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28/05/2021 às 02h38min - Atualizada em 28/05/2021 às 02h07min

Toda a beleza de uma arte fora dos padrões

Relato de artista visual rememora a importância da arte na desconstrução dos padrões estéticos impostos na sociedade

Fernando Azevêdo - Editado por Talyta Brito
Reprodução arquivo pessoal / Yago Dantas
"A arte existe porque a vida não basta". Com essa frase, o escritor maranhense Ferreira Gullar contempla a inquietação que move a existência de artistas e pessoas apaixonadas por arte. Nesse sentido, arte e vida estão interligadas, uma preenchendo os espaços vazios da outra. Sem a arte, a vida seria insuportável. Tamanha é a dependência do ser humano pela arte, que, sem perceber, ele está nela imerso, seja na leitura de uma história tocante, seja em uma música recente que virou hit, seja em um meme na internet. 

Yago Dantas, 20, artista visual norte-rio-grandense, é um dos acolhidos pela frase de Gullar: "A minha relação com a arte é existente desde que me conheço por gente. Tive uma infância muito conturbada e solitária, então a arte sempre me ajudou a externar meus sentimentos e [foi] um modo de criar algo em que eu me sentia incluso. Em minhas ilustrações, eu busco representar a unicidade das pessoas e isso sempre foi um ponto chave para a construção de quem eu sou e de como eu enxergo o mundo", conta. 

O jovem potiguar relata que não se encontrou em termos de traços, técnicas ou cores. Ele pensa que faz parte da essência do artista sempre estar disposto a aprender e a se descobrir na arte. 
Dono de um perfil artístico no Instagram (@curar.t), importante plataforma de divulgação e geração de conteúdo para artistas, Yago já chegou à marca de mil seguidores. "É surreal saber que meu trabalho pode chegar em cada uma delas", fala. 

Além de publicar as próprias obras na rede social, Yago apoia e se inspira em outros artistas potiguares, como Naide Osani (@tambureti) e Pedro Ambrósio (@pedroumbrosio).
 A beleza das pessoas do cotidiano do artista também se tornou uma inspiração. Segundo Yago, a beleza é subjetiva, e entender isso é fundamental para artistas, porque é a partir daí que eles desenvolvem suas próprias formas de trabalho – “traço, paletas de cores, escolhas de materiais e todo nosso banco de referência", diz. 

A estética - palavra que vem do grego aisthésis, ou seja, sensação - pode ser entendida como a percepção de que algo é ou não belo, inclusive visualmente. Yago considera que “estética é o que se mostra contrastante, o que envolve cores, texturas, movimentos, formas, um conjunto enorme de coisas”. Ele trabalha com retratos e tenta ser representativo em relação às pessoas. A falta de referência em imagens que retratam minorias - grupos de pessoas que não se encaixam nos padrões de beleza impostos na sociedade – por ele é compreendida como uma lacuna. Buscando contornar esse problema, ele dedica parte de seu trabalho a dar visibilidade a essas pessoas.
                                       

Entre os anos de 2016 e 2018, a SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgias Plásticas) identificou um aumento de 25,6% no número de procedimentos cirúrgicos realizados. Em 2018, foram 1,7 milhão, dos quais 60% tinham fins estéticos. Esse dado é reflexo de uma parcela da sociedade que deturpa a noção de beleza, gerando insegurança nas pessoas sobre seus corpos. A arte proposta por Yago desconstrói esse contexto e lança um novo olhar sobre a beleza das pessoas. Uma beleza única, que não precisa estar dentro de um padrão.


                            

Yago ilustrou, em março de 2020, uma releitura do quadro O Nascimento de Vênus, obra de Sandro Botticelli (1445-15110). Conforme o artista, a “releitura veio a partir da grande influência da arte europeia dentro do curso de artes visuais, afinal, realmente foi um marco para a história da arte, mas eu comecei a me sentir incomodado com a falta de representatividade de mulheres reais. Não uma ideologia, ou ícone de beleza, e, sim, a verdadeira mulher nua e crua. Decidi desenhar uma mulher negra, com o corpo fora do padrão esperado e com um traço mais caricato, fora do Realismo, justamente para romper com as ligações da obra original. Desenhar a Vênus, deusa do amor e da beleza, como uma mulher negra e cheia de curvas e marcas, não foi só quebrar um padrão, foi representar milhares de mulheres, foi representar toda a beleza da mulher em si. Então, realmente é um trabalho que eu amo muito e tenho muito orgulho.”

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