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27/05/2021 às 21h17min - Atualizada em 27/05/2021 às 20h35min

O espelho sem filtro do Instagram

“Não é normal se odiar sem filtro”- Dora Figueiredo

Beatriz Gonçalves Da Silva - Editado por Brenda Freire
Foto: Reprodução/Veja

Desligar a câmera antes de ingressar na reunião. Se olhar no espelho e comparar o próprio abdômen com aquele da influenciadora que fez lipo-lad há cinco dias. Comprar os mais diversos tipos de cremes para uma rotina de skincare porque a influenciadora fez uma ‘publi' nos stories e claro, ela estava usando um filtro “incrível” durante a propaganda, que deixava a pele livre de poros, espinhas e até mesmo de suas sardas. 
 
E mais uma vez, desligar a câmera antes de ingressar na reunião. Se olhar no espelho novamente e não encontrar o rosto harmonizado, a boca preenchida e o corpo operado. “Google pesquisar… com quantos anos pode fazer rinoplastia?... melhor consultório para harmonização facial… quanto custa uma lipo-lad?...”.
 
Desde o início da pandemia, a procura por cirurgia plástica tem crescido, o Brasil já liderava o ranking de realização desses procedimentos estéticos em 2019 somando 13% das cirurgias realizadas em todo o mundo e, continuou em ascensão neste ano de 2021, havendo um aumento de 50% nesses números, segundo dados da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS). As pessoas que mais buscam por esses procedimentos são mulheres, correspondendo a mais de 80% desse público. A partir disso, devemos nos perguntar, por que as mulheres estão insatisfeitas com seus corpos? Por que tem crescido tanto a venda de modificação estética? O que há de errado com o natural?
 
Comecemos pela última pergunta. A internet vende o padrão de beleza idealizado pela sociedade patriarcal, dessa forma, as referências femininas que circulam no mercado são, em grande maioria,  mulheres brancas, de cabelo liso, nariz fino, e magras. Mulheres que não comem chocolate e não faltam nunca na academia, que tem os lábios carnudos e o maxilar marcado, sem vestígio de papada. Esse é o ideal de beleza vendido pelo mercado e isso explica as outras duas perguntas. 
 
Entrar nas redes sociais como Instagram, Facebook, Snapchat e, se deparar com essas modelos do mercado estético patriarcal, gera a famosa comparação e esta, resulta na busca por intervenções estéticas para que a mulher consiga ingressar na reunião com a câmera ligada, se olhar no espelho com felicidade e não implicar mais com o tamanho do nariz. Esse fenômeno tem nome: dismorfia do Snapchat, termo cunhado pelo médico cosmético Tijion Esho, que notou grande parte de suas pacientes trazendo suas próprias selfies filtradas, através deste aplicativo, como referência para a modificação estética desejada. Além desse, há outro fenômeno que tem feito o público feminino buscar as cirurgias, conhecido como zoom boom, o trabalho remoto aliado à necessidade de estarmos grande parte do tempo em frente ao computador (visualizando-se de tal forma) tornou-se motivo para a intervenções estéticas faciais como botox, preenchimento de olheiras e rinoplastia (cirurgia plástica no nariz).
 
Você deve estar se perguntando se isso ocorre apenas com o público feminino: não, homens também têm cada vez mais se submetido a cirurgias, porém, a pressão estética que a mulher sofre tem uma carga muito mais pesada que a masculina. Isso ocorre desde a época em que as mulheres não podiam trabalhar e então eram apenas criadas para casar, procriar, cuidar da casa e do marido. 
 
E, antes que as influenciadoras sejam culpabilizadas por realizarem intervenções estéticas e venderem uma imagem remodelada, procuremos entender que, essas mesmas mulheres também sofrem com a pressão de servirem beleza. O trabalho delas é vender a própria imagem  e isso porque, como bem mencionou a grandíssima Simone de Beauvoir, a expectativa do belo para as mulheres é baseada no olhar masculino, expondo assim aquilo que já sabemos, a beleza feminina é moldada de acordo com os desejos do homem.
 
O que fazer para fugir dessa vitrine tão chamativa?
 
Só unfollow não basta porque esse mercado continuará existindo. O melhor a se fazer é buscar entender e melhorar a relação com o próprio corpo. Há psicólogos que podem ajudar nesse processo, visto que é recorrente a procura de meninas e mulheres querendo tratar sobre questões estéticas que acarretam traumas.
 
Além disso, é importante filtrar o conteúdo consumido. Nas redes sociais existem diversas influenciadoras que apoiam o #bodypositive, um movimento que procura fazer com que as pessoas olhem com mais carinho para seus corpos e os aceitem com suas diferenças e singularidades. 
 
Como exemplo temos a Dora Figueiredo, que é atriz e influenciadora digital e usa a plataforma do Instagram para falar com seus seguidores sobre assuntos como amor próprio e saúde mental. Dora conta que começou o processo de se conhecer melhor e se amar depois do término de um relacionamento abusivo. Em um post de setembro de 2020 ela relata que sua numeração de roupas atualmente é quatro números maior que na época em que ela estava namorando e era mais magra, e que, mesmo não estando dentro do padrão, se sente muito mais feliz. Em um outro post de seu Instagram, ela traz a colunista Clara Fagundes para falar sobre padrão de beleza e rivalidade feminina, tema importante para as mulheres se libertarem desses conceitos de que todas nós somos rivais e entenderem que a beleza de uma, não anula a da outra. Hoje, 26, Dora postou um antes e depois, comparando uma foto antiga dela, do período em que era refém dos padrões de beleza e uma atual, onde sente-se feliz e segura de si. 
 
Esse tipo de conteúdo serve como apoio para quem está buscando viver livre da pressão estética e conhecer corpos reais. Como incentivo, a influenciadora, que conta com mais de 750 mil seguidores, grava seus stories sem usar nenhum filtro, a não ser o criado por ela, que não faz nenhuma modificação facial e contém a seguinte frase: “Não é normal se odiar sem filtro”.
 

 


 
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