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17/10/2021 às 22h20min - Atualizada em 17/10/2021 às 17h14min

Jornalistas são atacados pela Polícia Civil e são impedidos de documentar protesto na cidade de Coahuila no México

O uso da violência não é um caso isolado

Marina Mann - Editado por Maria Paula Ramos
Foto/Reprodução: Artigo 19

No sábado, dia 18 de setembro, Gloria Ruiz, repórter e diretora do veículo digital Cuarto Poder Noticias foi impedida por policiais de cobrir um protesto social que acontecia em frente à Procuradoria Geral do Estado de Coahuila, no México. Além dela, o jornalista freelancer Ángel Maldonado foi vítima de ferimentos e danos no seu equipamento de trabalho por membros da Polícia Civil de Coahuila (PCC), na Cidade de Acuña.

O protesto pacífico - que tinha como maioria, manifestantes mulheres - acontecia no estacionamento da Procuradoria, e tinha como foco a libertação do cidadão Pablo Ortega Alvarado, um ativista social que havia sido detido. Perto das 21 horas, o local foi fechado e as autoridades pediram para que as integrantes saíssem de lá, portanto, elas se dirigiram a uma rua próxima a Procuradoria. Apesar de ser um ambiente público, em que os cidadãos estavam em seu direito de se manifestar, o comandante da PCC, Alfonso Salas, ameaçou prendê-las por terem bloqueado a via. Em seguida, chegaram mais policiais fortemente armados que começaram a atacá-los e prendê-los.  

O jornalista Ángel Maldonado relatou ao veículo Artigo 19 que "Durante a manifestação, foi dada a ordem de retirar cidadãos e jornalistas com grande violência, eles começaram a me empurrar, a me pisar e o pior foi quando me deram um soco na mão para que eu largasse o meu telefone, os gritos e ameaças dos policiais contra mim fizeram me sentir vulnerável, ainda mais porque o meu botão de assistência não tinha funcionado, foi pressionado e a chamada nunca foi devolvida, e tive de abandonar o local imediatamente para chamar o mecanismo". E acrescenta: "Vi o comandante do PCC dar ordem para usar a violência contra os manifestantes. Apesar de nos identificarmos como imprensa, eles começaram a nos empurrar e a bater para nos fazer recuar".

Vale ressaltar que a imprensa possui medidas de proteção do "Mecanismo de Proteção dos Defensores dos Direitos Humanos e de Jornalistas''. No caso de Ángel, como foi dito em sua fala, ele apertou o botão de assistência para pedir ajuda, mas nunca responderam à sua chamada. No caso de Gloria, os seus guarda-costas conseguiram acalmar a situação e evitar que a machucassem.

O repórter da TV Gurarapes, Everson Teixeira, ao ser questionado sobre a possível motivação dos ataques disse que, como trabalhamos com informação, pode muitas vezes não agradar as pessoas.

Vivemos em uma era da pós-verdade, em que cada um acredita naquilo que encaixa melhor dentro da sua própria narrativa. Dentro dessa lógica, as pessoas muitas vezes não querem ter contato com a verdade propriamente dita e quando algo não lhes agrada, agem dessa forma. Há uma violência bastante exacerbada em relação a jornalistas que estão ali somente para fazer o trabalho deles. Isso se espalha por diversas partes do mundo, não se resume somente ao México, vemos também no Brasil e nos Estados Unidos. As pessoas ficam mais preocupadas em ter acesso àquilo que elas acreditam que seja verdade, do que a própria verdade. Acreditam em uma corrente enviada pelas redes sociais, mas não acreditam em uma matéria de um veículo de comunicação sério na mídia tradicional online.

Durante a repressão do protesto, mulheres foram arrastadas pelos cabelos, espancadas e algumas foram presas. Essas ações contrariam as normas internacionais sobre o uso da força no contexto de manifestações. A Comissão Interamericana dos Direitos Humanos estabelece que só se deve usar a força em contextos extremos e excepcionais. É importante que as forças policiais estabeleçam protocolos para essas situações e recebam uma formação adequada para que a abordagem garanta o direito ao protesto social e a liberdade de expressão.




















Everson afirma que essa violência é pior com as mulheres, que também sofrem outros tipos de agressão por exercer a profissão de jornalista. As mulheres são vítimas pelo simples fato de exercerem a sua função. Muitos praticantes desse tipo de ataque vêem na mulher algo frágil, um alvo fácil.

Em um vídeo publicado em sua rede social, Ruiz relata com mais detalhes o que aconteceu no dia. Ela afirma que os policiais estavam indicando que veículos avançassem, mesmo com as pessoas no meio da rua. Os comandantes da polícia estavam empurrando as mulheres, usando a força e as encurralando. Todas afirmam que estavam no seu direito de se manifestar. Ela diz também que o governador de Coahuila assegura que defende os direitos humanos e o empoderamento das mulheres e que seus policiais estão capacitados em direitos humanos, mas na prática não vemos isso. Gloria Ruiz ainda completa

"vi uma mulher a ser arrastada para o estacionamento e tentei registar enquanto me identificava como imprensa, mas isso não impediu a polícia de me pressionar para evitar documentar a detenção. Eles tentaram agarrar o meu braço, mas eu gritei para me largarem e me deixarem trabalhar. Um dos meus guarda-costas interveio para os impedir de me empurrar. Se ele não tivesse estado lá, tenho a certeza que teria sido pior para mim".

Teixeira ainda completa

infelizmente não ocorre de forma isolada, é uma constante ao redor do mundo e pode trazer danos para quem é agredido, que podem fazê-los questionar o sentido do próprio jornalismo. Com mulheres é ainda pior, porque a violência vem acompanhada de vários fatores enraizados na sociedade. Para ele, esses ataques causam sensação de insegurança e impotência diante das situações. Os profissionais ficam muito acuados, não trabalham com segurança. Há um sentimento de vulnerabilidade. A violência traz a sensação de que aquela situação acontecerá de novo. As punições para quem o faz são muito brandas. Muita gente abandona a profissão por conta do medo de sofrer violência e de ser mais um alvo para essas pessoas, que muitas vezes querem empurrar as verdades delas e não querem ter uma discussão crítica. A liberdade de expressão e de imprensa precisa ser respeitada.


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