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24/02/2022 às 13h30min - Atualizada em 24/02/2022 às 13h25min

A gordofobia na infância

Gordofobia: como reverter um mal que começa cedo e tem sérias consequências

Júlia Guimarães - Editado por Larissa Bispo
Créditos/Divulgação: Netflix

Quando crianças, o mundo soa como um conto de fadas onde reis e rainhas brincam de ser o que quiserem e descobrem coisas novas todos os dias. Não há tristeza duradoura, não há maldade, não há distinção de pessoa para pessoa; todos são iguais e tratamos todos como iguais. Entretanto, tudo o que acontece na infância, tudo que é capaz de podar as asas da imaginação, reflete na vida adulta e aquele sonho pode se tornar um grande pesadelo.  
 

Num novo estudo dos pesquisadores da Universidade Duke, na Carolina do Norte, revelou que a "gordofobia implícita" em crianças com idades entre nove e onze anos é tão comum quanto o preconceito racial implícito entre adultos. 
 

É durante a infância em que aprendemos em como fazer parte do mundo, a viver em sociedade e a nos relacionar com as outras pessoas. É um período em que estamos estruturando nossa mente, com uma aprendizagem constante e acelerada. E a gordofobia e as pressões estéticas possuem tendência a serem iniciadas, muitas vezes durante esse período em ambiente familiar, em forma de brincadeira pelos irmãos ou primos, ou numa cobrança inocente por saúde por parte dos pais. 
 

E ao ouvir isso, a criança pode internalizar todos esses sentimentos e vulnerabilidades que afetam na autoestima e no amor próprio, e que ao crescer se torna um adulto fragilizado por causa dessas crenças e talvez entre em uma busca desenfreada pela estética inalcançável e insatisfação constante com a sua própria imagem.  
 

Essas simples frases que podem soar bobas, mas que são carregadas de gordofobia como “não gosto de ficar do lado de pessoas gordinhas”, são capazes de criar feridas das quais um indivíduo pode passar anos convivendo, e que podem até mesmo desencadear transtornos alimentares precoces.  
 

Mas afinal, o que é a gordofobia? 
 

Um exemplo recorrente de gordofobia é que, de acordo com o artigo “Joint international consensus statement for ending stigma of obesity”, divulgado pela revista Nature Medicine em 2020, nas sociedades ocidentais as pessoas obesas são comumente associadas à preguiça, gula, falta de “força de vontade” e autodisciplina. Para elas, a “obesidade” é uma escolha pessoal que pode ser revertida por decisões voluntárias de alimentação e exercício físico. 
 

Entretanto, ser alvo de gordofobia pode resultar em fatores, como o estresse, que aumentam as chances de desenvolvimento de hábitos alimentares ruins, dificuldade de emagrecimento ou de manutenção do peso. A pessoa pode internalizar esse preconceito, culpando a si mesma pelo peso excessivo e pela discriminação social de que é vítima. 
 

Voltando ao panorama infantil, essa pressão influencia na forma que essa criança criará suas relações com as outras crianças. Isso foi retratado no livro “A Chata Daquela Gorda” de Regina Drummond, onde a personagem que só tinha duas características como “chata” e “gorda” não possuía amigos porque ela criou um mecanismo de defesa que se fosse agressiva ou rude, afastaria os comentários maldosos e assim não sofreria por seu sobrepeso. A realidade, é que a garota chata só estava sozinha e tinha medo de não ser aceita pelos colegas.  
 

O final do livro é lindo, mas nem sempre é assim os desfechos da vida real. Em 2015, um artigo intitulado "Insatisfação da imagem corporal e estado nutricional em crianças de 7 a 11 anos: estudo transversal" publicou os resultados de uma pesquisa realizada na cidade de Porto Alegre, e revelou que mais de 75% das crianças entrevistadas apresentaram insatisfação com sua própria imagem corporal, desejando ter uma silhueta diferente da sua. 
 

É preocupante o número de casos de crianças e adolescentes com baixa autoestima e diagnosticados com depressão por conta do estigma do corpo perfeito, aumentado ainda mais com os bombardeios de fotos em redes sociais e filtros.  
 

No livro “Dumplin’”, e agora adaptação para a Netflix, a personagem, por ser gorda e ridicularizada desde a infância, acreditava que não tinha espaço na moda ou que poderia ter uma personalidade que remetesse a quem ela realmente era do que além de seu peso. É triste ver o quanto ela crê que ninguém pode querer ser seu amigo ou se apaixonar por ela, porque ela não tem nada a agregar como uma diva de passarela. 
 

Ao fim, ela descobre e repassa a mensagem de que todos os corpos são belos e válidos, que merecem ser aceitos e que podem ocupar qualquer lugar. Que todo corpo é um corpo de biquini. E se não, devem lutar pelo espaço, devem lutar por políticas, por mais bobas que pareçam, como um assento de ônibus mais largo e o empoderamento. 
 

Para isso, é preciso de um longo processo de diálogo e autoaceitação para combater os estereótipos e reconhecer que o que realmente importa é o caráter, a inteligência, as ambições, os esforços e as contribuições à sociedade. Porque sim, corpos gordos importam e crianças devem continuar com o mundo mágico de uma criança. 

 

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