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27/08/2020 às 15h22min - Atualizada em 27/08/2020 às 14h57min

Da popularidade ao esquecimento em massa: será que a cultura emo ainda existe?

Os estereótipos que fizeram com que o gênero fosse associado a uma imagem no início dos anos 2000, reverberam até hoje.

Letícia Gouveia Veras - Revisado por Renata Rodrigues
Esteriótipo de grupo Emo. Foto: Divulgação
Há mais ou menos 15 anos, era moda entre os jovens usarem roupas pretas, franja, lápis de olho preto e tênis colorido, além de chorarem ao ouvirem músicas românticas. O movimento emo tinha explodido no Brasil.

Gênero musical nascido nos Estados Unidos nos anos 80, o Emocore, vertente do Punk, Hardcore e Post-Hardcore, se popularizou mesmo lá para os anos 1990, com a ascensão na mídia de bandas como Fall Out Boys, My Chemical Romance e Panic! at the Disco. No Brasil, o estilo chegou em meados dos anos 2000.




Inicialmente, no Brasil, nem mesmo as bandas consideradas emo sabiam o que isso significava. O novo estilo era muito confundido com outras vertentes das músicas punk/rock, e circulava num meio mais underground (independente). Porém, do ano de 2005 em diante, a mídia começou a dar mais visibilidade a esse estilo. Bandas como Fresno, NxZero e CPM 22, tornaram-se populares no país, recebendo bastante atenção do mainstreaming (principais meios de comunicação) que adoravam falar do novo fenômeno entre os jovens: o movimento emo.

“Saiu aquela matéria do Fantástico (2005) sobre Emocore e pronto, todo mundo acha que é só ter franja na cara, um monte de piercing, viver grudado na sua chapinha e é isso; essa é a estética e acabou. Tem pessoas que seguem essa estética até hoje, mas tem pessoas que seguem pegando alguns elementos e tudo bem. Eu acho que ele [o movimento emo] é muito mais diverso do que isso”, conta Luíza Freitas, estudante de história que aprecia o emo e sua estética.




As bandas tocavam na extinta MTV, emissora de TV muito popular entre os jovens da época, e faziam bastante sucesso. Mas o emo foi tão carregado de estereótipos e comumente associado a sexualidade masculina que quase nenhuma banda realmente se assumia emo. O preconceito existia tanto com as outras vertentes do rock, que condenavam os emos, quanto com as próprias bandas do movimento, que não queriam ser associadas ao estilo.

O que poucas pessoas sabem é que o estilo musical Emocore realmente não pertencia as várias bandas que eram associadas. Esses grupos pertenciam mais a estética emo que foi vendida pela mídia do que ao gênero musical. Essa confusão é uma das razões para que o movimento sofresse com os estereótipos estéticos e quase não fosse falado das questões musicais do Emocore.

É isso que argumenta Victoria Baptista, formada em audiovisual e estudante de Rádio, TV e Internet. A jovem, de 23 anos, se considera apreciadora do emo, mas não ligada aos estereótipos e a estética que este termo é associado.

“O emo surgiu lá nos anos 80 e até o começo dos anos 2000 as bandas não tinham essa estética, eram pessoas normais, se vestiam normal, apenas tocando e cantando musicas mais emotivas, com letras melancólicas, sobre temas existenciais. E aí, no início dos anos 2000, surgiram umas outras bandas que começaram a tocar na MTV e faziam mais sucesso em relação a essas dos anos 1980 e 1990. E a partir daí surgiu o movimento estético emo junto com essas outras bandas, que muitas pessoas dizem ser emo, mas que na verdade não são. My Chemical Romance, Paramore e Panic! At the disco não se classificam como gênero musical emo. Claro que tem muitas músicas que falavam sobre tristeza e emoções, mas não classifica como o gênero musical porque é algo mais comercial, como rock alternativo, eu classificaria assim”, argumenta Victoria.




Já o designer Lucas Ferreira acredita que o gênero é mais fluído e acabou incorporando diferentes referências. “Acho que o que acaba definindo o emo é a questão da introspecção nas letras, porque a sonoridade meio que se juntou com tudo: pop, metal, jazz e por aí vai. Pra mim, o movimento emo está mais no ideal. Acho que surgiram vários movimentos estéticos e musicais que se apropriavam desse ideal mais introspectivo, de falar mais sobre sentimentos e angústias da vida. Talvez ali nos anos 2000 a galera do pop punk tenha emplacado uma diretriz da estética emo, que acabou se ramificando entre a estética indie e a estética scene – ambas mais coloridas que o emo, mas bem distintas uma da outra. Daí, acho que hoje ainda existem influências disso, mas nada que seja determinante como estética – seja visual, como sonora”, opina.

O termo era visto como pejorativo por estar associado a estigmas pré-definidos e a homofobia. Homens emo ouviam muitos comentários relacionados a sexualidade, dizendo que estes meninos mais sensíveis, que choram, usam roupas coladas, alisam a franja, passam maquiagem e fazem parte do movimento emo são, necessariamente, gays.

O documentário “Nem tudo que acaba tem final – o relato do Emocore no Brasil” também evidencia a questão da estigmatização do movimento emo no cenário brasileiro. Diferentes estilos que caminhavam pelo hardcore melódico e outras vertentes receberam a mesma classificação. Restart, Cine, Strike, Fresno, CPM 22, Hateen, NX Zero, todas foram consideradas emo, seja pela estética ou pelo som, mesmo sendo bandas muito diferentes entre si.



“Eles não eram fãs de um estilo musical, eles eram fãs de um conceito” opina no documentário a radialista Daniele Taranha. Para ela, algumas bandas tinham um apelo visual muito forte e era o que os jovens procuravam, pois tinham essa necessidade de identificação e de fazer parte de um grupo, de uma tribo. Foi isso que o emo se tornou para muita gente.

Grandes empresários e gravadoras se aproveitaram disso para firmar contrato com bandas emo, o álbum era todo pensado para ser comercializado, além do estilo emo que deveria estar presente na aparência e identidade visual das bandas. Mas do mesmo jeito que entrou em ascensão, o movimento saiu da mídia e outros estilos entraram no mesmo ciclo do reconhecimento nacional, como o funk e o sertanejo. 

O gênero emo voltou a circular de maneira mais independente. Em 2010, o Emo Revival buscava resgatar as origens do nascimento do estilo, nos anos 1980, antes de ele se popularizar com a parte estética.

“Dá pra considerar três movimentos, o movimento estético, o movimento musical e o movimento da galera que se sente emo, mas não usa o estilo e também não ouve a música. Eu acredito que o emo em si, o emo de verdade, é um estilo de vida”, revela Jean Tavares Lopes, integrante da banda emo chamada Ash Fall. As músicas mais melódicas e que expressam sentimentos ainda são muito presentes para aqueles que curtem o estilo musical. A cultura emo se mantém viva porque ainda existe um público que 
não se importa com o que toca na mídia e se identifica com o movimento.
 
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