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18/02/2023 às 10h52min - Atualizada em 24/02/2023 às 10h13min

Jornada do escritor brasileiro no mercado literário

Uma entrevista com a autora independente Mariana Lucioli

Raquel Oliveira - labdicasjornalismo.com
Editado por Fernando Azevêdo
Foto: Divulgação/Mari Lucioli
Em um país como o Brasil,  onde a “síndrome de vira-lata” é tão predominante no meio artístico, a literatura não fica de fora da preferência do público, que valoriza mais autores estrangeiros e reconhece tão pouco os autores brasileiros. A sabotagem de autores nacionais não é algo recente e vem de vários fatores, desde as editoras que recusam autores nacionais para dar mais espaços a autores internacionais até os leitores que pirateiam os livros ilegalmente.

Porém, durante os últimos anos, com a popularidade das redes sociais, a vida de escritor se tornou ainda mais complexa. Como autores sem recursos podem competir com o marketing de editoras de grande força e nome no mercado? Como atrair leitores tendo que competir com autores com famas já estabelecidas em seus países e que agora são publicados no Brasil?

Autores independentes começaram a ganhar forças com financiamentos coletivos, estudando e colocando em prática planos de publicidade e marketing, mas, ainda assim, competir com grandes editoras, plágios, críticas negativas, recursos financeiros e diversos outros fatores faz o sonho de conquistar um livro próprio parecer quase impossível.
 
A autora Mariana Lucioli concedeu uma entrevista para o portal, em que fala sobre o seu trabalho e os desafios como autora independente.

Mariana Lucioli  é uma autora que não apenas conseguiu lançar seu livro no meio digital, mas também em formato fisico, de forma independente. Durante 2021 e 2022Mariana teve seu destaque com seus livros “Avyssos”, “Olhos de Lua”, entre outros. Ela teve participação em uma palestra na bienal de 2022, na qual falou sobre Escrita e Publicação de Fantasia através do Kindle, juntamente com outros autores.
 
Lab Dicas Jornalismo: Por que você quis ser escritora? E de onde veio a necessidade de querer tornar sua escrita algo profissional?

Mariana Lucioli: Sempre amei escrever, mas foi só durante a pandemia que tive contato com escritores independentes e brasileiros, por meio das “bookredes”. Antes, eu imaginava a publicação como algo quase impossível. Depois das conversas e amizades que eu fiz no meio literário, percebi que era possível (mesmo que difícil) ter uma carreira na escrita. A profissionalização foi uma consequência dessa descoberta. Eu sinto que só segui a minha vocação, perdi o medo da jornada e confiei no meu trabalho.
 
LDJ: Como autora, durante o processo de produção de seus livros, você já tinha noção de mercado literário para saber se queria tentar com alguma editora ou, realmente, desde o início, já queria tentar lançá-los sozinha?

ML: A ideia sempre foi me fortalecer no mercado independente para, quem sabe, conseguir uma editora. Hoje, já consigo dizer que funcionou, o que me deixa bem feliz, mas foi justamente devido às trocas que tive com escritores já publicados. Ouvi diversos tipos de conselhos e busquei entender o mercado antes de me lançar nele.
 
LDJ: Seu livro “Avyssos” ficou bem famoso, eu mesma te conheci através dele durante a pré-venda do físico. Como foi se lançar no mercado editorial sozinha, sabendo que teria competir no mercado com editoras e com outras obras com propostas semelhantes, que já faziam sucesso internacional? 

ML: Sinto que no mercado literário há espaço para todos, mas é assustador pensar que terei que dividi-lo com pessoas e empresas muito maiores do que nós mesmos, e já lançar sabendo que você não vai ter o mesmo alcance que elas. Depois de um tempo, esse mesmo medo, que eu considerava uma fraqueza, passou a ser minha força. Percebi que um leitor não lê apenas um livro em sua vida e, muito provavelmente, se ele gosta de uma proposta, ele vai buscar ativamente por outros livros de propostas semelhantes. Usar essa semelhança como artifício é uma ótima estratégia para atrair leitores, além do fato de que o mercado indie nacional é muito fiel. O público que você constrói vai consumir suas obras e te acompanhar cotidianamente, mesmo que também consuma obras internacionais ou de grandes editoras.
 
LDJ: Como é para você, uma autora independente, ter que lidar com plágios e pirataria, tanto de seus colegas e talvez até dos seus livros?

ML: Felizmente, não tive nenhuma questão com plágio ainda (e espero que continue assim), mas a pirataria realmente é um baque. Por mais que você pense que esteja preparada, vai ser difícil ver seu livro, todo seu trabalho e carinho, sendo tratado como nada além de um pdf qualquer. Além do impacto emocional, temos também que lidar com o impacto financeiro. A pirataria de livros de grandes autores pode não ser um problema complexo para eles, mas, para um autor independente, os prejuízos são enormes.
 
LDJ: Sabemos que um grande desafio para os autores que fabricam seus livros no formato físico possuem ainda mais dificuldades devido à questão financeira. Como foi para você essa questão de gráfica, diagramação, ilustrações, publicidade, frete para seu livro chegar aos leitores e outros tópicos?

ML: Complicadíssimo. Optei pela pré-venda com o sistema de imprimir os livros após o pagamento, pois de outro modo não teria condições de arcar com a publicação física. Mesmo assim, os problemas são inúmeros: atraso nas gráficas, aumento no preço do frete dos correios, etc. Vender livros nesse formato é extremamente estressante e exaustivo, por isso decidi não realizar mais esse tipo de impressão sozinha. Meus livros físicos independentes agora serão disponibilizados pela Bok2 e os que vierem pela Editora Planeta serão por conta da equipe deles.
 

LDJ: Mas os seus e-books fazem muito sucesso na geração do Kindle. Como foram seus primeiros lançamentos e vendas na plataforma do Kindle? E como foi ser chamada para a plataforma depois de grandes sucessos como autora independente em um evento de bienal pela Amazon?

ML: Meu livro viralizou logo de cara. Foi incrível e assustador ao mesmo tempo. Sair da bolha e atingir um pessoal que não é seu público-alvo, apesar de ser indício de sucesso, também é bem estressante! Porém, sou muito grata por todos que trabalharam comigo e tornaram esse primeiro lançamento um sucesso. Foi a partir de Avyssos que construí meu público e com ele me mantenho até hoje, além do fato de que foram eles, juntamente com meus leitores, que me tornaram “importante” o suficiente para ter a honra de estar em uma mesa de debate da Amazon.
 
LDJ: Como você, sendo leitora e escritora, lida com a síndrome de vira-lata em relação à literatura brasileira? Claro que de 2019 até atualmente houve um aumento na buscar por mais autores independentes, mas não dá para negar que começar do zero ainda é bem difícil.

ML: Sinceramente, sinto que a síndrome de vira-lata não está presente em minha vida pessoal. Confio no meu trabalho e sei o valor da literatura nacional. Agora, já vivenciei várias situações em que outras pessoas não viam o mercado literário nacional da mesma maneira. Tenho preguiça, para falar a verdade, de pessoas com uma visão tão limitada da nossa literatura. Hoje mostro meu valor com meu trabalho, minhas obras, mas se o indivíduo não está disposto nem mesmo a tentar dar uma chance para livros nacionais, mesmo que não sejam os meus, não tenho muito o que fazer. Cansei de argumentar, depois de várias péssimas experiências. Torço para que um dia a visão dessas pessoas mude, mas minha parte estou fazendo, lançando novos livros no mercado.
 
LDJ: Como foi o seu processo para conquistar visibilidade no mercado literario aqui no Brasil e como você vê este mercado depois de tantas experiências? Nota muitas diferenças do seu começo para hoje em dia?

ML: O mercado está crescendo aos poucos, apesar do boom que tivemos durante a pandemia. Ele pode ser cruel e complicado, mas a cada dia sinto que a situação está melhorando, nem que seja um bocadinho. A bienal de 2022, na minha visão, foi um ponto de virada com os lançamentos brasileiros da Editora Qualis. Ela apostou em autoras grandes no mercado indie e conseguiu um retorno incrível, que inclusive era uma aposta “arriscada” na visão do mercado tradicional conservador. Foi após o lançamento delas que consegui meu próprio contrato com uma editora tradicional e que muitos outros colegas também conseguiram os seus.

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