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22/08/2020 às 16h33min - Atualizada em 22/08/2020 às 13h44min

Crônica: Quarentena pra quem?

“ Eu tenho medo é do dinheiro não dar.”

Hellen Lirtêz - labdicasjornalismo.com

Ao final de cada mês a fachada dos bancos lotam , mesmo em contexto de pandemia. Após dias reclusa em minha “Batcaverna” tive de ir ao banco e de longe percebi que uma mulher aparentemente jovem havia se instalado na porta. Em  seu seio esquerdo  mamava  em silêncio uma criança de poucos meses enquanto isso, ela tentava explicar o porquê de estar ali.
 
Desempregada e mãe solteira ela argumentou em sua defesa que o marido estava na cadeia e que já havia andado muito a pé em busca de um emprego.Seu rosto estava queimado do sol ,seu cabelo arrepiado e seus chinelos rachados. Mesmo assim suas explicações não foram convincentes o suficiente.Ela foi ignorada e questionada pelas pessoas na fila sobre o auxílio emergencial , “cadê seu auxílio?” em resposta ela disse que não sabia ler e que também não tinha dinheiro para ir a uma lan house.
 
Sentada do lado de fora ela observava através das paredes de vidro as pessoas  usarem os caixas, fazerem seus saques e entrarem em seus carros. O abandono  estava registrado  nos olhos dela. A sétima pessoa na fila era um senhor bem vestido que  ao perceber que ela estava sem máscara perguntou “Ei dona Maria a senhora não tem medo do Corona não?” ela respondeu , “ Eu tenho medo é do dinheiro não dar.”
 
Estar ali não  era a atitude  ideal mas,se ela não estivesse ali onde estaria sem dinheiro  e sem trabalho?“ Verás  que um filho teu não foge à luta" quem vê essa luta? Quem não foge a ela? quem tem mais chances de morrer por COVID-19?
 
As narrativas de sobrevivência em tempos pandêmicos emergem  o que há de pior no capitalismo selvagem,uma falsa democracia. A periferia não mudou, não se recolheu, não se escondeu. Os ônibus permaneceram cheios , as obras continuaram ativas, afinal , quarentena para quem? 
 
A moldura da desigualdade atinge cerca de 50 milhões de brasileiros, o equivalente a 25,4% da população, na linha de pobreza com renda familiar equivalente a R$ 387,07 – ou US$ 5,5 por dia, valor adotado pelo Banco Mundial para definir se uma pessoa é pobre.
 
A quarentena não é  pra todos,  ela tem carteira de identidade. Não há  como se  manter em isolamento social,porque não há como frear a fome. Alguns têm o privilégio  de passar a quarentena em casa com a dispensa cheia , Netflix  ,spotify  , luz e  Internet  garantidas mas, quem não  goza desses atributos onde está? 


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