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29/03/2021 às 17h15min - Atualizada em 29/03/2021 às 17h10min

“O que ele pensaria de uma psique danificada?”: a complexidade do transtorno bipolar

No dia 30 de março é celebrado o Dia Mundial do Transtorno Bipolar que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é uma das maiores causas de incapacidade

Por Giulia Monteiro - Editado por Gustavo Henrique Araújo
Foto: Reprodução/Google
O Dia Mundial do Transtorno Bipolar é um período de conscientização, celebrado no dia 30 de março, em todo o globo. A data foi escolhida em homenagem ao aniversário do pintor e artista plástico holandês Vincent Van Gogh que, após sua morte, foi diagnosticado como possível portador da doença. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o transtorno bipolar é muito comum e é considerado uma das maiores causas de incapacidade. Atinge cerca de 140 milhões de pessoas em todo o mundo, com mais de 2 milhões de casos por ano no Brasil.
 
O transtorno bipolar pode ser classificado em quatro tipos: do tipo I, do tipo II, misto ou não especificado e ciclotímico. A principal característíca do distúrbio é o surgimento de episódios eufóricos intercalados com episódios depressivos, gerando alterações no comportamento e oscilações de humor. A frequência e a duração das crises varia de cada pessoa, assim como a intensidade do quadro, que pode ser leve, moderado ou grave.
 
Durante a euforia (mania e hipomania), os sintomas mais comuns são sensação de extremo bem-estar, aceleração do pensamento e da fala, agitação, hiperatividade, desibinição, impulsividade, aumento da energia e diminuição da necessidade de sono e da concentração. Já na fase da depressão, o portador dessa doença pode apresentar desânimo e cansaço mental, sentimentos de culpa ou inutilidade, apatia, perda de interesse, prazer e energia, ansiedade, irritabilidade, humor deprimido e tendência ao isolamento social e familiar.
 
O transtorno costuma surgir na adolescência ou no início da idade adulta, e continua ao longo da vida. Seu diagnóstico é bem difícil e pode demorar anos, já que o quadro muitas vezes não é reconhecido como uma doença, e ainda pode ser confundido com outros casos de depressão. É necessário uma conversa clara com um profissional para que ele possa analisar o quadro. O histórico do paciente também pode ser decisivo para o diagnóstico conclusivo, já que fatores como histórico familiar da doença, estresse intenso e uso de drogas e álcool pode ajudar no surgimento e desenvolvimento do transtorno.
 
Homens e mulheres possuem as mesmas chances de desenvolver a doença. A causa exata desse transtorno ainda é desconhecida pela ciência, mas estudos acreditam que o problema pode estar associado a fisiologia do cérebro, com alterações em determinadas áreas, e desequilíbrio entre os níveis de neurotransmissores, como a noradrenalina e a serotonina, além de desequilíbrio hormonal, fatores genéticos, estresse, violência sexual e outras experiências traumáticas.
 
Apesar de não ter cura, o transtorno bipolar pode ser controlado. Seu tratamento é feito através do uso de medicamentos, psicoterapia e mudanças no estilo de vida, como reduzir o estresse, parar de consumir substâncias psicoativas – que agem no sistema nervoso central e altera a função do cérebro – como álcool, cafeína e drogas ilícitas, e desenvolver hábitos mais saudáveis de alimentação e sono. Além disso, as redes de apoio do portador também podem ajudar bastante no tratamento domiciliar, com a presença, cuidado e suporte de familiares e amigos.
 
A coluna semanal Modern Love, do famoso jornal The New York Times, traz histórias de amor, não necessariamente romântico, baseadas em fatos reais. Um relato feito para a coluna pela escritora e autora Terri Cheney, em janeiro de 2008, conta como ela vivia sua vida com a presença do transtorno bipolar grave, que quase a matou:
 
Sentei no banheiro e comecei a chorar. Eu tinha encontrado o inimigo várias vezes para saber disso de vista. Agora não, eu orei. Por favor, agora não. Gotas de rímel correram pelo meu rosto, e eu as enxuguei, sem me importar com as manchas que elas deixaram. Eram 7h57. Eu tive três minutos para lutar contra a química do meu cérebro até a submissão. Oh, claro, eu sabia que havia outra opção. Eu poderia dizer a Jeff o que estava acontecendo. Mas este era um homem que não gostava nem mesmo de seus pêssegos machucados. O que ele pensaria de uma psique danificada?”
 
Terri conviveu anos de sua vida escondendo sua doença e seu quadro de todos ao seu redor. Familiares, amigos, professores, colegas de trabalho... A escritora possui um livro autobiográfico, Bipolar: memória de extremos (2013), no qual revela os efeitos e as consequências que o transtorno causou em sua vida. A coluna do jornal ganhou uma adaptação para a televisão em formato de série, pelo streaming Amazon Prime Video, que trouxe a história de Terri para milhões de pessoas, protagonizado pela atriz norte-americana Anne Hathaway.
 
O objetivo do dia mundial do transtorno bipolar é incentivar o diagnóstico e o tratamento de possíveis portadores. Além do mais, promove a conscientização mundial sobre a doença, a fim de eliminar estigmas sociais, estereótipos e preconceitos ligados a ela. Também educa a população sobre os riscos que o transtorno apresenta, tanto para o portador, quanto para a saúde pública. E, acima de tudo, dissemina a ideia de que é preciso dar atenção e cuidar da saúde mental, da mesma forma que é feito com a física, já que cerca de 76% a 85% dos portadores de transtornos mentais não têm acesso a nenhum tipo de tratamento, segundo a Organização Pan Americana de Saúde (OPAS).
 
“Talvez ele entendesse. Talvez eu encontrasse coragem. Talvez eles inventassem uma cura.
Talvez, mas não esta noite. Quando a campainha tocou e tocou, eu me encolhi no banheiro, tremendo. Eu estava apavorada - não apenas de Jeff me encontrar ali, mas de eu nunca encontrar o amor.”
 

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