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06/06/2021 às 18h13min - Atualizada em 05/06/2021 às 22h28min

Ignorando a pandemia, Bolsonaro segue participando de eventos que causam aglomerações

Em eventos com apoiadores, o presidente aparece sem máscara e não respeita o distanciamento social

Meire Santos - Editado por Ynara Mattos
Passados 15 meses desde o início da pandemia da Covid-19 no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) segue participando de eventos que causam aglomerações. As cerimônias também contam com a presença de apoiadores e outros políticos.

Esses eventos são conhecidos por burlarem as medidas de segurança recomendadas pelos órgãos de saúde para conter o avanço da pandemia. Além de não respeitarem o distanciamento social, os participantes não usam máscaras de proteção, equipamento indispensável para evitar a propagação do vírus.

Há duas semanas (21 de mai.), Bolsonaro chegou a ser multado pelo Governo do Estado do Maranhão por não usar máscara e causar aglomeração durante um evento de entrega de títulos de propriedade rural em Açailândia (MA). Dois dias depois (23 mai.), Bolsonaro, novamente sem máscara, voltou a gerar aglomeração ao participar de uma “motociata” no Rio de Janeiro, cerca de 10 a 15 mil pessoas estavam no ato.

Paulo Petry, epidemiologista e professor da UFRGS, explica as aglomerações neste momento da pandemia, independente do número de pessoas, não deveriam estar acontecendo, pois elas facilitam a disseminação do vírus.  

 

“Uma correlação inequívoca que hoje é aceita pela ciência como verdadeira é que quanto mais aglomerações nós observarmos, maior vai ser a circulação do vírus, então não se discute mais isso, isso é certo. Agora, se as pessoas além de se aglomerarem, não usarem os equipamentos de proteção, que são as máscaras, e não fizerem a higiene adequada das mãos, mesmo em ambiente abertos, isso faz com que o vírus circule. Então essas atitudes são reprováveis e lamentáveis”, comenta.

As “motociatas” estão ganhando espaço na agenda de Bolsonaro. Após o evento no Rio de Janeiro, o presidente chegou a afirmar, em live nas redes sociais, que pretende repetir o feito em outras ocasiões. “Tem gente pedindo para fazer novos passeios. Não marcamos nenhum ainda. Isso depende da gente conversar com os respectivos governadores dos estados, com os respectivos prefeitos onde vão passar essas motocicletas. É um movimento muito forte. Sem ser nesse fim de semana agora, no outro, poderá ser Porto Alegre ou Belo Horizonte”. 



Em São Paulo, no próximo sábado (12 de jun.), está prevista a “motociata” “Acelera Para Cristo”, há expectativa de uma possível participação do presidente. No dia 10 de julho, em Porto Alegre (RS), haverá uma “motociata” que deve contar com a participação de Bolsonaro, o evento está sendo organizado pelo deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS).

Eventos de cunho político, com a participação de outras autoridades, também marcam a gestão do presidente durante a pandemia. De acordo com um levantamento feito pelo Estadão, do início da pandemia até março de 2021, Bolsonaro já havia promovido mais de 40 eventos com aglomerações no Palácio do Planalto.

NEGACIONISMO

As aglomerações fazem parte de uma série de condutas negacionistas do presidente em relação à pandemia. Situações em que a gravidade da doença foi minimizada, sendo tratada apenas como “uma gripezinha”, a eficácia das vacinas foi questionada e ofertas de compra delas foram ignoradas fizeram com que o STF (Supremo Tribunal Federal) instaurasse uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para analisar a conduta do governo federal diante da pandemia.

Para Petry, a postura adotada pelo governo em relação à pandemia influencia diretamente no desempenho do país no combate à Covid-19:

 

“Goste-se ou não do presidente, seja qual for o seu alinhamento em termos de política partidária, ele foi eleito democraticamente, ele é o presidente, e, para muitas pessoas, a figura de um presidente é um exemplo, é um modelo a ser seguido”, afirma. “As políticas públicas são norteadas pelo governo federal, e um ministério que conduz adequadamente, orientando a sua população, dando o exemplo de não se aglomerar, de usar os equipamentos, teria dado um outro rumo para a pandemia. Talvez, se tivéssemos começado antes e se tivéssemos um quantitativo maior de vacinas, teríamos evitado muitas mortes que lamentavelmente hoje nós choramos”, completa.



Em algumas ocasiões, Bolsonaro afirmou ter sido impedido pelo STF de atuar no combate à pandemia. A afirmação foi desmentida pelo próprio STF, que emitiu uma nota explicando que apenas deu autonomia para que Estados e municípios atuassem no enfrentamento à Covid-19, mas que a decisão não tirava a responsabilidade do governo federal em também atuar em prol da sociedade brasileira no que se refere à pandemia.

PROTESTOS

A postura do presidente em relação à pandemia, juntamente com outras decisões políticas, gerou manifestações populares contra o governo. Atos pelo “Fora Bolsonaro” foram registrados em mais de 200 cidades no sábado (29 de mai.).

Os participantes desses protestos são orientados a seguirem os protocolos de segurança, como o uso de máscaras, álcool em gel e distanciamento social. Apesar da proteção, Paulo Petry destaca que essas manifestações são igualmente perigosas durante a pandemia. “O vírus não escolhe lado político, então toda e qualquer aglomeração é negativa. Claro que o uso de máscara diminui o risco de contaminação, mas seja qual for a aglomeração, elas não são indicadas para esse momento de circulação do vírus”.

Novos protestos contra o governo já estão sendo marcados para o próximo dia 19 de junho.

PANDEMIA NO BRASIL

Hoje, o Brasil possui mais de 470 mil mortos em decorrência da Covid-19 e quase 17 milhões casos já registrados. Enquanto outros países veem esses números diminuírem por conta do avanço da vacinação, o Brasil passa por um momento crítico, com uma média semanal de pouco mais de 1.600 óbitos.

Na Europa, devido ao aumento e queda no número de óbitos e infecções, a pandemia foi separada em "ondas". O termo também foi adotado no Brasil, que teme a chegada de uma 3ª onda da doença. Para Paulo Petry, no entanto, o termo não se encaixa no cenário brasileiro, pois nunca houve uma diferença expressiva entre os picos e as quedas:

 

“Eu não gostaria de chamar de ondas, porque a metáfora da onda existe no sentido de que há um pico – uma elevação muito grande dos casos – e depois há uma queda, e essa tem que ser bem importante para nós dizermos que terminou a onda, e só depois viria outra onda. No Brasil, nós tivemos os picos, mas nós nunca tivemos queda muito expressivas, nós descemos do pico, mas nós não descemos para um patamar de tranquilidade, com poucas mortes.”

A vacinação, que começou no dia 18 de janeiro, segue um ritmo lento no país. Até o momento, 23% da população foi vacinada com pelo menos uma dose de uma das vacinas disponíveis. Para que as coisas comecem a voltar ao normal, é necessário que ao menos 70% da população seja imunizada. Petry explica que a vacinação de toda essa parcela da população depende da importação e entregas de vacinas por parte do governo federal. Até lá, é necessário que as pessoas continuem seguindo todas as medidas de segurança. “Temos que apelar para a população, que apesar do governo negar e menosprezar a doença, precisamos continuar com os cuidados e torcer para que as vacinas sejam disponibilizadas para um número maior de pessoas”.
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