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03/04/2019 às 22h00min - Atualizada em 03/04/2019 às 22h00min

“Na hora da comemoração já estava arrependida, queria estar em casa”, conta Eva Pessoa sobre seu Réveillon

Enquanto a depressão clínica pode acontecer em qualquer época do ano, ansiedade, estresse, angústia e o estado depressivo atingem inúmeras pessoas entre os meses de novembro e janeiro

- Cíntia Aguiar
Reprodução/Google Imagens

Árvores de Natal, luzes espalhadas pelas fachadas das casas, shoppings decorados, músicas natalinas tocando em todos os cantos da cidade, reunir a família, colocar a conversa em dia, chamar os amigos para a ceia. Para muitos, essa época do ano é sinônimo de alegria, comunhão e celebração. Para outros, ficar em casa sozinho é o único plano. Sentir tristeza durante o período de festividades é mais comum do que se imagina.

 

Muitos fatores podem desencadear a depressão de forma mais assertiva, como o isolamento social ou uma lembrança dolorosa. Para a psicoterapeuta Suzanne Rocha, as festas de final de ano podem trazer um certo saudosismo e melancolia, por representarem o fechamento de um ciclo. “A ideia de fechar para balanço e ver o que foi alcançado ou não naquele período pode acarretar um quadro depressivo”.

 

Isolamento social

 

Muitas pessoas fogem do convívio social, como Eva Pessoa, 25 anos. A relação difícil com o pai desde a infância contribuiu para o seu isolamento. Não se sentia parte de nenhum grupo na escola e isso acabou contribuindo ainda mais para seu comportamento. Eva relata que datas comemorativas em geral nunca foram agradáveis.

Enquanto os outros se programavam para ver qual roupa usar, e onde iriam passar, eu só conseguia me ver no mesmo lugar: em casa, sozinha”. Em várias ocasiões passou seu Réveillon trabalhando ou muito triste por uma perda. Quando decidiu celebrar, diz que se arrependeu. “Na hora da comemoração já estava arrependida, queria estar em casa”.

 

Memória afetiva

 

Há situações em que pessoas trazem da infância o gosto ou a aversão às festas de fim de ano. Juliana Aguiar, 37 anos, conta que em sua casa, durante sua infância, não haviam comemorações. Para ela, as pessoas hoje em dia não dão importância ao verdadeiro significado da data. “Ficam, realmente, muitos traumas do passado, muita coisa ruim que a gente viveu na nossa infância. Mas isso mudou, graças a Deus a gente já fez muita coisa diferente. Mas eu não quero, porque todo mundo compra roupa nova, não quero ter essa obrigação de comprar também. Porque todo mundo vai pras festas na virada do ano, eu não quero ter essa obrigação de ir também”, relata Juliana.

 

A psicóloga Suzanne Rocha afirma que pessoas que enfrentam a depressão podem ter crises mais frequentes devido às lembranças e simbolismos que o período trás. Muitos se recordam de pessoas queridas que se foram, ou de eventos traumáticos que aconteceram. “Para outros é muito exaustivo ter que estar entre pessoas, é como se ela tivesse sempre que dispender muita energia para se relacionar”.

 

Por outro lado, o trato positivo com as celebrações também podem acontecer na infância. Beatriz Castro, 24 anos, relata que, durante esse período, seus pais faziam questão de manter as tradições. Montavam árvore de Natal todos os anos, sua mãe costumava colocar músicas natalinas para tocar, abriam presentes embaixo da árvore, escrevia cartas para o Papai Noel e esperava ansiosamente pelos presentes.

 

“Minha mãe e meu pai trabalhavam isso em mim e no meu irmão. Meu pai às vezes se vestia ou às vezes só calçava o coturno e batia a bota pra sinalizar que ele tava alí, que a gente não podia sair, porque não podia ver o Papai Noel”. Mesmo após situações difíceis, seu gosto por essa época do ano não foi afetado negativamente. “Quando meus pais se separaram, minha mãe não deixou o espírito natalino morrer. Ela continuou enfeitando a casa, colocava música. Apesar da ausência do meu pai, essa coisa do Natal, pra mim, sempre foi muito importante.”

 

Idealização

 

Há também quem ame as festas, apesar de nunca ter sido estimulado. Henrique Soares, 25 anos, conta que nunca ligou para festas de família. “Sabe aquela família que você só vê no final do ano? Minha família é pequena, era muito ruim. Por isso quando penso em Natal, minha família não passa pela minha cabeça.

 

Para Henrique, seu sentimento pelo Natal é por causa de algo idealizado e não vivenciando. “Eu acho muito lindo, mas é porque cresci vendo filme. Tudo pra mim é filme. Por isso que quando penso em Natal, vem neve, amor, casais se beijando… Coisas que vi em filmes. Minha família é meio que cada um por si, não tem uma tradição. Eu já acho lindo. Meu sonho é passar o meu Natal em Nova York”.

 

Cuidados

 

O tratamento adequado da depressão envolve um acompanhamento psicológico, por meio do psicodiagnóstico e da psicoterapia, que auxiliam a pessoa no desenvolvimento de recursos emocionais para o enfrentamento das situações do cotidiano. A psicóloga Suzanne Rocha alerta que também é importante o acompanhamento com um psiquiatra, pois o tratamento medicamentoso auxilia no controle das crises e sintomas da depressão.

 

Com relação às comemorações de fim de ano, a psicóloga afirma que “a sensação de que as coisas não saíram como deveriam, que poderia ter sido melhor e a necessidade de planejamento para o ano seguinte, pode tanto desencadear uma crise para quem já vem passando por um processo de sofrimento, quanto trazer um estado de melancolia e tristeza que pode ser passageiro”. Em ambos os casos, é possível buscar ajuda profissional. Suzanne diz acreditar que espaços de debate e exposição do assunto são muito importantes para a conscientização da própria população.

 

Dados da Pesquisa Mundial sobre Saúde Mental, divulgados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), calculam que cerca de 400 milhões de pessoas no mundo sofram de depressão. As estimativas feitas pela OMS são de que, em 2030, esse mal seria responsável por 9,8% do total de anos de vida saudável perdidos para doenças. Em 2010 esse número foi alcançado, duas décadas antes do previsto.


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