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14/03/2021 às 22h44min - Atualizada em 14/03/2021 às 22h38min

"Bolsonaro tem mantido a mesma postura de candidato", afirma doutor em Ciência Política

Luiz Ademir aborda sobre a estratégia de campanha permanente de Bolsonaro

Carlos Aquino - Editado por Ana Paula Cardoso
Presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia para sanção dos projetos de lei que ampliam aquisição de vacinas pelo Governo Federal. (Foto: Marcelo Camargo)

Eleito com o discurso de antipolítica, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cumpriu metade de seu mandato mantendo estratégia de campanha eleitoral permanente. Ataques à imprensa, contato direto com eleitores nas redes sociais e discurso agressivo, utilizados em 2018, tendem a se intensificar mirando disputa com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sua reeleição ano que vem.

Sobre esse tipo de estratégia na política brasileira e implicações nas ações de Bolsonaro, o ‘Lab’ conversou com Luiz Ademir de Oliveira, mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre e doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). 

 

O que é campanha permanente e como esse conceito se apresenta na política brasileira?

Luiz Ademir - Apesar de não ser uma ideia nova, o conceito de campanha permanente é recente na literatura e tem poucos trabalhos no Brasil que desenvolvem um estudo mais preciso, até por exigirem uma coleta minuciosa de dados por um longo período de tempo. A campanha permanente é a confluência da comunicação governamental (ou da comunicação de seus opositores) e da comunicação política com a comunicação eleitoral. Ou seja, isso significa, principalmente em sistemas políticos em que a reeleição é permitida, que para se manter no poder é preciso estabelecer uma série de estratégias tanto políticas quanto comunicacionais, com o intuito de garantir uma boa avaliação do governo e uma boa imagem do líder político, visando a próxima eleição. Isso envolve consultores políticos e marqueteiros, além de uma boa articulação política, precisa manter boa visibilidade pública, principalmente na mídia. No caso da oposição, estabelecer estratégias de contato direto com a população e manter visibilidade na imprensa.

 

Como a estratégia de campanha permanente pode influenciar os resultados eleitorais?

Luiz Ademir - Ela pode influenciar garantindo que um líder político acumule capital político e chegue no período eleitoral com amplo favoritismo. Acontece, principalmente, no caso de parlamentares que mantêm um bom mandato com contato com seus redutos eleitorais e ao chegar o período eleitoral, já tem uma votação garantida. No caso do Executivo, prefeitos, governadores ou presidentes que mantêm altos índices de popularidade, boas negociações com o Congresso o tornam próximos a reeleição ou a eleição de seus sucessores, quando não podem se candidatar à reeleição. Isso ocorreu, por exemplo, com Fernando Henrique e posteriormente com Luis Inácio da Silva Lula, quando foi reeleito e quando indicou Dilma Rousseff. 

 

Como Bolsonaro tem usado essa estratégia em seu governo?

Luiz Ademir - Bolsonaro tem mantido a mesma postura de candidato como estratégia de campanha permanente, com algumas exceções. A sua relação tensa com a imprensa é um dos pontos que ele manteve - não concede entrevistas, se comunica com o público via redes sociais , faz lives de maneira bem informal e passa a imagem de um líder popular que se mistura com o povo - inclusive no período da pandemia e nas conversas no cercadinho do Planalto - .

Em relação à chamada política tradicional, com críticas aos políticos tradicionais, ele mantinha a mesma postura, mas precisou se aliar ao Centrão - grupo de mais de 258 parlamentares de diferentes partidos que praticam a política fisiológica (PSD, PP, PTB, PSC, PROS, Solidariedade, DEM) para garantir maioria no Congresso. Ação que garantiu a vitória de Arthur Lira (PP - AL) para a presidência da Câmara dos Deputados com ampla maioria em fevereiro de 2021, mas com um alto custo - a negociação envolveu cargos, liberação de emendas e provavelmente parte da pauta de liberação da economia não será colocada em votação, porque o Centrão é contrário. 

Bolsonaro vem trabalhando esta imagem de um político antissistema e polêmico de direita - que é a sua campanha permanente - ao ganhar visibilidade em programas televisivos populares (Superpop e outros do gênero) e nas redes sociais com declarações e atitudes de impacto homofóbicas, machistas que inclusive lhe renderam vários processos. Na pandemia, Bolsonaro, seguindo a linha de Donald Trump, adotou a mesma postura polêmica, com a linha negacionista, chamando uma grave doença de gripezinha, relativizando a gravidade, questionando a eficácia da vacina e sugerindo tratamentos que não são recomendados pelos cientistas. Agora, no entanto, está pagando um preço pelas suas atitudes, porque o quadro está se agravando e coloca o Brasil como o epicentro da pandemia.

 

O que ele fará até as eleições do ano que vem, principalmente com a quase certa entrada de Lula na disputa?

Luiz Ademir - Até a eleição, Bolsonaro manterá a sua postura polêmica e de direita para segurar seu público fiel, que garante pelo menos 30% do eleitorado. No entanto, em função da entrada de Lula no cenário político novamente, ele já começa a ter que repensar a sua posição. Isso já vinha acontecendo com políticas de ajuda social, como o auxílio assistencial, que ajudou a evitar uma queda na sua popularidade. Em regiões mais pobres, o auxílio lhe rendeu um aumento na popularidade, como nordeste e regiões periféricas, redutos do petismo. 

Outro grande desafio para Bolsonaro é a pandemia, ele precisa reverter o atual quadro, que é muito grave, em que ele é o principal responsável por não ter feito um planejamento de compras de vacina, por ter dificultado as negociações com a China e por agir de forma irresponsável com as medidas de isolamento social. 

Tem ainda outro fator decisivo que é a situação econômica do país. Se estivermos em recuperação econômica, isso poderá pesar a favor do presidente. Um agravamento e falta de controle poderá ser um ponto a mais para dificultar sua vida. São muitas variáveis num jogo político que praticamente recomeçou agora com a entrada de Lula, que num país como o Brasil, tem reviravoltas institucionais a todo momento. 

 

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