De onde você sabe a história do Saci e do Curupira? E a do Cravo e da Rosa? Tem ideia de como era a “infância no interior” lá por 1960? E as músicas dessa época? Se lembrou de algo, é possível que, em alguma dessas lembranças, uma mãe, avó ou tia tenha sido quem te falou sobre o tema - ou o cantou.
A oralidade é, sem dúvidas, uma das formas mais efetivas no registro da cultura e da história brasileira. As contações de histórias dos avós e as músicas que atravessaram gerações são exemplos de narrativas orais que perpetuam aspectos e fatos relevantes para a sociedade em sua identidade, estrutura e sobrevivência.
Momentos como o da ditadura civil-militar enfrentada pela sociedade brasileira entre os anos de 1964 e 1985 são fortes reveladores da importância dessa tradição oral. Na época, os registros textuais e fotográficos eram altamente censurados pela governança militar. Os atos de revolta, os episódios de tortura e as revoluções são praticamente todas conhecidas atualmente em razão das histórias contadas por sobreviventes do período.
Papa Francisco, figura de referência mundial, sempre evidencia, em suas aparições públicas, a importância de valorizar os indivíduos que viveram, guardaram e, hoje, compartilham a história. “Esta relação, este diálogo entre as gerações é um tesouro que deve ser conservado e alimentado”, evidencia o Pontífice.
Francisco reitera: “Temos aqui uma grande responsabilidade para com as novas gerações. Lembremo-nos: os avós e os idosos são o pão que alimenta as nossas vidas, são a sabedoria oculta de um povo, e é por isso que devem ser celebrados”.
Nesse contexto, é importante destacar também a relevância desse tipo de tradição para a informação sobre povos historicamente invisibilizados. A influência dos povos originários do Brasil e dos que vieram de outros lugares por diversos motivos - ou forças -, por exemplo, são retratados e conhecidos principalmente por esse tipo de tradição.
Os saberes naturais indígenas, as manifestações culturais afrobrasileiras e os costumes quilombolas não são evidenciados nos registros históricos tradicionais. Assim, para manter e propagar a cultura é comum que as gerações tradicionais sejam, de alguma forma, ainda mais importantes e valorizadas entre essas comunidades.
Os registros textuais e visuais são os meios mais referenciados e valorizados de obtenção de conhecimentos. Porém, antes de se tornar livro, jornal ou documentário, aquele acontecimento foi disseminado ou explicado verbalmente de alguma forma.
O que, anteriormente, era papel dos familiares e vizinhos, hoje torna-se profissão: os contadores de histórias. Elisete Teixeira é uma delas, que integra um projeto em Brasília. “Seja na forma escrita, falada, jamais podemos subestimá-la [a palavra]. Um dos ofícios mais antigos de que se tem notícia, os contadores de história sabem como ninguém desse fascínio. E é através dela, da palavra, que eles vêm encantando gerações”, ressalta a artista com relação à preservação desse ato.
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É importante, nesse sentido, dignificar a palavra como, para além de um conceito, um meio de preservar ou até de revelar e adaptar a sociedade com relação ao que existia antes. A construção dessa palavra, antes de qualquer memória, vem de uma prática social, que constrói e revela a sociedade em sua totalidade.