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30/04/2021 às 03h48min - Atualizada em 30/04/2021 às 03h46min

Para conhecer a literatura afro-brasileira

Se houver interesse e divulgação, é certo que a literatura afro-brasileira deixará de ser apenas um prato consumido pelos estudiosos da área

Lívia Oliveira - Editado por Gustavo Henrique Araújo
Foto: Fábio Kabral | Reprodução: WordPress

Não é fácil. Simplesmente não é fácil pegar um livro, espalmar as mãos sobre as folhas, sentir a textura, deitar os olhos nas palavras e não se encontrar ali. A escassa representatividade negra em obras célebres brasileiras é extremamente notória e séria, isso sem mencionar quão difícil é para autores negros se ascenderem no mercado editorial. A literatura afro-brasileira é carregada por diversos nomes, como Carolina Maria de Jesus, que escreveu "Quarto de despejo", que fala sobre a pobreza, a marginalidade e o racismo que sofreu por ser uma mulher preta da periferia. No entanto, ela não é a única que se deparou com anteparos na vida e carreira por conta da cor da pele.

 

A história negra brasileira é cruel e revoltante, e seus frutos estão presentes até hoje, porém já passou da hora de romper essa lentidão no avanço da "normalização" da presença negra na sociedade. No Brasil, chega a ser ainda pior do que em outros países, uma vez que a abolição da escravatura tardou demasiadamente a ocorrer. Negros na literatura ainda são negligenciados e acabam não tendo nem metade da visibilidade que obras escritas por pessoas brancas têm, ainda que sigam o mesmo gênero de conteúdo.

 

Não dá para deixar de citar, também, o célebre embranquecimento que as editoras fizeram com Machado de Assis, fazendo todos crerem que ele era um autor branco quando, na verdade, Assis era negro. Vestir máscaras brancas para encontrar o sucesso e vender é algo que infelizmente faz parte da história, uma vez que a falta de oportunidade para artistas negros não permite que se monstrem como verdadeiramente são. A própria sociedade acaba não tendo contato com obras desses autores, tanto antigos quanto atuais. E, quando sim, os conteúdos mencionados são sobre racismo, como se todo e qualquer artista negro tivesse de falar sobre isso para se ascender.

 

Para quem desejar ocupar seu 2021 embarcando em livros com histórias e autores negros, ou até mesmo sobre o racismo e a marginalização, trago aqui três breves recomendações de por onde começar para inserir nas suas leituras a história e os personagens negros.

 

Um bom exemplo é a “Enciclopédia Negra: biografias afro-brasileiras”, o qual traz 417 verbetes biográficos que apresentam ao leitor histórias silenciadas de protagonistas negros na história do Brasil, publicada no final de março deste ano pela Companhia das Letras. Na própria introdução, a polaridade de regiões dos personagens expostos é deixado claro, trazendo assim histórias e vivências que vão além de nomes como Zumbi dos Palmares, por exemplo, abordando os "desconhecidos" que lutaram e rasgaram o racismo numa luta por liberdade e igualdade. 

 

Outro livro para acrescentar na lista de leitura deste ano é “O caçador cibernético da rua treze”, que certamente irá agraciar o paladar de fãs sci-fi e fantasia, pois traz o afrofuturismo numa narrativa atrativa e moderna. Apresenta mesclagem da mitologia Iorubá com o uso de arcabouço tecnológico de alta evolução, pondo o protagonista num mundo fantasioso e cativante, recheado por deuses, heróis e monstros. Foi escrito por Fábio Kabral, que comumente escreve sobre sexualidade, ancestralidade africana, afrocentrismo e afrofuturismo.

 

Por último, temos “Olhos d’água”, por Conceição Evaristo, uma obra sensível que aborda a violência urbana e a desigualdade social que a população afro-brasileira enfrenta. Pela maneira que entrelaça a temática de maneira poética, insere o leitor diretamente nas situações, a dor escapando dentre as páginas.

 

Agora, é preciso entender, antes de tudo, que a literatura afro-brasileira está em constante movimentação, trazendo novos autores e novos personagens, só basta oportunidade e interesse dos leitores. Necessariamente não precisa falar sobre o racismo ou histórias de superação, pois o próprio ato de ler uma simples ficção em que os personagens, assim como o protagonista, sejam negros, contribui para a literatura. O afrofuturismo, por exemplo, que aos poucos está embarcando no Brasil nos livros, é uma ótima ponte para os leitores de ficção científica e aos que se esbaldam em distopias. Porque, se houver interesse e divulgação, é certo que a literatura afro-brasileira deixará de ser apenas um prato consumido pelos estudiosos da área.
 


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