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03/09/2021 às 14h21min - Atualizada em 03/09/2021 às 13h58min

Com amor, Van Gogh: a sinergia perfeita entre o cinema e a pintura

Muito mais que narrar a história do pintor, a obra é um verdadeiro deleite para os olhos!

Letícia Aguiar - Editado por Talyta Brito
Reprodução/Persona Crítica Cultural
“Eu quero tocar as pessoas com a minha arte. Quero que eles digam: Ele tem sentimentos, ele tem ternura”. Por trás dessas palavras, residia a voz do pai da arte moderna, do amante do amarelo e dos girassóis, Vincent Van Gogh. Dotado de uma sensibilidade artística sem igual e de uma alma incompreendida, o artista teve sua história narrada dentro de suas próprias telas em “Loving Vincent” ou “Com amor, Van Gogh”, uma produção que, sem dúvidas, representa um grande marco estético para o audiovisual.
O longa é uma trama da cineasta e pintora polonesa Dorota Kobiela e de seu marido, o produtor britânico Hugh Welchman, ele foi lançado em 2017, sendo um produto de ousada experimentação visual. A obra é uma cinebiografia, narrada após um ano da morte do pintor. No filme, Armand Roulin, filho do carteiro e amigo de Vincent, Joseph Roulin, precisa entregar uma carta do artista para seu irmão Theo, cartas essas, que eram sempre assinadas com “Loving Vincent” ou “Com amor, Van Gogh”, títulos da produção.

A história é contada a partir da viagem de Armand Roulin para a cidade francesa de Arles, em busca de levar a carta ao seu destino. Porém, a principal linha de raciocínio da produção, acaba sendo a própria morte do pintor, levantando a hipótese de que poderia não ter havido suicídio, a partir dos relatos de personagens que conviveram com Vincent e sugerem que ele estava “bem”, ou ainda, que o ângulo da bala que matou Van Gogh era muito “inusitado” para um suicida, já que o tiro foi no estômago.
Entretanto, apesar do enredo ser interessante, o destaque do filme, com toda certeza, é a sua estética. Ele foi todo feito em obras do artista que “ganharam vida”, em uma espécie de animação desses quadros, pintados à mão por mais de 100 pintores, usando o óleo sobre tela, marca registrada de Van Gogh. Os atores gravaram as cenas e depois elas foram pintadas, é quase como se Vincent estivesse pincelando a sua própria história, dando ao espectador um resultado visual incomparável.

Nas telonas foi possível ver Noite Estrelada, Campo de Trigo com Corvos, e os retratos do Doutor Gachet, da Mademoiselle Gachet e do próprio protagonista do filme, Armand Roulin, ganharem vida, como se estivessem sendo pintadas pelo próprio Van Gogh. No total, foram cerca de 12 pinturas por segundo, em mais de 60 mil frames, que usaram e abusaram das cores, fazendo, ainda, transições muito marcantes, como o uso de escalas de cinza sempre que os personagens tinham flashbacks.

FORA DAS TELONAS
Mesmo diante de tanto deleite visual, é interessante observar como as psicopatologias eram tratadas na época de Vincent. Ele era visto como um “doido” e acometido por uma “melancolia”, que muito provavelmente, tratava-se de depressão. Bem longe das telas de cinema, esse julgamento errado dos transtornos psicológicos, infelizmente, não deixou de existir.
Com depressão e problemas de ansiedade há 10 anos, a estudante de Jornalismo, Geovanna Alencar1, já passou por muitas situações de preconceito, inclusive da própria família, que usava frases como “isso é falta de Deus”, “isso é frescura”, “só os loucos vão em busca de psicólogos e psiquiatras”. Por causa desse tipo de frase, a estudante demorou a procurar ajuda psicológica.
Felizmente, Geovanna usou a resiliência como forte aliada, e hoje está em tratamento com psicólogo e psiquiatra. “Eu só tive coragem de procurar ajuda em novembro do ano passado. Atualmente, eu consigo aproveitar os bons momentos da vida, coisa que não fazia antes. Também estou me tratando com remédios receitados pelo meu psiquiatra e fazendo terapia. Ainda não estou 100%, mas já melhorei bastante”, afirmou a jovem.
De acordo com a psicóloga Nicolly Amorim, as pessoas tem um preconceito muito grande quando se trata de psicopatologias, e frases como as que Geovanna escutou, são muito comuns. “Infelizmente, ainda são muito presentes falas como ‘psicólogo é coisa de doido’, que apenas reforçam cada vez mais esse preconceito e impactam também na demora das pessoas em procurarem ajuda. Não é à toa que o Brasil é o país mais ansioso e mais depressivo do mundo segundo a Organização Mundial de Saúde”, falou.
 
É triste perceber que a incompreensão acerca dos transtornos psicológicos não parou no tempo de Vincent, perpetuando até hoje. A questão é que uma psicopatologia não faz de ninguém menos humano ou menos passível de compaixão. O verdadeiro problema está na nossa falta de empatia e informação, porque mesmo que nós não possamos curar a dor do outro, nós podemos minimiza-la, pois a cada dia estamos todos lutando nossas próprias batalhas internas, assim como Van Gogh e Geovanna. Nesses novos tempos, é mais do que hora da nossa humanidade florescer para muito além de um setembro amarelo!

1. Pseudônimo  utilizado para preservar a identidade da entrevistada 



 
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