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30/04/2021 às 10h45min - Atualizada em 30/04/2021 às 10h42min

O incêndio na boate Kiss completou oito anos e as memórias da tragédia seguem presentes

A 'Tenda da Vigília' se mantém firme, mesmo depois de diversos ataques verbais contra pais e familiares das vítimas

Giovana Cerantola - Editado por Andrieli Torres
Foto: reprodução/Amazon
Em 27 de janeiro de 2021, a tragédia na boate Kiss completou oito anos. Com uma faísca o incêndio começou, em 2013. O vocalista da banda Gurizada Fandangueira acendeu um sinalizador, para ambientes externos, dentro da casa noturna, que era revestida, irregularmente, com espuma para isolamento acústico, altamente inflamável e tóxica. A faísca do sinalizador logo atingiu a cama de espuma e o incêndio tomou, rapidamente, grandes proporções. O acidente foi fatal. 242 pessoas perderam a vida e mais de 600 ficaram feridas, uma tragédia de grande seriedade, que chocou e mobilizou o Brasil.
 
Alguns anos após a data do incêndio, a jornalista brasileira Daniela Arbex foi para Santa Maria - Rio Grande do Sul, cidade em que ocorreu a tragédia, para investigar e até mesmo contar, sob um novo viés, os momentos de apreensão, nervosismo e medo que sobreviventes, socorristas e familiares viveram durante aquela madrugada e meses depois do acontecimento. O livro "Todo dia a mesma noite" narra a história de vítimas, que saíram para uma festa universitária na boate Kiss e não voltaram para casa. São relatos tristes, que geram no leitor sensação de sufocamento, tendo em vista o tamanho do acidente, porém, em nenhum momento, a escrita de Arbex soa sensacionalista. Na verdade, ela construiu uma narrativa humanizada sobre cada indivíduo que estava presente na situação, respeitando suas dores. 

Desde colher os relatos dos familiares, que aceitaram conversar com ela, até os profissionais que ajudaram no resgate e tratamento, Daniela recontou aquela noite de terror. Segundo o relato presente no livro, a doceira e mãe de uma das vítimas do incêndio, Ligiane Righi da Silva procurava pela filha Andrielle Righi da Silva, na esperança de encontrar ela viva. Apesar dos registros no hospital constarem que existia uma jovem com esse nome internada, a doceira não encontrou sua filha com vida. Alguns meses depois, na Tenda da Vigília, Ligiane presenciou um encontro inesperado com uma jovem, aquela em que constava o nome na ficha do hospital. Andriele Roth da Silva sobreviveu ao acidente.

Posterior à tragédia, muitos pais se encontraram sem forças para continuar lutando depois de reconhecer o corpo dos filhos no ginásio Farrezão. Alguns não conseguiram mais trabalhar ou vivem sob o uso contínuo de medicamentos. A vida deles desmoronou de um dia para outro. Assim, no primeiro semestre de 2013, muitos pais de vítimas da boate Kiss montaram a Tenda da Vigília, na Praça Saldanha Marinho, para homenagear e manter viva a história de cada um dos que morreram. A Tenda também é utilizada como ponto de encontro para pais e familiares que foram afetados, direta ou indiretamente, pelo incêndio. 

De acordo com relatos do livro, no início a Tenda era um “símbolo de luta e resistência, rapidamente passou a ser sinônimo de incômodo”. Os moradores da cidade, que não estão ligados diretamente com o incêndio, começaram a olhar com indiferença para aquele local na Praça. Com falas extremamente grosseiras e frias, muitos culpavam os pais, por dois motivos. O primeiro, anterior ao incêndio, diziam que se o filho (a) estivesse em uma igreja não teria morrido na boate. Também julgavam que a cidade não crescia mais, do ponto de vista econômico, porque os pais das vítimas não esqueciam o ocorrido, como se isso fosse possível. 

Ligiane e outros pais se mantiveram fortes, mesmo depois de tantos ataques e a Tenda permanece lá até hoje. Ela é sinônimo da luta que os familiares vêm enfrentando dia após dia e uma maneira de não apagar as vítimas do incêndio da memória.  

Hoje, mesmo com a pandemia de coronavírus, a Tenda da Vigília continua presente na Praça Saldanha. Em dezembro de 2020, a Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Santa Maria (Sedufsm) doou para a Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) um novo banner, estampado com as fotos e os nomes das vítimas do incêndio na boate Kiss. 

Com relação à boate, ela funcionava em situação irregular e já havia recebido multa anteriormente. Sobre o julgamento, em abril de 2021 a data do júri para os quatro réus pelo incêndio na boate foi marcada para dezembro do mesmo ano, podendo sofrer algum tipo de alteração devido à pandemia.

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