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13/03/2023 às 02h17min - Atualizada em 13/03/2023 às 00h56min

"Pearl": terror slasher com ar de fantasia musical

Filme de Ti West é elogiado pelo público e pela crítica, mas fica fora do Oscar 2023

Giulia Mignone - Revisado por André Pontes
Pôster de divulgação de "Pearl". (Foto: Reprodução / A24).

O Dolby Theatre em Los Angeles, que recebeu a cerimônia do Oscar 2023 no dia 12 de março, tem capacidade para 3.400 pessoas. Ainda assim, Ti West e Mia Goth não estavam na lista de convidados. Seu trabalho em “Pearl”, repetidamente elogiado por crítica e público, não foi suficiente para caírem nas graças da Academia. O motivo provável: trata-se de um filme de terror. Pelo menos, foi o que disse Goth em entrevista ao site AdoroCinema. “Acho que o preconceito [com o terror] vem de um grupo muito seleto de pessoas no topo de algum tipo de sistema”, afirmou. “Eles que determinam o que é considerado aceitável e o que não”.

 

Lançado em 2022 nos Estados Unidos pelo estúdio A24, “Pearl” chegou aos cinemas brasileiros em 9 de fevereiro deste ano. O longa de terror, dirigido por Ti West, é um prólogo do último filme do cineasta, “X - A Marca da Morte” (2022). Dessa vez, no entanto, West divide os créditos do roteiro com Mia Goth, que estrela ambas as produções. A atriz também está confirmada para protagonizar o terceiro filme da série, “MaXXXine”, com estreia prevista para 2023.

 

Em “X”, um grupo de atores e produtores se hospeda em uma fazenda no Texas para gravar um filme erótico. As filmagens vão bem até que os proprietários do local, um casal de idosos na faixa dos 80 anos, começam a assassinar brutalmente cada um dos jovens. Se “X” mistura suspense, matança e erotismo com uma estética cinematográfica dos anos 70, “Pearl” apresenta um tom diferente, mas completamente perturbador.

“Pearl” se passa décadas antes dos acontecimentos retratados em “X”, em um Texas do ano de 1918, no final da Primeira Guerra Mundial e no auge da pandemia da Gripe Espanhola. O filme conta a história de quando a personagem-título Pearl, a psicopata anciã em “X”, ainda era jovem e obcecada por se tornar uma dançarina famosa. Com seu marido na fronte de batalha, Pearl vive na fazenda da família, onde trabalha diariamente e cuida de seu pai, em estado vegetativo. A jovem é constantemente humilhada pela mãe, uma mulher amarga e controladora, que procura a qualquer custo destruir seu sonho de estrelato hollywoodiano. Presa entre a frustração da fantasia e a realidade árida, ela tenta achar seu caminho para o sucesso enquanto abraça seus instintos assassinos.


Análise

Desde o começo de sua carreira, Ti West se destacou no cinema de gênero, seja no thriller de pânico satânico (“A Casa do Diabo”, 2009), no de casa mal-assombrada (“Hotel da Morte”, 2011), no found footage (“O Último Sacramento”, 2013) ou no faroeste ultraviolento (“No Vale da Violência”, 2016). Contudo, “X - A Marca da Morte” se tornou um divisor de águas em seu trabalho. Adentrando ao subgênero slasher, foi na colaboração com Mia Goth que o diretor parece ter encontrado sua maestria e sua musa. E o estreitamento dessa parceria só deu mais profundidade à obra, fazendo de “Pearl” o espetacular prólogo que supera o original. 

O filme apresenta uma história de origem macabra, em uma espécie de “jornada do vilão”. O mais impressionante é o uso de influências da Hollywood clássica em contraste com a narrativa da vida autodestrutiva de uma jovem, em uma espiral de ódio e loucura que culmina em um surto psicótico. Trabalhando em conjunto com o diretor de fotografia Eliot Rockett, Ti West usa uma estética technicolor, com cores vivas e tons saturados, que lembra os filmes dos anos 1950 e 1960. É como assistir a uma versão sangrenta e distorcida de “O Mágico de Oz” (1939), inclusive com referências diretas à obra.  


Mas o que realmente coroa o filme é a interpretação de Mia Goth no papel principal. "Goth transcende todos os limites", elogiou o jornal New York Times. “É absolutamente tremenda”, emendou o britânico Telegraph. O jornal The Guardian também comentou: “leva sua performance para o próximo nível: Goth é agora a Judy Garland do horror”. A atriz vive Pearl de uma forma caricata e expressiva, mas ainda assim minuciosa e profundamente triste. A abordagem é emocional: o trágico alimenta o insano. É impressionante como Goth desenvolve o arco narrativo de frustração da personagem e sustenta-o durante o monólogo de quase oito minutos no final do filme. Mia Goth deixa o telespectador dividido entre o desprezo e a empatia por uma personagem em quem o mal está inegavelmente intrínseco, o que o filme faz questão de mostrar. Pearl é cruel e sente prazer em matar.
 


Repercussão
 

Misturando horror, sarcasmo e humor ácido, o filme é mais do que assustador, é agoniante. Um musical traduzido em terror psicológico, que conquistou não só o público, mas também a crítica. Exibido no Festival de Toronto em 2022, “Pearl” já arrematou indicações e prêmios como o Sitges Film Festival, o Sunset Circle Awards e o Independent Spirit Awards. Além disso, têm uma taxa de aprovação de 90% no Rotten Tomatoes, com uma classificação média de 7,7. Até Martin Scorsese admitiu ter ficado “fascinado e depois perturbado” ao assistir ao filme. 

 

Não é de se espantar que a não indicação de “Pearl” ao Oscar 2023 tenha enchido as redes sociais com mensagens de revolta, com o nome de Mia Goth indo parar nos trending topics. Para muitos, a produção merecia ser indicada a alguma categoria do Prêmio, principalmente pela atuação de Goth. Em entrevista dada ao site Omelete, a atriz afirmou que “é uma questão de tempo até que as pessoas responsáveis por esse circuito de premiações acordem e percebam o quão valioso este gênero [terror] é para o cinema”.

 

Apesar de o terror nunca ter sido um "queridinho" das premiações, 18 filmes do gênero já chegaram a vencer algumas categorias em edições anteriores do Oscar. Os mais recentes foram “Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet” (2007) em Melhor Direção de Arte, “Cisne Negro” (2010) em Melhor Atriz, para Natalie Portman,  e “Corra!” (2017) em Melhor Roteiro Original. Ainda assim, considerando que a premiação foi criada em 1929, a Academia desenvolveu a fama de esnobar produções de terror. Nos últimos anos, houve protestos de fãs pelos casos de Toni Collette, por sua atuação em “Hereditário” (2018), e Lupita Nyong'o, pelo trabalho em “Nós” (2019). Agora, Mia Goth também pode entrar nessa lista. 

Confira o trailer abaixo:


Trailer Oficial de "Pearl". (Reprodução/ A24/  YouTube)

 
 

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