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18/12/2020 às 15h18min - Atualizada em 18/12/2020 às 15h08min

Intimação da Polícia Civil do RJ à Bonner e Renata inflama discussão sobre liberdade de imprensa

O episódio é visto por advogados e jornalistas como censura à imprensa

Larissa Campos - Editado por Camilla Soares
William Bonner e Renata Vasconcellos - Imagem: Divulgação/TV Globo
Os apresentadores do Jornal Nacional, da TV Globo, William Bonner e Renata Vasconcellos, foram intimados a depor à Polícia Civil do Rio de Janeiro em uma investigação sobre suposta desobediência à decisão judicial, que proibiu a emissora de divulgar informações a respeito da investigação do esquema de "rachadinha" no gabinete da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), de Flávio Bolsonaro. O episódio controverso levantou uma questão de teor constitucional: a ação do magistrado pode ser considerada censura à liberdade de imprensa?

De acordo com a advogada Tamires Sampaio, o caso pode ser considerado como censura, na medida em que qualquer decisão jurídica que de alguma forma impeça um canal de comunicação de divulgar informações sobre algum fato fere a liberdade de imprensa.
 

“Estamos vivendo um momento muito delicado no Brasil em que nossa Constituição Federal está sofrendo vários ataques, e muitos desses ataques acontecem inclusive mediante decisões judiciais como essa, que violam o direito de imprensa, do acesso à informação, à liberdade de expressão”, afirma.


A advogada explica que a decisão judicial que proibiu a divulgação de informações sobre o caso está relacionada ao fato de que ainda não foram concluídos todos os prazos de recursos, e a exposição poderia prejudicar o processo. Por outro lado, a liberdade de imprensa e de expressão garantem que os meios de comunicação possam divulgar para a população matérias de interesse público, como é o caso da investigação sobre o esquema da “rachadinha”.

No dia 4 de dezembro, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Felipe Santa Cruz, criticou a intimação da polícia a Bonner e Renata, classificando o episódio como “afronta, ainda que simbólica, contra a imprensa livre".

“A intimação de William Bonner e Renata Vasconcellos para deporem sobre a cobertura jornalística é uma afronta, ainda que simbólica, contra a imprensa livre. E os símbolos não podem ser ignorados. Há canetadas que pesam. Mas a Constituição pesa muito mais”, declarou Santa Cruz em seu perfil no Twitter.

O que dizem os jornalistas?

Para Clayton Mello, estudante de jornalismo, mas já atuante na área desde 2012, o caso trata-se de uma censura explícita ao trabalho jornalístico, na medida em que o jornalismo tem como função e virtude jogar luz sobre qualquer fato existente no espectro social, político ou religioso. Dessa forma, Mello destaca que quando Flávio Bolsonaro recorre à Justiça para frear a divulgação de notícias sobre a investigação que corre contra ele e tem o pedido atendido, chega-se a um ponto preocupante de cerceamento da liberdade de informação.
 

“Desde a ditadura militar o jornalismo brasileiro sofre para exercer suas responsabilidades. Não houve um governo de lá pra cá que não acusou o jornalismo de tumultuar o ambiente democrático. O que difere é que o mundo está mais dinâmico e os métodos para tentar deslegitimar fontes confiáveis está mais agressivo e bem elaborado. Quem tem interesse em dificultar o trabalho do jornalismo investe pesado nisso, busca transformar os fatos em narrativa, trazendo tudo para o campo ideológico”, ressalta.


Nesse sentido, Clayton afirma que a melhor maneira de se posicionar contra os desdobramentos dessa história é continuar a divulgar o andamento da acusação do caso.

A jornalista Débora Andrade concorda com que o houve censura contra Bonner e Renata, afirmando ainda que vê dificuldades para exercer a profissão jornalística nos dias atuais, o que exige uma batalha contra a censura. “Casos como esse mostram claramente a dificuldade que o jornalista possui hoje em dia, muitas vezes em exercer a profissão sim, além claro da era digital fazendo muitas vezes com que as fake news passem por cima de noticiários verdadeiros”.

Já para a jornalista Andreza Couto, embora tenha ocorrido de fato uma censura, se há uma ordem superior os impedindo de efetuar a cobertura do caso, não há muito a ser feito. “O que hoje o jornalista ainda pode fazer é não deixar de informar, sempre levando a verdade e manifestando nas redes sociais o quanto aquilo os incomoda. Isso é o que está palpável”.

O futuro repete o passado

Apesar do caso de William Bonner e Renata Vasconcellos ter se destacado nos últimos tempos, não é de hoje que a imprensa sofre com a censura. No ano de 1971, o jornal The New York Times começou a publicar os assim chamados “Papéis do Pentágono”, uma investigação ultra-secreta do Departamento de Defesa sobre o envolvimento dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã. Os papéis indicavam que a Casa Branca vinha mentindo ao povo norte-americano durante anos sobre a Guerra do Vietnã. O nome por trás dos vazamentos é Daniel Ellsberg, então analista do Pentágono na época.

Posteriormente, o jornal The Washington Post também começou a divulgar os documentos, inflamando ainda mais a crise diplomática e gerando revolta na população americana que se viu enganada pelo governo. O então presidente Richard Nixon tentou de todas as formas impedir na Justiça a publicação dos documentos pela imprensa, mas a Suprema Corte decidiu não acatar a demanda do governo.

Não obstante, no Brasil, a censura se segue desde muto tempo. Passando da era colonial, Era Vargas, diatura militar, entre outros períodos; o país vivencia episódios de ataques contra a imprensa de forma incessante, no qual a vigília constante ao estado democrático e livre se tornou uma triste rotina.

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