacionais José Antônio Lima, especializado em Oriente Médio, da Universidade Rio Branco.

 

Alguns analistas defendem que sediar a Copa no Catar é uma forma de ajudar o país a se abrir e promover mudanças. No entanto, com a Copa já acontecendo e com os diversos casos de intolerância sendo observado, é preciso refletir se essa realmente foi a escolha correta visto que a inclusão não está sendo praticada e o pouco de flexibilização que está tendo será cortado após o fim do evento. 

 

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