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18/06/2022 às 16h02min - Atualizada em 13/06/2022 às 17h15min

Pioneiras do movimento Impressionista abandonadas pela história

Mulheres que transmitiam uma emoção revolucionária, muitas vezes desconhecida pelos homens.

Bárbara Campelo - Revisado por Vanessa Kelly
O jogo de esconde esconde - Berthe Morisot, 1873. Suas obras eram ligadas à maternidade e a sensibilidade feminina, trazendo a imagem da mulher em uma acentuada presença psicológica. (Foto: Reprodução/ WahooArt).


No fim no século XIX, na França, ocorreu o início do movimento Impressionista, que trazia a quebra das formas clássicas em suas expressões artísticas. Com pinturas passando a transmitir cenas exteriores, com uma temática contendo pessoas humildes, natureza e paisagens em suas obras.

Refletindo nas esculturas, músicas, rompendo padrões e trazendo o novo, diante de uma sociedade enraizada em costumes e desigualdades moralmente impostas, sendo considerado o marco inicial da arte moderna.

Quando o movimento é citado, o que é relatado são nomes masculinos, como Claude Monet, Edgar Degas, Édouard Manet, entre outros. Transmitindo a ideia de que essa evolução nas expressões artísticas, foi feita apenas por homens.

Entretanto, há mulheres no movimento que enfrentaram as dificuldades de uma época extremamente rigorosa, onde era limitado obter educação artística ou algo semelhante, sendo vistas apenas com a capacidade de servir ao que foram moldadas e como uma ameaça, caso expandisse seu lado intelectual, recebendo desprezo de seus trabalhos pelo cânone histórico.

Ainda assim, exploraram seus limites com obras introspectivas que tratavam de suas condições sociais, fazendo o crítico Henri Focillon, em 1894, destacar três delas como “Les Trois Grandes Dames” (As Grandes Damas) do movimento: Berthe Morisot, Marie Bracquemond e Mary Cassatt.

Berthe Morisot foi uma artista francesa e uma das pioneiras do movimento. Nascida em 1841, de família burguesa, sempre esteve envolvida com a pintura, junto a sua irmã Edma, por causa da educação que as mulheres recebiam, sendo permitido apenas pinturas que eram consideradas para mulheres.

Por querer se aprofundar mais na área, Berthe e sua irmã frequentavam o Museu do Louvre, onde chegou a trabalhar de copista. Conheceu alguns incentivadores, dentre eles Henri Fatin-Latour, que estimulou o aperfeiçoamento de seus estudos, Jean-Baptiste-Camille-Corot, pintor realista que incentivou as pinturas naturalistas ao ar livre e Édouard Manet, que gostou tanto de suas obras, que a chamou para o grupo de pintores, que logo após passou a ser o grupo Impressionista.

Tornaram-se amigos e admiradores mútuos. Morisot mesmo antes de entrar para o grupo, havia obras bastante inovadoras da mulher moderna. Com pinceladas soltas e ousadas, desenvolveu uma capacidade singular e profunda de passar sua visão pictórica da vida real para o quadro. 

Tinha como foco,  mulheres e crianças representadas no interior doméstico e ao ar livre, como se estivessem a descobrir algo. Isso fez com que se tornasse a figura central do grupo e reconhecida pela imprensa no ano de 1870, pela sua notoriedade. Mas, seu registro inovador era visto como resultado de uma 'visão feminina' e de seus colegas homens, eram eleitos como autênticos.

O Berço, 1872. Berthe transmite ao pintar sua irmã com sua sobrinha, Blanche, uma ambiguidade na obra, uma mãe e seu bebê, doçura ou exaustão materna?

O Berço, 1872. Berthe transmite ao pintar sua irmã com sua sobrinha, Blanche, uma ambiguidade na obra, uma mãe e seu bebê, doçura ou exaustão materna?

(Foto: Reprodução/ WikiArt).































O Berço, 1872. Berthe transmite ao pintar sua irmã com sua sobrinha, Blanche, uma ambiguidade na obra, uma mãe e seu bebê, doçura ou exaustão materna? (Foto: Reprodução/ WikiArt)

Em 1874 casou com Eugène Manet, pintor e irmão de Édouard, e nesse mesmo ano ela participou da primeira exposição Impressionista com nove obras. Cinco anos após, deu à luz a sua única filha, Julie Manet, que foi inspiração de muitas obras suas, de Édouard e de Renoir.

Suas obras ganharam inspirações do Rococó, em 1880, pegando aspectos e transmitindo de forma moderna, podendo ser observado na pintura Diante do Espelho (1890). Porém, foi com o conceito de "acabado" e "não acabado" que ela demonstrou quão destemida era diante de um quadro e de sua habilidade.


Diante do Espelho, 1890. Tons pastéis e representação da sensualidade feminina, foram o resultado de Rococó em suas pinturas, transformando uma mulher seminua de algo libidinoso a uma exibição de técnica e cor.

Diante do Espelho, 1890. Tons pastéis e representação da sensualidade feminina, foram o resultado de Rococó em suas pinturas, transformando uma mulher seminua de algo libidinoso a uma exibição de técnica e cor.

(Foto: Reprodução/ De Anima Verbum).































Berthe perdeu seu marido em 1892 e três anos depois, com 54 anos, na cidade de Paris, ela faleceu devido a uma pneumonia que adquiriu quando cuidava de sua filha, também doente.

Em vida, nunca parou de pintar e deixou cerca de 800 obras como
O Berço (1872) -sua obra mais famosa- O Porto de Lorient (1869), O Jogo de Esconde-Esconde (1873) e Dia de Verão (1879). Foram vistas em exposições Impressionistas até 1886, sendo ao mesmo tempo esposa, artista e mãe.

Mulher desbravadora parada pelo machismo  

Marie Bracquemond, por não ter os mesmos recursos financeiros que seus colegas para difundir sua criatividade e o comércio, instigou o modo autodidata para aprender e aperfeiçoar, usando como sua fonte oficial de educação artística, o pintor Jean-Auguste-Dominique Ingres, que a convidou para estudar.

Apesar da influência de Ingres, Marie sai do estúdio deixando escrito que o artista "duvidava da coragem e perseverança de uma mulher no campo da pintura…Ele lhes atribuía apenas pintura de flores, de frutas, de naturezas-mortas, retratos e cenas de gênero."

No Terraço Em Sèvres, 1880. Ela explorava as telas com o uso de cores vibrantes, efeitos de luz através dos tecidos e sobre eles.

No Terraço Em Sèvres, 1880. Ela explorava as telas com o uso de cores vibrantes, efeitos de luz através dos tecidos e sobre eles.

(Foto: Reprodução/ Arte e Bagagli).

 

Os Impressionistas ficaram tão atraídos com suas amplas apresentações vívidas, que a convidaram para expor com eles em Paris, apresentando-se somente três vezes, sendo forçada a deixar a pintura pelo marido, o pintor e gravador francês, Félix Bracquemond.

Já Mary Cassatt era a única americana no meio dos fundadores. Ela é fruto de uma família rica de Pittsburgh, que deu apoio à uma educação formal em artes na Academia de Belas Artes da Pensilvânia e na Europa, após a rejeição da escola da Filadélfia para estudar modelos nus.

Durante esse tempo, ela adquiriu conhecimentos com mentores acadêmicos como Jean-Léon Gérôme e Édouard Frère. Exibiu sua pintura Duas Mulheres Jogando Flores Durante o Carnaval (1872) e espalhou-se o conceito de sua imagem a uma artista em ascensão.

Se estabeleceu em Paris no ano de 1874, abrindo seu próprio estúdio, onde começou a exibir frequentemente suas obras, sendo conhecida pelo impressionista Degas, que se admirou com seu trabalho.

Os dois se tornaram amigos, sendo ele que encontrara a modelo do quadro Menina Em Uma Poltrona Azul (1877), vista como sua primeira obra Impressionista, trazendo a visão ímpar de Mary, em captar a vida interior de suas pinturas com o retrato de uma menina sentada sem o requinte pedido a postura feminina, demonstrando que a atuação de modelo está longe de ser sua ocupação.


Menina Em Uma Poltrona Azul, 1877. Não tinha nenhum receio em quebrar os padrões de doçura e feminilidade. Além de trazer os cães nas suas telas, na intenção de mostrar o bichinho como melhor amigo da mulher e das crianças, sendo seu modo peculiar.

Menina Em Uma Poltrona Azul, 1877. Não tinha nenhum receio em quebrar os padrões de doçura e feminilidade. Além de trazer os cães nas suas telas, na intenção de mostrar o bichinho como melhor amigo da mulher e das crianças, sendo seu modo peculiar.

(Foto: Reprodução/ Santhatela).





















Cassatt queria a aprovação do júri para a Exposição Universal de 1878, mas sabia que as pinceladas desprendidas e o fundo brilhante não os agradariam e fez mesmo assim. Quando o quadro foi recusado, soube que era modernista e parte dos impressionistas, sendo convidada por Degas a integrar o movimento, recebendo críticas de apoio vindo da imprensa francesa.

Havendo, por outro lado, uma crítica negativa da imprensa americana, questionando "por que ela se perdeu?"


Suas representações ganham fama por demonstrarem mulheres modernas com um acato único, com o interesse maior em retratar o pensamento da imagem do que a estética exterior. Posteriormente, no ano de 1892, as mulheres em suas telas recebiam uma grandiosidade comparado a deusas, obtendo constantes críticas à monotonia de suas modelos nas obras.

Porém, essa era a intenção da pintora, mostrar que poderia criar obras desprezando os conceitos tradicionais de beleza, dizendo que seu propósito era transmitir mulheres como assuntos, não objetos. As pinturas contendo mães e filhos, presentes nas telas da década de 1880, foram admiradas nos dois Atlântico por trazer nuances delicadas do tom da pele, o que era um desafio.

Ganhou destaque tornando-se a única americana a expor junto de seus colegas impressionistas homens, atingindo um reconhecimento internacional. No entanto, por ser uma americana com uma pintura de estilo francês, tornou seu papel no impressionismo desvalorizado com curadores, sem ter a certeza de onde pendurar suas obras; na seção americana ou francesa, deixando seu trabalho a margem.

Ela se desintegrou do grupo, sem deixar de pintar, mas continuou como colaboradora de obras Impressionistas e ajudou na introdução do estilo na América até 1914. Conquistando criações com gravuras coloridas e influência da aparência japonesa, obtendo destaque nas artes gráficas. Porém, no ano seguinte, ficou praticamente cega, devido a diabetes e sem poder trabalhar, seguindo assim até sua morte em 1926.

Contudo, as damas do Impressionismo carregam o enredo de apagamento, com seus trabalhos revolucionários sendo diminuídos na intenção de enfraquecer o intelecto, a imagem, a potência feminina em um momento de transformação na sociedade ainda dominada pelos homens.

Um feito tão excepcional na arte, não deveria ficar a fronteira do esquecimento devido ao gênero da artista. E nos dias atuais, mesmo com conceitos mudados e espaços conquistados, os resquícios dessa raiz de autoridade é visível. Mulheres ainda recebem maiores críticas e seus feitos são deixados de lado a fim de satisfazer a visão criada pelos conceitos masculinos, não tão distante do que as pioneiras passaram para conseguir notoriedade.


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