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08/07/2019 às 16h08min - Atualizada em 08/07/2019 às 16h08min

Porque ajudar não é criar

Realidade das mães solo no Brasil

Socorro Moura
Cumplicidade requer presença. Imagem: arquivo pessoal

*Colaboração de Maria Paula Fontinele

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE nos anos entre 2005 e 2015, o número de mulheres sem cônjuge aumentou em 1,1 milhões de famílias, entretanto a taxa de fecundidade geral caiu de 2,28 filhos por mulher, para 1,9 (entre 2000 e 2010), entre outros motivos se deve ao fato da escolaridade feminina ter aumentado significativamente nos últimos anos.

Dados do IBGE constam também, que atualmente 39% dos lares são chefiados por mulheres, enquanto que 5,5 milhões de crianças não tem o nome do pai do seu registro de nascimento. Essa realidade tem se tornado cada vez mais comum entre os brasileiros, entretanto, mães solos ainda são alvos de preconceito, tanto no meio social, quanto no mercado de trabalho. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais de 2017, mulheres sem cônjuge representam um grande percentual na linha de pobreza (57%), pois 80% da mães dedicam inteiramente seu tempo ao cuidado do filho.

No âmbito social, além da real dificuldade em criar um filho sozinha, devido ao machismo cultural, essas mulheres são malvistas pela sociedade e culpabilizadas pelo abandono paterno, visão retificada pelo vice-presidente da república, General Hamilton Mourão, em que proferiu no evento no Sindicato da Habitação (Secovi), em São Paulo as seguintes palavras: "Família sempre foi o núcleo central. A partir do momento que a família é dissociada, surgem os problemas sociais que estamos vivendo e atacam eminentemente nas áreas carentes, onde não há pai nem avô, é mãe e avó. E por isso torna-se realmente uma fábrica de elementos desajustados e que tendem a ingressar em narco-quadrilhas que afetam nosso país". Ou seja, atribuindo as mães solos a responsabilidade pelo aumento da criminalidade no país com afirmações sem fundamento estatístico e pautada em preconceito velado.

Bibiana Pereto, analista comercial, 29 anos, paulistana de Ribeirão Preto não imaginava o que estava por vir, quando em mais uma saída banal com amigos, conheceu o pai de Valentina, hoje com 5 anos: " conheci em um bar na rua Augusta. Foi conexão no mesmo momento. Paixão! Só não contava com a falha do adesivo anticoncepcional, pois não sabia de um detalhe: antibiótico cortava o efeito". Esse pequeno grande detalhe expõe os problemas com prevenção, existente entre jovens e adolescentes. Segundo a coluna Drops, do portal Drauzio Varella, isso é um fato possível sim e dependendo do antibiótico, a redução do poder preventivo é drástico. Mas é uma informação disseminada? Bibiana não sabia e somente descobriu quando a gravidez bateu a porta.

A notícia da criança interrompeu planos e instalou um certo pânico, porque afinal, apesar da afinidade, eram um jovem casal que tinham recentemente se conhecido. E por conta disso, a criação foi compartilhada e ela conta o que se sucedeu: "me senti apavorada e achei que o mundo fosse acabar ali, não demos certo como casal, mas tive apoio principalmente da mãe dele quanto a criação da Valentina". A criança fica maior parte do tempo com Bibiana, onde a responsabilidade por educação, saúde e outros itens recai quase que integralmente sobre a figura da mulher, ou seja, a mãe solo.

Mesmo a pouca idade da filha, na época 5 meses, ela relata que sua volta ao trabalho foi algo tranquilo por conta da adaptação rápida da filha ao ambiente da escolinha: “isso me confortou”, disse. Segundo dados da Pnad Contínua da Educação em 2018, pesquisa anual do IBGE em domicílios de todo país, em Estados do Norte, apenas 3% dos bebês de até um ano estão em creches. Já no sudeste, apesar do salto pra 18%, os valores ainda distantes da meta de 50% para essa faixa etária. Isso, claro, reflete na situação da mãe que vê nas políticas do poder público a possibilidade de assistências às crianças e assim, poder viabilizar a volta ao trabalho, ou na pior das hipóteses, recolocar-se no mercado. Para Bibiana, a relativa rede de apoio ajuda, conseguiu inclusive cursar uma pós – graduação, mas ainda não é o ideal, pois tudo acaba se tornando um planejamento complexo.

No que tange a questões afetivas, hoje encontra-se em um relacionamento estável e tranquilo. Porém, logo que decidiu pelo recomeço, relata que não foi fácil e que inclusive os homens não era receptivos quanto a mulher ser mãe: “conheci alguns caras depois que ela nasceu e tenho consciência de que os que não valiam a pena se afastaram por eu ter uma filha. Isso foi ótimo por que não é o tipo de homem que eu quero na minha vida!”. Em uma relato compartilhado por milhares de pessoas na rede social Facebook, e atribuído a professora de 27 anos, Fernanda Teixeira, há a experiência dela quanto a conversas com homens, na faixa dos 24 aos 34 anos, em que eles se posicionam de forma, quase que em todos os diálogos, de forma tóxica, abusiva e preconceituosa quanto a figura da mãe solo. Em um exemplo a seguir, escolhido dos vários existentes, sente-se a cultura doentia aos quais as várias mulheres estão expostas, e que talvez uma mulher que não seja mãe, mas que esteja menos atenta, também possa ser vítima. Segue transcrição de um diálogo:


 

*Raul - 27 anos:

-Oi gata

-Oi. tudo bem?

-Melhor agora.

- ><

-Que bom que você avisa que tem filho.

-É? Por que?

-Assim facilita e a gente não tem surpresa.

-Como assim?

-ah gata

não se apaixona nem se desiludi

- como assim?

- vc é mãe

já sei q n rola nd sério.

*Fonte: Revista Crescer.


Após aos percalços para adaptação, aos aprendizados e contínua luta, ela finaliza com serenidade: “hoje consigo conciliar minha vida profissional, amorosa e dar a atenção que ela precisa, tenho motivos diários para lutar e dar o melhor para ela! E não me arrependo nenhum minuto se quer de ter permitido que ela viesse ao mundo! Deus me deu um presente que só me fez crescer e evoluir como.ser humano e mulher!”. Um alento, diante de uma cultura forte e resistente a figura feminina que só almeja melhores condições para si e para os seus. Avante!


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