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12/08/2022 às 13h35min - Atualizada em 12/08/2022 às 13h18min

Pessoas negras possuem 4,5 vezes mais chances de sofrer abordagem policial, diz pesquisa

Relatório mostra relação entre procedimentos policiais e racismo

Stefane Amaro
Relatório "Por que eu?" mostra violência policial sofrida por pessoas negras. Reprodução/Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)

“Nós precisamos entender que o racismo é um problema de segurança pública”. A afirmação é de Igue Lua, mulher negra e advogada atuante na área da família e no combate ao racismo. Essa fala vai ao encontro do relatório “Por que eu?”, do Data Labe, sobre a relação entre abordagens policiais e racismo.

 

A pesquisa, que contou com 1.018 respondentes válidos para os estados do Rio de Janeiro e São Paulo, mostrou que pessoas negras são mais abordadas pela polícia: do total de respondentes que já foram abordados, 80% são negros (Figura 1). Igue Lua afirma que isso acontece mesmo que não existam indícios de que pessoas negras cometam mais crimes do que brancos.

 

Figura 1: Reprodução/data_labe.

 

O estudo também mostrou que, entre as pessoas que relataram terem sido abordadas mais de 10 vezes na vida, negros representam 20%, enquanto brancos são apenas 8,3% (Figura 2). Um outro ponto abordado é a menção à raça/cor durante a abordagem policial: dentre aqueles que já foram abordados, a menção expressa à raça/cor por policiais é significativamente mais frequente quando o alvo da abordagem é uma pessoa negra (Figura 3).

 

Figura 2: Reprodução/data_labe.

 

“Infelizmente nós utilizamos a palavra 'comum' porque de fato é comum vermos casos de abordagens truculentas, violentas, com abuso de poder, né? Negros são de fato maiores vítimas de agressões por parte da polícia do que os brancos”, afirma Igue. A advogada explica que nos últimos quatro anos, em específico no período da pandemia, houve por parte da polícia uma violação de tratados internacionais e a Declaração Universal de Direitos Humanos.

Os abusos foram tantos que a ONU enviou uma carta ao governo brasileiro alertando sobre a situação de violência policial que o Brasil se encontra, principalmente contra negros”.

Figura 3: Reprodução/data_labe.

 

Relação é histórica
 

Tanto para Igue Lua, quanto para José Ricardo, homem negro e advogado de Direito de Família e crimes que se relacionam com o Direito de Família, a associação entre racismo e abordagens policias é histórica. “O Brasil foi um dos últimos países a abolir a escravidão e deixou essas pessoas a mercê da própria sorte. Fazendo com que cada um buscasse maneiras de sobrevivência pra tentar viver e isso traz aí até o dia atual”, afirma o advogado. 

 

Igue também relaciona o fato ao contexto da abolição. Ela explica que, no momento em que negros estavam libertos, houve uma tentativa de embranquecimento da população, “tomando suas possibilidades de crescimento e desenvolvimento, colocando-os em situação de fato de marginalização”. Ainda nessa conjuntura, “a polícia tinha a função de controlar as pessoas em situação de vadiagem e naquela época as pessoas nessa situação eram os negros libertos. A população negra era vista como perturbadora da ordem pública”, enfatiza a advogada.

 

Guerra contra as drogas

 

José Ricardo chama a atenção para o papel da guerra contra as drogas nesse contexto, que se relaciona à grande parte dos crimes no Brasil hoje. Segundo ele, “existe uma sutileza nessa questão porque como você qualifica uma pessoa entre usuário e traficante? Então até mesmo na abordagem policial eu costumo dizer que o policial é o primeiro juiz. Porque é na abordagem policial que o policial vai decidir se aquela pessoa cometeu um crime e se cometeu o crime, qual tipo de crime cometeu”.

 

Falha ou projeto de poder?

 

“Eu vejo assim bem claro esse projeto de poder, tanto em falhas que devem ser de alguma forma estudadas, superadas, trabalhadas e revisadas para que não aconteçam ou se aconteçam sejam mínimas possíveis, né? Assim como também a questão desse plano de governo para exterminar essa população [negra]”, diz o advogado.

 

Para Igue, o Brasil é um país com histórico de violência policial. “Nós tivemos uma divulgação no Anuário de Segurança Pública de uma redução de 4% na taxa de pessoas mortas por agentes de segurança em 2021. Aí você me pergunta: Igue, mas não é motivo de celebrar, de comemorar? Veja bem, como que nós vamos comemorar se em contrapartida tivemos um agravamento do racismo institucional?”, questiona ela.

 

Educação e políticas públicas

 

Igue Lua afirma que a única forma de enfrentar essa problemática em torno do que é a "letalidade da polícia”, é através de políticas públicas efetivas voltadas para segurança pública. José Ricardo também destaca a importância da educação nesse combate. O advogado afirma que “não são todas as pessoas que são corruptas, mas existem e é a partir desse pressuposto dessas pessoas existirem que a gente tem que ver o que fazer, como agir, qual a forma de atuação que a gente tem que fazer, como coletividade, como sociedade, como política, né? De impedir que esse tipo de prática abusiva venha a acontecer".
 

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