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26/05/2020 às 14h16min - Atualizada em 26/05/2020 às 14h16min

Artistas de Brasília se equilibram entre levar entretenimento e pagar contas

Brunna Feitosa - Editado por Letícia Agata

A música definitivamente não conhece barreiras. Apesar de todos os brasileiros viverem um momento caótico em função da pandemia do Covid-19 e da impossibilidade de frequentar locais com aglomeração como shows, cinemas, teatros e outros, artistas de diferentes estilos musicais têm buscado formas de deixar esse momento um pouco mais leve por meio de apresentações gratuitas feitas totalmente online: as famosas lives.

Mas, por outro lado, essa talvez seja uma das piores crises que o cenário musical já enfrentou. Com o fechamento de bares, boates, pubs e o cancelamento de shows e eventos de menor porte como formaturas, aniversários, casamentos e festas particulares, os artistas e suas equipes padecem para quitar suas dívidas em um horizonte cheio de incertezas e sem uma ajuda efetiva do governo.


O Show não deve parar

O cantor Rony Meolly, do bloco Eduardo e Mônica (Reprodução Instagram: @meolly)

 

O cantor e compositor, Rony Meolly, do bloco Eduardo e Mônica, criou o projeto ''Música em casa'', em parceria com o radialista Todi Moreno. O intuito principal é ajudar famílias de músicos que, com o isolamento social, estão sem trabalhar no momento e atender aqueles trabalhadores que lidam direta ou indiretamente com a música como os próprios músicos, roadies técnicos e outros. 

Com esse propósito, as apresentações são marcadas diretamente com a prefeitura das quadras ou os síndicos. ''Levamos a banda e equipamento de forma voluntária”, disse Rony Meolly.

Contudo, ao ser perguntado se é beneficiado por algum apoio do governo voltado especificamente para a categoria de músicos ou artistas em geral ou se tem o conhecimento de algum projeto nesse sentido, o artista disse:

''Participei do projeto BRB Play, um festival organizado para o aniversário de Brasília, totalmente online e patrocinado pelo Banco de Brasília. Além disso, vejo que têm surgido alguns projetos de incentivo. Estamos de olho em algum que possa se encaixar ao nosso projeto''. 

Para se manter diante do novo cenário, Rony afirma estar se adaptando às novas formas de trabalhar a música online por meio do Instagram, Youtube, etc. 

 ''A situação tá difícil pra maioria das pessoas, mas a solidariedade ainda é grande'', comentou o cantor. Antes da pandemia tinha patrocinadores, mas todos foram suspensos. 

Dessa forma, como ficará o cenário musical pós pandemia? ''Vejo que muita coisa vai mudar; novas ferramentas estão surgindo, outras que já existiam são aperfeiçoadas e o comportamento das pessoas também será diferente. Com isso, uma nova maneira de utilizar a música em todas as formas de mídia, ao vivo e online. Acho que, não só pra mim, mas todos os que trabalham com entretenimento serão obrigados a se adaptar a isso''’, finalizou o artista.

Já o cantor, compositor autodidata e carioca, Marvyn, aposta na mistura dos ritmos para alcançar o reconhecimento. Nas canções, busca fugir do imaginário popular com influências no samba, soul, hip hop e rhythm and blues (R&B). Não está participando de nenhum projeto do governo.

A renda do cantor é exclusivamente da música. Como já está praticamente há 1 mês e meio sem se apresentar normalmente, o dinheiro não entra. A “sorte” dele é ter uma reserva financeira, exatamente por entender que em algum momento poderia ficar sem poder trabalhar por algum motivo. 

Fez uma live no dia 27 de março para um projeto chamado Salve o som do Sindilegis. Não tem patrocinadores, entretanto tem alguns parceiros como a Ludic Brasil, que é uma marca de roupas. Seguem parceiros, seguem se divulgando e aguardando as coisas normalizarem.

 ''Com certeza esse formato de lives já está fazendo parte do dia a dia dos brasileiros e deve tomar proporções cada vez maiores e mudar o hábito das pessoas pós-quarentena, tendo em vista que ainda não temos previsão de data para shows. O objetivo, de agora em diante, é seguir planejando os lançamentos nos streamings, engajar o público e aumentar a audiência digital'', disse Marvyn sobre o futuro das lives pós-quarentena.

 

O cantor Marvyn (Reprodução Instagram: @marvynoficial)

 

Fundo de Apoio à Cultura para ajudar os artistas 

A Secretaria de Cultura do Distrito Federal lançou um edital do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) para ajudar os artistas durante quarentena. A convocação previu o investimento de R$ 2 milhões para 107 projetos. O edital, voltado para apresentações pela internet, foi divido em quatro linhas de apoio, que incluem atividades artísticas em 14 áreas distintas. As inscrições começaram 8 de março e foram até o dia 22 de abril. 

 Foto: Reprodução G1

 

Foram 58 vagas para ações de qualificação básica e formação, 37 vagas para montagem de espetáculo, 10 vagas para festivais online e 2 vagas para websérie ou webcanal. 

O secretário de cultura e economia criativa do DF, Bartolomeu Rodrigues, explicou ao G1 que o edital vai além da ajuda financeira aos artistas. "É também um alento aos que estão em casa, já que a arte é um remédio para a alma”, disse. 

Para que todos pudessem concorrer ao edital, a secretaria também estendeu até o dia 16 de abril o prazo de renovação ou inscrição de proponentes no Cadastro de Entes e Agentes Culturais (Ceac), documento essencial para pleitear o recurso. 

"Estamos buscando facilitar ao máximo a participação dos artistas, para atender o maior número possível de pessoas”, explicou Bartolomeu. 

O edital foi elaborado em conformidade com os critérios estabelecidos pela Lei Orgânica de Cultura (LOC), segundo o secretário. “Observamos rigorosamente todos os passos, incluindo a deliberação do Conselho de Cultura do Distrito Federal” disse.

 

 

Banda: A Culpa é de Dulce (Foto: Divulgação)

 

A Culpa é de Dulce é uma banda brasiliense de Pop Rock autoral, que faz apresentações como Cover em bares e pubs em todo o DF. O Vocalista da banda, Brão Jhones, 32, conta que ele e os outros três integrantes não passam por maiores dificuldades financeiras, porque todos possuem outras fontes de renda, mas o cancelamento dos shows prejudica as atividades da banda:

“O projeto autoral ainda não consegue se financiar sozinho. Depende de recursos das apresentações do Cover para bancar gastos como equipamentos e aluguel de estúdio".

Vocalista Brão Jhones (Abraão Vasconcelos)

 

A banda, que teve quatro shows cancelados, não tinha outros patrocínios e não buscou o apoio do governo, pois já havia tentando levantar recursos do FAC (Fundo de Apoio a Cultura) para subsidiar o projeto autoral e achou o processo muito burocrático. Sobre a continuação do formato online de apresentações, o cantor não acredita que elas durem no período pós pandemia. Em sua opinião, as pessoas sentem falta de sair de casa e quebrar a rotina por meio das apresentações externas. O vocalista falou ainda sobre a saudade dos shows e da interação do público, mas os integrantes da banda aproveitam esse tempo para fazer mudanças no repertório, além de aproveitar para ficar mais com a família.

 

Junior Ferreira- Ponte Alta do Tocantins (Foto:Rede Social)

 

Junior Ferreira, 29, é um artista com mais de 10 anos de estrada. Começou  sua trajetória com apresentações em casamentos e formaturas e a pouco mais de um ano está engajado no seu projeto voltado para o estilo musical Sertanejo. Ele conta que também tem passado dificuldades com a mudança inesperada na agenda. 

Antes da pandemia, o cantor fazia em média 5 shows por semana em eventos públicos e privados e parte de sua agenda foi remanejada para o segundo semestre, e algumas apresentações apenas para 2021. Ele tinha parcerias com marcas de roupas, calçados, alimentação e todos os contratos foram suspensos, o que impactou fortemente a renda dele e cerca de 16 integrantes da sua banda. 
  
Segundo o cantor, não houve ajuda por parte do governo do DF, apenas a abertura de alguns editais para apresentação em lives que ofereciam poucas vagas. Ele conta que o banco BRB chegou a liberar uma linha de crédito com o objetivo de financiar algumas empresas da área da cultura com uma taxa de juros menor, mas acabou esbarrando na burocracia.
  
Também não consegue receber a ajuda de R$ 600,00 oferecida pelo governo, pois seus rendimentos mensais informados no imposto de renda ultrapassam o valor estipulado para se enquadrar no auxílio. 
  
Com isso, ele tem contado com a ajuda da esposa para manter as despesas de casa e os outros integrantes da banda buscaram fontes de renda, como entregadores por aplicativos e até mesmo vendendo máscaras de proteção. Foi realizada uma live solidária para buscar recursos em prol de também ajudar esses integrantes
  
O artista acredita que os shows só devem voltar com força no ano que vem. “Somos uma das classes mais impactadas. Nós fomos os primeiros a parar e certamente seremos os últimos a voltar, uma vez que o nosso trabalho é voltado para a aglomeração”.  
  
A tendência, segundo ele, é que as lives continuem dominando o espaço do entretenimento mesmo com as dificuldades impostas pelo Youtube, que mudou as regras depois da grande repercussão que tiveram os últimos shows. Apesar dos desafios, o cantor pontua que o momento está sendo importante para conseguir aproveitar melhor a família.
 

Júnior Ferreira (Foto: Rede Social)

 

Quem gosta de música não perdeu tempo e está aproveitando o momento para ver os trabalhos dos seus artistas favoritos, como conta a orientadora educacional, Denize Bacelar, 30. Antes da pandemia ela não tinha o hábito de frequentar muitos shows, devido a rotina corrida. Assistia a poucas apresentações ao vivo e frequentava eventos mais intimistas, como aqueles realizados em bares.

Para ela, as lives ajudaram muito no entretenimento em casa, pois é uma oportunidade de assistir vários shows de diferentes estilos na companhia da família e com a vantagem de não estar exposta a perigos relacionados à violência, como furtos. Denize diz que pagaria para ver as lives dependendo do valor cobrado e cita, como vantagem das apresentações ao vivo, a expectativa gerada pelo começo dos shows e a espera sobre como será o repertório. “A live foi uma forma a mais de interação, além de livros e filmes, principalmente para quem tinha o hábito de sair para assistir os shows”.

Já a gerente financeira, Edivaneide Santos, não pagaria para assistir apresentações online. Para ela, “nada substitui ver um cantor ao vivo e ter a oportunidade de pedir uma música pessoalmente”. Perguntada se as lives tinham um fundo social ou apenas para entretenimento e promoção, ela acredita que existe um pouco de tudo, tantos aqueles que estavam fora da mídia e aproveitaram o momento para se promover como aqueles que realmente possuem um compromisso social ou ainda que resolveram aderir à causa. 

Ela também compartilha da opinião de que as lives são uma boa forma de passar o tempo e se distanciar das notícias negativas sobre a pandemia. A única reclamação de ambas foi a respeito dos artistas que passam boa parte do tempo conversando, o que acaba deixando algumas apresentações um pouco monótonas.

 

 

Denize Bacelar (Foto: Arquivo pessoal)


 
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